domingo, 30 de dezembro de 2012
Bola de cristal
Nas missas do futuro, os padres vão ler passagens da Bíblia a partir de e-book readers.
sábado, 29 de dezembro de 2012
Detesto comer quando tenho fome
A disciplina de filosofia no 12º ano já foi há bastante tempo mas ainda me lembro de algumas coisas do Górgias, livro onde Platão contrapõe os verdadeiros filósofos aos sofistas. Sócrates, o protagonista, está a tentar levar um dos vários sofistas com quem tem uma contenda de palavras a entrar em contradicção quando, a certa altura, a discussão sobre necessidade e prazer toca em fome e sede. Pergunta ao rival se beber é simultaneamente um prazer e uma necessidade e o outro concorda. Sócrates então acrescenta uma frase que aos olhos dos meus 17 anos me pareceu lapidar: “desde que se tenha sede”.
A frase em epígrafe foi largada hoje à mesa e ainda não percebi se deva ou não concordar – possivelmente tenho que reler o Górgias. Mas de uma coisa penso estar seguro: foi possivelmente a maior tirada filosófica que ouvi nos últimos tempos – à mesa e fora dela.
A frase em epígrafe foi largada hoje à mesa e ainda não percebi se deva ou não concordar – possivelmente tenho que reler o Górgias. Mas de uma coisa penso estar seguro: foi possivelmente a maior tirada filosófica que ouvi nos últimos tempos – à mesa e fora dela.
terça-feira, 25 de dezembro de 2012
A rudeza tem o seu charme
«Leva contigo o teu único filho, isaac, a quem tanto queres, vai à região do monte mória e oferece-o em sacrifício a mim sobre um dos montes que eu te indicar. O leitor leu bem, o senhor ordenou a abraão que lhe sacrificasse o próprio filho, com a maior simplicidade o fez, como quem pede um copo de água quando tem sede, o que significa que era costume seu, e muito arraigado. O lógico, o natural, o simplesmente humano seria que abraão tivesse mandado o senhor à merda, mas não foi assim.»
Caim, José Saramago
Caim, José Saramago
domingo, 23 de dezembro de 2012
Meu querido diário
Às 7h35 estava a apanhar o autocarro para o aeroporto. Às 9h e qualquer coisa estava a embarcar. Voo. Ao meu lado um casal chato que me fez levantar umas cinco vezes em 2h30 para ir à casa-de-banho. Aproximação para aterrar em Lisboa. Quando o avião se está a fazer à pista, borrega e sobe apressadamente. Ladies and gentlemen, this is your capitain speaking. Um problema qualquer de comunicação com a torre de Lisboa impossibilitou o sistema de aterragem automático necessário dado o denso nevoeiro. Mas vamos voltar a fazer uma aproximação e conta que estejamos no chão dentro de aproximadamente dez minutos. Qual quê. Nova tentativa, nova borrega. Mais abrupta que a primeira. Primeiros sinais de tensão na cara das pessoas. Olham em redor, olhos esbugalhados. Alguns tiram o cinto e estão a tentar sair do lugar com o avião ainda a subir; as hospedeiras lançam-se rapidamente sobre eles e convencem-nos a sentar. Desta vez o avião não começa a dar a volta como da primeira e quando piloto volta a dirigir-se aos passageiros confirma as minhas piores suspeitas: vamos para Faro. Aterramos em Faro às 14h (a hora de chegada prevista a Lisboa era 12h35). Toda a gente se levanta quando o avião pára perto do terminal mas por pouco tempo, as instrucções são para sentar e esperar por uma resolução. Só a casa-de-banho está disponível. Não há comida (nem houve), é uma companhia low-cost. A última coisa no meu estômago foi um cappuccino às 9h da manhã enquanto acabava de ler um livro do Saramago e esperava pelo embarque. A hipótese de ainda voar para Lisboa está de pé. E fica mais uma meia-hora até que se desfaz. Anunciam que vamos ser transportados de autocarro. Ficamos até perto das 15h30 no avião à espera. Depois fazemos emigração no terminal, esperamos pelas malas, vamos até ao autocarro onde, segundo nos foi prometido, nos seria dado algo de comer e some refreshments. Uma confusão doida e já estamos para arrancar e da comida nada. Um pequeno levantamento popular começa a ganhar forma, está tudo morto de fome. Uma senhora gorda e ameaçadora chega a dizer "tenho três filhos e não saio daqui sem lhes dar de comer". A pressão junto da senhora da Portway resulta e dez minutos depois chegam as sandochas mal amanhadas e as garrafas de água. Arrancamos. Adormeço. Acordo com o som de um programa infantil com o rato Mickey, importante para acalmar os miúdos que cantam e repetem aquilo que é dito. Não volto a dormir mais. Paramos em Aljustrel. Meia hora depois voltamos a andar. Chegamos ao aeroporto de Lisboa perto das 20h da noite, quase oito horas depois da hora prevista para aterrar em Lisboa e mais de doze depois de ter saído de casa.
Agora se calhar vou para a cama.
Agora se calhar vou para a cama.
sábado, 22 de dezembro de 2012
Momento creepy do dia
Uma pessoa com exactamente o mesmo nome do que eu - mas que eu não conheço de lado nenhum - adicionou-me ao facebook. Vamos ser amigos porque os nossos pais têm o mesmo gosto em matéria de nomes.
sexta-feira, 21 de dezembro de 2012
quinta-feira, 20 de dezembro de 2012
O problema é saber qual o fuso horário correcto
Porque tecnicamente o mundo pode ter acabado já na Austrália e em grande parte do Oriente. Mais umas horitas e desvenda-se o mistério.
quarta-feira, 19 de dezembro de 2012
terça-feira, 18 de dezembro de 2012
segunda-feira, 17 de dezembro de 2012
domingo, 16 de dezembro de 2012
Anti-clockwise
A tua fotografia dá-me uma chapada na cara. Inesperada. Os olhos claros queimam-me, os cabelos escuros cegam-me. Semeámos uma pedra e, ao longo deste tempo, deixámo-la crescer. Aos poucos, lentamente, porque o tempo não gosta de tratar de nada precipitadamente: o tempo leva tempo a tratar das coisas. E a pedra cresceu, ganhou forma, ganhou tamanho, tornou-se num verdadeiro pedregulho, um calhau enorme, pesadíssimo. Ao ponto de ninguém conseguir pegar nela, totalmente inamovível. E depois cometemos o erro de pensar, supor, assumir que era suficiente. Que abafaria toda e qualquer chapada inesperada, claridade ardente, escuridão ofuscante. Que nos protegeria de tudo o que viria, de tudo o que veio. E tudo o que pode vir a ser. Um erro de principiante, claro, uma ingenuidade rotunda e ignorante. Há assuntos tão grandes que nenhuma pedra – por quão grande que seja – os pode cobrir. E é por causa da queimadura, da cegueira, da chapada sonora inesperada que nos deixa atónitos que gradualmente percebemos. A pedra que semeámos, cuidámos e deixámos lentamente que crescesse afinal quanto mais cresce mais pequena se torna – e é uma surpresa: uma vez mais, a ingenuidade rotunda e ignorante. Passa subitamente de um pedregulho, calhau enorme a uma pequena pedra, uma pedrinha.
O tamanho ideal para se alojar no nosso sapato.
O tamanho ideal para se alojar no nosso sapato.
sábado, 15 de dezembro de 2012
quinta-feira, 13 de dezembro de 2012
quarta-feira, 12 de dezembro de 2012
terça-feira, 11 de dezembro de 2012
Ovelha negra
No meio da secretária de trabalho, replete de livros técnicos sobre África, sociologia, política e sistemas eleitorais – há um que destaca grandemente aos meus olhos, deitado no meio de uma pilha: “the new encyclopedia of modern body building”.
O autor é um certo Arnold Schwarzenegger.
O autor é um certo Arnold Schwarzenegger.
segunda-feira, 10 de dezembro de 2012
quinta-feira, 6 de dezembro de 2012
I want a lawyer
A cortina que separa a classe executiva dos ranhosos da turística é fechada assim que avião atinge uma altitude respeitável. Para dar aquela pinta de exclusividade: os pindéricos, se quiserem saber o que passa por detrás daquele tecido cinzento, terão que pagar mais para a próxima para descobrir. Entretanto, ficam a pensar: refeições fartas, hospedeiras sexys. A verdade não podia estar mais longe. Ok, a refeição é melhor que a sandocha manhosa dos tesos mas não é assim tão impressionante. E as hospedeiras não são mais sexys, pelo contrário. São nomalmente as chefes de cabine que, por força da natureza, são as mais velhas. E que, normalmente, e também por força da natureza, não as mais sexys.
quarta-feira, 5 de dezembro de 2012
Cachecóis, luvas, gorros e chapéus.
Devem ter caído das mãos de algum incauto e alguém teve a bondade de os apanhar do chão e colocar em cima de muros, por exemplo, na expectativa de que o dono distraído se aperceba da sua falta e resolva refazer os passos para tentar reavê-los. Por vezes, as luvas embrulhadas umas nas outras, um quase requinte de exposição, uma decoração exterior. A cidade parece um perdidos e achados gigante.
segunda-feira, 3 de dezembro de 2012
Gelo estacionado nos telhados escuros de manhã.
Derrete, no entanto, em poucas horas após o amanhecer. O céu não está tão cinzento como esperado – não tem estado – aliás, a ausência de nuvens provavelmente levou a temperaturas mais baixas. A humidade potencia o frio mas é o vento que faz o frio furar o casaco e rasgar o torso, os ossos.
domingo, 2 de dezembro de 2012
"Always play it in the key of G demolished."
"You either know what it means or you don't."
Billy Gibbons
Billy Gibbons
sábado, 1 de dezembro de 2012
sexta-feira, 30 de novembro de 2012
How many miles must we march?
Trabalhar – e quase viver – numa quasi-biblioteca: às vezes chego a inibir-me de usar o teclado por causa do som das teclas.
quinta-feira, 29 de novembro de 2012
O consumo de tabaco é-lhe sazonal.
Fuma menos no inverno porque o frio lá fora na rua demove-a. E depois fumar no quarto não é uma opção que lhe seja particularmente atraente: ou fica cheio de fumo ou tem que abrir a janela e deixar entrar o inverno todo.
quarta-feira, 28 de novembro de 2012
Crisálida
Aos poucos estou a perder alguns traços do meu sotaque americano, resultado de uma infância a ver filmes e séries: já aprendi a dizer “butter” correctamente em vez de “budder”, por exemplo. Aliás, começo a sentir-me ridículo quando falo em manteiga americana e não britânica.
terça-feira, 27 de novembro de 2012
É uma fuga para a frente.
Como um fogo que acabou de consumir um terreno e o deixou inerte: as chamas precisam forçosamente de mais terra. E vão andando assim, constantemente. Um rasto de destruição deixado para trás. O destino é incerto. Até porque o destino não é objectivo, é uma necessidade e vários destinos diferentes poderiam satisfazer a mesma necessidade de terra para lavrar. Como consequência: o regresso só é possível depois do rejuvenescimento.
domingo, 25 de novembro de 2012
Charming
O barulho dos carros lá ao longe enquanto seguem ao longo do rio. Este fim-de-semana estiveram cá uns amigos, um deles olha pela enorme janela deste sétimo andar, virada para o lado norte da cidade. Solta uma exclamação e diz-me “consigo ver a minha casa daqui!” ao qual eu respondo de imediato que até eu consigo ver o meu apartamento em Lisboa daqui (já tinha bebido umas cervejas quando eles chegaram). A luminosidade é linda. Ontem, à luta na cama para adormecer, resolvi levantar-me por um bocado. Sentei-me virado para as luzes da rua, os candeeiros e os carros lá ao longe. Fiquei meio hipnotizado nesta sala que nunca tem escuridão absoluta, tem sempre esta luz cativante, hipnotizante.
A mesma que estava à tua espera e da qual me disseste tinhas pena de não chegar a ver.
A mesma que estava à tua espera e da qual me disseste tinhas pena de não chegar a ver.
sábado, 24 de novembro de 2012
Split up
Um dia perguntou-lhe se lhe custava separar-se das peças que fazia quando as vendia. Ela pensou um pouco e disse-lhe que sim, custava-lhe, sobretudo daquelas que lhe tinham saído melhor. De tal forma que algumas das melhores não vendia. E ele continuou: então mas as que saíram melhor deviam ser aquelas que valem mais. Ela sorriu. Quem compra raramente sabe.
quinta-feira, 22 de novembro de 2012
You'll never walk alone
Ainda não te disse mas estou impressionado com a tua idade. Talvez te o te diga a certa altura. Honestamente. Não se tem tanta fluência tão novo, não se tem tanto jogo. O gesto. Com os dedos, com os dois polegares sobre uma pequena superfície. Vejo-o, leio-o quase como uma ordem e claro que te envio uma mensagem. Obedeço cegamente. Mais do que uma, sobre a forma de resposta a resposta. Permito-me perder algum controlo, permito-me abrir uma brecha para ser controlado. Por alguém da tua idade. E que sabe usar essa alavancagem a seu próprio favor.
quarta-feira, 21 de novembro de 2012
Crack of Dawn
Depois deste tempo todo de vida vi finalmente os primeiros episódios do The Office. Depois fustiguei-me por só o ter feito agora.
terça-feira, 20 de novembro de 2012
segunda-feira, 19 de novembro de 2012
Sou um péssimo utilizador de iPod
Ou Nano ou que raio de treta isto é. Esqueço-me frequentemente de o desligar. Porque, por exemplo, entro num elevador e tiro os auscultadores dos ouvidos para não ser indelicado e dizer boa tarde e essas coisas. E depois esqueço-me que não desliguei a gaitada. E, claro, quando passado uns dias me apetece o usar o Ipod - ou Nano ou o raio ca parta - vai-se a ver e não tem bateria.
sábado, 17 de novembro de 2012
Baldrocas
Estamos na presença de um verdadeiro súbdito de sua majestade quando usa "them" em vez de "those". É divertido. Por exemplo, no decurso do recente assassinato da Inglaterra perpetrado pela Suécia e referindo-se em particular aos golos do Ibrahimovic: "them goals were mental".
sexta-feira, 16 de novembro de 2012
A insustentável leveza do papel
Estamos a fazer compras de supermercado pela net, fartos de carregar tralha pesada de mochila às costas. É claro que exageramos nas coisas pesadas – que é como quem diz, cervejas – açambarcamos com a alegria de não ter de lutar mais contra a gravidade. Mas não é só peso que nos preocupa. Pelo menos a um de nós. Vou encomendar também papel higiénico. O que me parece uma excelente ideia porque é sempre um item volumoso e, embora não propriamente pesado, chato de carregar. A questão vai mais longe porém: “I don’t want people to see me buying toilet paper”. Desmancho-me a rir e pergunto-lhe se ele não acha que toda a gente sabe que ele usa a casa-de-banho. Faz um sorriso e cala-se, o que ainda me dá mais vontade de rir.
O Kitsch Kunderiano? Está bem e recomenda-se.
O Kitsch Kunderiano? Está bem e recomenda-se.
quinta-feira, 15 de novembro de 2012
Vergangenheit
«A grande mentira que contamos a nós próprios, parece-me, é a memória. Mimamos lembranças como bebés, estragamo-las com mimos.»
Abraço, José Luís Peixoto
Abraço, José Luís Peixoto
terça-feira, 13 de novembro de 2012
Norte
Os quilómetros são mais ou menos cem e, de repente, a placa indica menos, muito menos, setenta talvez. Há um momento de alguma incompreensão – será que vi mal? – mas depois vêm à memória uma outra placa, algures entre estas duas que assinalam a distância, e que indica a passagem para indicações em milhas em vez de quilómetros. E a ilusão do número inferior, o setenta, existe e faz-se sentir: é preciso uma certa adaptação para sentir que é preciso mais tempo para que o setenta se transforme em sessenta e por aí fora.
De resto as diferenças não são subtis à vista mais desatenta do que desarmada. Há as matrículas, bem-entendido, que a ter umas letras e uns algarismos mais carregados e um fundo amarelo. E os euros são oficialmente abandonados pelas libras mas o facilitismo do dia-a-dia leva a que notas de dezassete países também entrem nas contas – a câmbio que favorece a casa, claro está. O resto é camuflado pelo uso dos cartões.
E tudo parece normal. Calmo. A cidade é como outra qualquer. Está frio no centro, perto da câmara municipal imponente. Milhentos autocarros e excursões de patetas como nós que querem ir ver os calhaus na costa nortenha, angariadores que nos enfiam panfletos nas mãos e nos perguntam trinta vezes se nos queremos juntar à cáfila.
E é esta calma que parece não encaixar. Não joga quando pensamos que esta a cidade onde ainda há pouco tempo andavam à batatada, onde ainda hoje em dia andam à batatada – houve um assassinato político por estes dias. Onde ainda há muros que não podem ser transpostos pelas diferentes facções: se és do sul, nem penses em ir para a zona protestante se és católico e vice-versa. Todos os anos há demonstrações religiosas de cada um dos grupos que têm que ser acompanhadas por polícia anti-motim.
E por isso a normalidade parece falsa e hipócrita.
De resto as diferenças não são subtis à vista mais desatenta do que desarmada. Há as matrículas, bem-entendido, que a ter umas letras e uns algarismos mais carregados e um fundo amarelo. E os euros são oficialmente abandonados pelas libras mas o facilitismo do dia-a-dia leva a que notas de dezassete países também entrem nas contas – a câmbio que favorece a casa, claro está. O resto é camuflado pelo uso dos cartões.
E tudo parece normal. Calmo. A cidade é como outra qualquer. Está frio no centro, perto da câmara municipal imponente. Milhentos autocarros e excursões de patetas como nós que querem ir ver os calhaus na costa nortenha, angariadores que nos enfiam panfletos nas mãos e nos perguntam trinta vezes se nos queremos juntar à cáfila.
E é esta calma que parece não encaixar. Não joga quando pensamos que esta a cidade onde ainda há pouco tempo andavam à batatada, onde ainda hoje em dia andam à batatada – houve um assassinato político por estes dias. Onde ainda há muros que não podem ser transpostos pelas diferentes facções: se és do sul, nem penses em ir para a zona protestante se és católico e vice-versa. Todos os anos há demonstrações religiosas de cada um dos grupos que têm que ser acompanhadas por polícia anti-motim.
E por isso a normalidade parece falsa e hipócrita.
segunda-feira, 12 de novembro de 2012
Right-footing
Já o meu avô dizia – e com imensa razão – que a Steffi Graf tinha umas pernas lindas. Na minha tentativa de generalizar a teoria, acrescento que deve ser coisa de ténis. Nunca me agradou tanto ver comentários a jogos de ténis como os emissão da Sky destes World Tour Finals. A razão não é – perdoem-me ambos – nem o Boris Becker nem o Greg Rusedski. É (são) a(s) (pernas da) Annabel Croft.
domingo, 11 de novembro de 2012
sábado, 10 de novembro de 2012
sexta-feira, 9 de novembro de 2012
A prateleira fica do lado direito, mesmo antes de chegar às caixas para pagar.
Tem vinhos dos quatro cantos do mundo. Os clássicos França e Itália roubam a maior parte do espaço disponível mas há também África do Sul, Chile, Austrália. Uma secção com vinhos de Espanha – Rioja.
De Portugal, nem uma garrafa.
De Portugal, nem uma garrafa.
quinta-feira, 8 de novembro de 2012
U turn
Sabíamos que não ia ser possível voltar atrás, nem sequer um bocadito que fosse. É claro que sabíamos, não nascemos ontem. E, no entanto, apenas aflorámos o assunto. Ao de leve, en passant. Pior: assumimos que não tinha que ser um assunto: vamos ser seguramente capazes de lidar com isto como pessoas crescidas. E não foi ingenuidade. Antes cinismo ou pragmatismo – porque é sempre mais fácil evitar e fugir com o rabo à seringa, facilita a vida a toda a gente. Porque sabíamos perfeitamente que ia ser sempre muito difícil – para não dizer impossível – voltar atrás nem que fosse só um bocado. Não se volta atrás. Nem sequer há atrás para se poder voltar: uma vez atravessado aquele ponto, tudo o que está para trás passa a ser diferente do que era até àquele momento. Como se a história se reescrevesse de outra forma, com outras linhas, porque tudo agora pode ser interpretado novamente e com conclusões diferentes.
O que é certo é um certo clima de podridão diplomática. Esse fica e é um reflexo indelével da tal falta de ingenuidade – ou falsa ingenuidade tácita – e que, por isso, não pode ser afastado sem dar demasiado o flanco, abrir demasiado o jogo que é suposto estar definitivamente acabado, sem possibilidade de prolongamento nem contestação do resultado. E, por isso, permanece, fica de pedra e cal. Materializa-se numa espécie de eu sei que tu sabes que eu sei que tu sabes: ninguém quer dar o braço a torcer, ninguém quer chegar-se à frente, expor-se, sob pena de cair no ridículo do menosprezo. Porque a partir de agora – e ao contrário do início – há vitórias e derrotas, vencedores e vencidos, o que muda totalmente as regras e torna tudo completamente diferente.
Porque lá no fundo ninguém quer perder.
O que é certo é um certo clima de podridão diplomática. Esse fica e é um reflexo indelével da tal falta de ingenuidade – ou falsa ingenuidade tácita – e que, por isso, não pode ser afastado sem dar demasiado o flanco, abrir demasiado o jogo que é suposto estar definitivamente acabado, sem possibilidade de prolongamento nem contestação do resultado. E, por isso, permanece, fica de pedra e cal. Materializa-se numa espécie de eu sei que tu sabes que eu sei que tu sabes: ninguém quer dar o braço a torcer, ninguém quer chegar-se à frente, expor-se, sob pena de cair no ridículo do menosprezo. Porque a partir de agora – e ao contrário do início – há vitórias e derrotas, vencedores e vencidos, o que muda totalmente as regras e torna tudo completamente diferente.
Porque lá no fundo ninguém quer perder.
domingo, 4 de novembro de 2012
sábado, 3 de novembro de 2012
Receios infundados
Sempre tive dúvidas em relação a conduzir à esquerda. Só atravessar a rua já me parecia complicado - olhar para esquerda, olhar para direita, para cima e para baixo. Afinal, é relativamente fácil. A soma de erros em 500km é, mais coisa menos coisa, uma arranhadela de caixa e duas ou três vezes em que instintivamente me cheguei à direita quando a direita aqui era esquerda. Tirando isso, (espantosamente) tudo bem.
quinta-feira, 1 de novembro de 2012
segunda-feira, 29 de outubro de 2012
What is the cheapest full body you have?
Tinha uma por 65 no armazém, foi buscá-la para que a experimentasse. Insuportavelmente horrível. Voltei para a segunda mais barata, a que estava em exposição e que já tinha estado nas minhas mãos. Levo esta. Grand, foi a resposta dele, seca e fechada.
domingo, 21 de outubro de 2012
Pulling the Plug
Detesto brincar com elásticos. Esqueço-me que a resistência tem um limite. Estalam-me nas mãos e aleijam-me. Fico irritado. Fico irritado não tanto porque me aleijar mas por não ter conseguido antecipar. Mesmo sendo o desfecho óbvio. Um dos piores mecanismos de defesa que temos é achar que desta vez vai ser diferente. Uma espécie de mentira auto-induzida. Um logro, um querer acreditar, uma miragem. Quando a Fata Morgana se esfuma, está um deserto inteiro à frente dos nossos olhos. Ele já lá estava, só não o vimos. Ou só não o quisemos ver.
sábado, 20 de outubro de 2012
sexta-feira, 19 de outubro de 2012
Outliers
Tim Besley dá uma perspectiva histórica sobre a evolução de regimes fiscais. A certa altura, tem um slide com um gráfico que traça no eixo horizontal uma medida de defesa dos direitos de propriedade e no eixo vertical a carga fiscal em percentagem do PIB. A relação é positiva: países com maior incidência fiscal têm maior protecção dos direitos de propriedade. A questão é se esta relação é espúria, podemos inferir alguma causalidade? Dá-nos a opinião dele. Países em que o Estado arrecada grandes percentagens do rendimento em impostos têm um incentivo para promover o crescimento, daí a maior atenção dada à qualidade institucional.
quinta-feira, 18 de outubro de 2012
Handy
De repente parecem-me todos doidos varridos, a falar sozinhos no meio da rua. Riem e tudo. Mas não estão. Nem doidos nem a falar sozinhos: têm auriculares e vão a falar ao telefone. Mas juro que parece.
quarta-feira, 17 de outubro de 2012
Una monedita
Quem me dera conseguir como tu és. A sério. Deve ser tudo mais fácil. A redução da vida a meia de objectivos concretos. Simples. Porque o resto não vale a pena questionar. Chamas-me “restless”. Aceita as coisas como elas são, aceita a vida como ela é e aquilo que tem para te oferecer. Um conforto de conformismo. Como se o percurso já estive inexoravelmente traçado, uma linha que não depende de nada que queiras ou possas fazer. Explico-te porque não consigo, explico-te que até gostava de conseguir mas é tão difícil. Explico-te porque isso é tão difícil para mim. Respondes-me: “do you think I’m happy?”. Digo-te que gostava de ser como tu. A sério. Tudo mais fácil. Deixar o cinismo vencer, conformar-me. Mas é difícil. Tão difícil.
quinta-feira, 11 de outubro de 2012
Cenas
Só me apetece postar a rain song. Porque chove desalmadamente outra vez e porque é uma música dos Led Zep, fica sempre bem. Menos mal, não tenho forçosamente que ir à rua hoje. Mas apetecia-me: há berbequins por debaixo de mim. Martelos e barulho. Recomeçaram hoje, pensei que tinham parado no final da semana passada mas voltaram à carga há menos de uma hora.
domingo, 7 de outubro de 2012
Direita e esquerda não partidária
Sou um desastrado quando me cruzo com pessoas na rua. Primeiro esqueço-me que se circula pela esquerda e forço instintivamente o cruzamento pela direita. Depois, quando me vem à cabeça que estou a fazer ao contrário do que é suposto, tento seguir os trâmites mas a minha incompetência,fruto de anos e anos a chegar-me à direita vem ao de cima. Até à piscina a regra chegou. A excepção é uma das pistas, eventualmente estrangeiros como eu a nadar. Talvez um dia consiga. Para um dia destes, conduzir. Se, entretanto, não morrer atropelado ao tentar atravessar a rua por ter olhado para o lado errado - outro problema crónico parcialmente resolvido com as inscrições a indicar qual o lado correcto. Hei de lá chegar.
quinta-feira, 4 de outubro de 2012
quarta-feira, 3 de outubro de 2012
Faint
O sol põe-se lá ao fundo entre os prédios da zona norte. A estrutura metálica pontiaguda reflecte a luz tímida. Estão a construir uma ponte mesmo aqui à frente, há uma grua verde feia e barulho constante das obras durante o dia. Do sétimo andar, a sala envidraçada é uma janela aberta sobre a cidade.
quinta-feira, 20 de setembro de 2012
Outono
É a única altura em que há verdadeiramente ondas, o resto do ano parece uma água de banheira. Quando setembro está a chegar ao fim e o final do verão é anunciado com a chegada das marés-vivas. A bandeira verde é substituída pela bandeira vermelha. Agora que penso, não me lembro de ver amarela, o salto da calmaria para a agitação é grande a esse ponto. Não há quase ninguém na escassa zona de areia que não foi comida pela espuma do mar mas há bandos de surfistas na água, os fatos pretos contrastam na água. Em algumas zonas, a desfazem-se com tanta força que, quando se despenham contra o paredão, galgam-no e despejam-se sobre os incautos que caminham descontraidamente. As chaminés. Alguns já conhecem as manhas, os miúdos que ficam nos pontos nevrálgicos a olhar para o mar: quando vêem uma pequena ondulação a formar-se, colocam-se mesmo debaixo da zona de impacto. Uma espécie de queda de água, cascata intermitente. Soltam gritinhos de alegria e correm em seguida para as toalhas, enquanto esperam pela próxima. Outros ficam na rectaguarda, suficientemente resguardados esperam de câmara em riste pelo momento exacto para o enquadramento perfeito. Outros estão só a ver, a apreciar este espectáculo anual.
quinta-feira, 13 de setembro de 2012
Dream
O raio da música a dar no rádio e eu a não a querer ouvir, cheio de vontade de tapar os ouvidos, fazer barulho, bloquear aquele som que não controlo. Tarde demais. Os acordes, a melodia, até o raio da letra, exactamente como me lembrava, a desenterrar o que não quero desenterrar, o que não me apetece desenterrar. Tudo é um pretexto – consciente, subconsciente? – para voltar atrás, recordar, reviver tudo outra vez como se fosse agora, neste momento. O rádio, a música e eu a ver tudo outra vez a passar à frente dos meus olhos, agora também me apetece fechar os olhos para não ver embora não esteja mesmo a ver. São só uns minutos, são só alguns minutos e depois passa, acaba, vem outra música a seguir. E veio, pouco depois, outros acordes, melodia, letra. Mas a memória ficou, é a mesma.
quarta-feira, 12 de setembro de 2012
"Eu não sou economista mas..."
Uma das frases que mais ouço - e mais me irrita - na televisão.
domingo, 12 de agosto de 2012
Regressão
A maioria dos desportos evoluiu dramaticamente. Há uns anos atrás, correr os 100m abaixo de 10s era muito bom, este ano todos os que foram à final - excepto um que se lesionou - terminaram abaixo dos 10s. E depois há outros desportos que parece que ficaram parados no tempo. No início dos anos 90, o salto à vara basicamente consistia em ter o Bubka e mais dois ou três tipos a saltar 5.85 ou 5.90. Depois vinha o Bubka, limpava essa altura, garantia o ouro e pedia para lhe porem a fasquia no recorde do mundo. Vinte anos volvidos e os 5.90 continuam a ser a altura decisiva. Com a agravante de não haver nenhum Sergei.
quarta-feira, 8 de agosto de 2012
Unterschied
Não há diferenças assinaláveis entre as provas masculina e feminina de modalidades como lançamento de peso e de martelo.
domingo, 8 de julho de 2012
sábado, 7 de julho de 2012
A tua mão. A forma como me toca no braço. Quente. Agarra-me sem me agarrar. Ao de leve, dedos finos, o anel em forma de losango, faz-me olhar, faz-me voltar a cara e olhar-te. Prende-me. Insinua-se sem se insinuar, insinua-te sem te insinuar. Compromete-te. O anel em forma com forma de losango, comprido. Sempre leve. Olho-te. O toque leve agarra-me, e então é forte, chama-me. Volto a cara, olhar-te. Os teus dedos, finos. Quentes. Denunciam-te. A mão. Compromete-me.
quinta-feira, 5 de julho de 2012
quarta-feira, 4 de julho de 2012
Cocoon
Ouço a campainada atrás de mim. Não vou na faixa das bicicletas, vão duas raparigas a bloqueá-la e daí o ruído irritante. Passa no meio de nós, a pedalar com uma suavidade inconcebível, uma segurança que quase embala. Retira a mão esquerda do guiador, parece que vai esticá-la para indicar uma mudança de direcção que não faz sentido, não há para onde virar ali. Depois percebo. A mão segue o movimento até ao cesto que repousa na protecção da roda traseira. Lá dentro vai um cão, deitado, aconchegado. Faz-lhe uma festa na cabeça como que a pedir-lhe desculpa pela buzinadela.
segunda-feira, 18 de junho de 2012
Fare il portoghese
Significa não pagar por qualquer coisa. Aparentemente tem uma razão histórica; wikipediar para um esclarecimento infinitamente mais completo do que o meu. Sinto alguma injustiça: sou dos poucos expats que paga o metro nesta cidade
domingo, 17 de junho de 2012
Resposta aos gajos da segurança dos aeroportos
Sir, are you carrying a laptop?
No, actually a desktop.
No, actually a desktop.
sábado, 16 de junho de 2012
Árpi
Como bom húngaro que é, troca o “v”’ com o “w”. É uma luta constante naquela cabeça magiar e que, normalmente acaba em derrota. A mim, gosta de me chamar Richie: começou por ser Ricardo por analogia ao jogador de futebol e rapidamente passou para o diminutivo. Sem nenhum húngaro que me seja conhecido e que possa usar como moeda de troca, recorro simplesmente a Árpád, o segundo nome próprio.
Esta semana foi a última no nosso piso, vai para os Estados Unidos. Teve a festa de despedida, o cartão assinado por todos, os discursos e o brinde. Cruzámo-nos no segundo piso, vinha de uma cigarrada. Despediu-se de mim e de outro amigo com um abraço gozão e depois disse-nos que tínhamos que dar uma saltada aos States para lhe dizermos ao olá, ao que eu, com alguma dificuldade, respondi:
Ve vill wisit you, don’t vorry.
Esta semana foi a última no nosso piso, vai para os Estados Unidos. Teve a festa de despedida, o cartão assinado por todos, os discursos e o brinde. Cruzámo-nos no segundo piso, vinha de uma cigarrada. Despediu-se de mim e de outro amigo com um abraço gozão e depois disse-nos que tínhamos que dar uma saltada aos States para lhe dizermos ao olá, ao que eu, com alguma dificuldade, respondi:
Ve vill wisit you, don’t vorry.
quinta-feira, 14 de junho de 2012
Os irlandeses estão fartos de levar no lombo...
...mas não páram de cantar, têm um espírito incrível. E o Ronaldo já aprendia com o Torres a matar jogos.
terça-feira, 12 de junho de 2012
segunda-feira, 11 de junho de 2012
A insustentável leveza
Ele empurra a cadeira de rodas onde ela se senta, diligentemente. Vão à conversa. É mais ele que vai a falar com ela, como se a tentasse entreter. Entretanto estão a chegar àquela rampa onde o terminal curva sobre si próprio, que quase parece separá-lo em duas metades distintas. Ele diz com sotaque brasileiro: “quer com emoção ou sem emoção?”. Ela ri-se e diz que não.
domingo, 10 de junho de 2012
Matchpoint
Sempre gostei particularmente daqueles pontos no ténis que podem fazer um jogo pender totalmente para um lado ou outro. Como quando está 30 ou 40 igual e o próximo ponto pode dar um ponto de jogo ou um ponto de break, que por sua vez podem resultar num set ou mesmo num encontro para ambos os jogadores. No fio da navalha. Tento pôr-me nos pés daqueles tipos que estão no court, olhados, perscrutados por tantos olhos, no local e pela televisão. Deve ser uma tensão incrível lidar com esses momentos e eles estão completamente sozinhos. Da mesma forma que os decisores de topo falam (queixam-se?) da solidão inerente aos momentos de tomada de decisão.
O jogo de hoje, cujo desenlace foi adiado para amanhã por causa da chuva, é o expoente máxima desses momentos de aparente igualdade que só podem resvalar na oportunidade de um dos dois jogadores dar um passo de gigante no encontro. Finalmente percebi o que está em causa. Se o Nadal ganhar, torna-se no primeiro tipo a ganhar sete vezes em Roland Garros (sete!!), se o Djokovic ganhar será o primeiro tipo a deter os quatro Grand Slams ao mesmo tempo, algo que desde 1969, se não estou em erro, não acontece. É que não se trata apenas de ver quem leva o caneco para casa. Trata-se de decidir quem vai escrever o nome na história do desporto.
O jogo de hoje, cujo desenlace foi adiado para amanhã por causa da chuva, é o expoente máxima desses momentos de aparente igualdade que só podem resvalar na oportunidade de um dos dois jogadores dar um passo de gigante no encontro. Finalmente percebi o que está em causa. Se o Nadal ganhar, torna-se no primeiro tipo a ganhar sete vezes em Roland Garros (sete!!), se o Djokovic ganhar será o primeiro tipo a deter os quatro Grand Slams ao mesmo tempo, algo que desde 1969, se não estou em erro, não acontece. É que não se trata apenas de ver quem leva o caneco para casa. Trata-se de decidir quem vai escrever o nome na história do desporto.
terça-feira, 5 de junho de 2012
É uma reportagem sobre estrangeiros que usam hospitais privados no Algarve.
Gostam muito do atendimento e juntam uns dias de praia com uma cirurgia, na maioria, plásticas e ortopédicas. Durante os quatro minutos de vídeo da SIC Notícias, para além da sul-africana, da alemã e de uma outra nacionalidade, também os responsáveis das unidades clínicas dizem umas palavras e publicitam-nas. Gestores hospitalares com aquela cara de gestor que têm a lenga-lenga bem decorada e sempre pronto a pô-la cá para fora caso a ocasião surja. Um deles está a referir-se à qualidade do serviço que têm para oferecer – da mesma forma que podia estar a falar de iogurtes ou detergentes – e diz “os nossos clientes”. Na frase seguinte resolve corrigir-se – o que no limite até pode ter sido pior – e usa a expressão “pacientes”.
Para mim, já vai, obviamente, demasiado tarde.
Para mim, já vai, obviamente, demasiado tarde.
domingo, 3 de junho de 2012
Chew
A TAP serviu-me uma refeição como as que a minha mãe costumava preparar para a minha avó: empadão e depois aquela fruta em papa. A cena é que a minha mãe fazia isto para a minha avó porque ela não tinha dentes.
quinta-feira, 31 de maio de 2012
Trompete com surdina
«I was really into Irene. I had my first orgasm with her. I remember the first time I bust my nuts I thought I had to pee and jumped up and ran to the bathroom. I had had a wet dream before, when I thought I had rolled over on an egg and burst it. But, man, I had never experienced nothing like that first nut. »
Miles, the autobiography
Miles, the autobiography
terça-feira, 29 de maio de 2012
It's complicated
Estou quase a sair quando percebo que estou a complicar tudo. Um sentimento misto de algum contentamente de ter percebido que afinal é mais fácil do que aquilo que parece com auto-censura por não ter percebido mais cedo que afinal é mais fácil do que aquilo que parece. Já não tenho tempo para olhar com atenção – está mesmo a chegar a hora para fechar o computador, vestir o casaco e fazer o corredor até ao elevador. Imprimo o paper, meto-o debaixo do braço. Vai comigo, nunca se sabe se o metro vai ser cúmplice de mais avanços.
De ideia em ideia. Nem sequer é de boa ideia em boa ideia: o problema das boas ideias é que só duram até percebermos que afinal não valem nada. Ex ante não sabemos quão resistentes vão ser à ideia seguinte. E pior: quanto tempo até perceber se a resistência já foi suficientemente posta à prova. Porque a decepção pode vir no minuto seguinte ou no ano seguinte. Ou nunca, caso em estamos perante uma bifurcação entre o certo ou apenas a presunção, até prova em contrário, do certo.
De ideia em ideia. Nem sequer é de boa ideia em boa ideia: o problema das boas ideias é que só duram até percebermos que afinal não valem nada. Ex ante não sabemos quão resistentes vão ser à ideia seguinte. E pior: quanto tempo até perceber se a resistência já foi suficientemente posta à prova. Porque a decepção pode vir no minuto seguinte ou no ano seguinte. Ou nunca, caso em estamos perante uma bifurcação entre o certo ou apenas a presunção, até prova em contrário, do certo.
segunda-feira, 28 de maio de 2012
Follow me
Tenho constantemente listas de coisas. Para fazer, para tratar. Para resolver. E assim que acabo uma, logo surge outra. Arrumadinha, limpinha, sem aqueles certos catitas que assinalam o cumprimento cabal da tarefa. Sem os riscos sobre as tarefas, sobretudo as mais irritantes: com as mais irritantes, perco o tempo de as riscar, deve ser uma espécie de sentimento de vingança. Sempre fiz esta porcaria destas listinhas, ajudam-me a não me esquecer das coisas, das tarefas, das porcariazinhas que estão constantemente por detrás da orelha, com o peso da consciência de ainda as não ter feito a moer o juízo. Agora ainda mais sinto necessidade delas, talvez porque sinta que ando a procrastinar mais do que nunca. Com a porcaria do papelinho com uns pontinhos irritantes de merditas para tratar sinto mais a culpa de ainda as não ter feito o que, espero, leve a que efectivamente as faça mais depressa. Enfim, resta saber. Tenho que averiguar. Vou pôr na lista para não me esquecer.
domingo, 27 de maio de 2012
Pois sim
Quando regressámos da Luisenplatz novamente para a Friedbergerplatz, a carrinha com a banca das würst e dos copos de vinho a ir-se. Mas ainda cheia de pessoas. Entramos no meio da multidão, da confusão. Sem querer, dou um chuto em qualquer coisa; olho pronto para pedir desculpa a alguém. Vejo apenas uma garrafa de vinho muito perto de cheia, derrubada, aparentemente sem dono. Continuamos até encontrar um poiso. É um botellón, digo armado em engraçado para a namorada de um amigo. Culatra: ela não faz ideia do que é e eu tenho que explicar como quem explicar o que é, vá, um carro.
Somos abordados por uma tipa. Impressão ex-ante: ou quer vender-nos qualquer coisa ou vem cravar um cigarro. Respondo-lhe em inglês para me tentar esquivar. Responde-me na mesma língua e não “deslarga”. Aparentemente a associação de moradores quer impedir que as pessoas fiquem ali depois das dez horas por causa do barulho. Temos que nos ir embora para que não acabem de vez com as sextas-feiras na Friedbergerplatz. No decurso da conversa, ficamos a saber que é por isso que está ali a meia dúzia de carros da polícia. Gozo um bocado o prato, são quase dez e ainda está ali aquela gente toda: “so basically you have two minutes to tell all this people they should leave”. “You’re some sort of Santa”. A certa altura penso que exagerei um bocado quando disse “you’re not the nicest person ever” mas ela engoliu e, o mais giro de tudo, quase tentou desculpar-se. Usou, para o efeito, o país e a nacionalidade: os alemães e o complexo. No final não resiste a perguntar donde sou – que eu não vendo barato, nunca vendo barato a quem quer que seja, faço ponto de honra. Pouco depois reparo que há um batalhão de pessoas como esta que nos abordou, a fazer as mesmas ameaças a cromos como nós, com o mesmo autocolante na lapela.
Ontem havia uma chinfrineira descomunal à minha janela. Música aos berros, pessoas na rua à conversa, aos berros. Eventualmente a final do Festival da Canção, esse acontecimento que tanto os excita e eu não consigo perceber nem como nem porquê. Ainda assim deitei-me, pensei que se na Friedbergerplatz têm os bacanos a mandar-nos desmarcar, alguém há de concerteza mandar calar estes mânfios.
Às 2h30 da manhã lá se cansaram.
Somos abordados por uma tipa. Impressão ex-ante: ou quer vender-nos qualquer coisa ou vem cravar um cigarro. Respondo-lhe em inglês para me tentar esquivar. Responde-me na mesma língua e não “deslarga”. Aparentemente a associação de moradores quer impedir que as pessoas fiquem ali depois das dez horas por causa do barulho. Temos que nos ir embora para que não acabem de vez com as sextas-feiras na Friedbergerplatz. No decurso da conversa, ficamos a saber que é por isso que está ali a meia dúzia de carros da polícia. Gozo um bocado o prato, são quase dez e ainda está ali aquela gente toda: “so basically you have two minutes to tell all this people they should leave”. “You’re some sort of Santa”. A certa altura penso que exagerei um bocado quando disse “you’re not the nicest person ever” mas ela engoliu e, o mais giro de tudo, quase tentou desculpar-se. Usou, para o efeito, o país e a nacionalidade: os alemães e o complexo. No final não resiste a perguntar donde sou – que eu não vendo barato, nunca vendo barato a quem quer que seja, faço ponto de honra. Pouco depois reparo que há um batalhão de pessoas como esta que nos abordou, a fazer as mesmas ameaças a cromos como nós, com o mesmo autocolante na lapela.
Ontem havia uma chinfrineira descomunal à minha janela. Música aos berros, pessoas na rua à conversa, aos berros. Eventualmente a final do Festival da Canção, esse acontecimento que tanto os excita e eu não consigo perceber nem como nem porquê. Ainda assim deitei-me, pensei que se na Friedbergerplatz têm os bacanos a mandar-nos desmarcar, alguém há de concerteza mandar calar estes mânfios.
Às 2h30 da manhã lá se cansaram.
quinta-feira, 24 de maio de 2012
Stolen moments
A placa de fundo azul tinha uma indicação em vermelho: chiuso, closed, fermé, gesperrt. Paramos num restaurante para nos certificarmos que a estrada está mesmo intransitável. A senhora italiana fica a olhar para mim quase condoída quando se apercebe da minha desilusão por não conduzir o Passo dello Stelvio.
Voltar para trás. Há outra estrada que nos vai permitir entrar na Suíça e atravessá-la até chegar ao sul da Alemanha, às margens do lago Constança. Porque razão estaria o Passo fechado, não perguntei à senhora. Pode ser mau tempo mas estamos na segunda metade de Maio.
Os quilómetros vão-se seguindo. Voltamos a subir, há outro passo, é preciso atravessar outra montanha. Este tem uma indicação em verde numa placa de fundo azul. Estradas sinuosas, voltamos a subir com ravinas impressionantes. As gotas de chuva tornam-se mais pesadas e lentas, desfazem-se contra o pára-brisas.
De repente a chuva é neve. Lá no alto – dois mil e tal metros – a escuridão é maior, a noite caiu e é inverno. Descer novamente, com cuidado, há algum gelo na estrada. Já passa das nove da noite, não faltam muitos quilómetros mas são estes quilómetros difíceis de curva contra curva.
À terceira placa de fundo azul foi de vez. Nova indicação vermelha. Está fechado. Desta vez vê-se claramente a cancela que bloqueia a passagem para o início da subida. Como raio se sai daqui outra vez? Não se sai. Estamos numa pequena vila (aldeia?), paramos num de dois hotéis com pinta de poiso para entusiastas de ski.
A senhora batalha com inglês, o alemão é suíço. Ouve-nos e diz: são portugueses? O filho que veio para a ajudar com a comunicação esboça um sorriso, sendo assim já não precisas de mim. Temos alojamento e temos jantar, bem servido, tarde e más horas.
No dia seguinte falo com o filho. Tenta em italiano e eu pergunto-lhe se podemos mudar para alemão. Auf jeden Fall. Diz-me que a estrada ainda está fechada. Pergunto se é a neve a derreter, ele diz que não é bem isso mas não percebo exactamente a explicação que me dá. A saída? Comboio para Klockers. Um túnel de quase vinte quilómetros percorrido por um comboio que nos leva dentro do carro. Vinte minutos de escuridão que termina no outro lado da montanha. No lado onde as estradas estão abertas.
Seguimos viagem.
Voltar para trás. Há outra estrada que nos vai permitir entrar na Suíça e atravessá-la até chegar ao sul da Alemanha, às margens do lago Constança. Porque razão estaria o Passo fechado, não perguntei à senhora. Pode ser mau tempo mas estamos na segunda metade de Maio.
Os quilómetros vão-se seguindo. Voltamos a subir, há outro passo, é preciso atravessar outra montanha. Este tem uma indicação em verde numa placa de fundo azul. Estradas sinuosas, voltamos a subir com ravinas impressionantes. As gotas de chuva tornam-se mais pesadas e lentas, desfazem-se contra o pára-brisas.
De repente a chuva é neve. Lá no alto – dois mil e tal metros – a escuridão é maior, a noite caiu e é inverno. Descer novamente, com cuidado, há algum gelo na estrada. Já passa das nove da noite, não faltam muitos quilómetros mas são estes quilómetros difíceis de curva contra curva.
À terceira placa de fundo azul foi de vez. Nova indicação vermelha. Está fechado. Desta vez vê-se claramente a cancela que bloqueia a passagem para o início da subida. Como raio se sai daqui outra vez? Não se sai. Estamos numa pequena vila (aldeia?), paramos num de dois hotéis com pinta de poiso para entusiastas de ski.
A senhora batalha com inglês, o alemão é suíço. Ouve-nos e diz: são portugueses? O filho que veio para a ajudar com a comunicação esboça um sorriso, sendo assim já não precisas de mim. Temos alojamento e temos jantar, bem servido, tarde e más horas.
No dia seguinte falo com o filho. Tenta em italiano e eu pergunto-lhe se podemos mudar para alemão. Auf jeden Fall. Diz-me que a estrada ainda está fechada. Pergunto se é a neve a derreter, ele diz que não é bem isso mas não percebo exactamente a explicação que me dá. A saída? Comboio para Klockers. Um túnel de quase vinte quilómetros percorrido por um comboio que nos leva dentro do carro. Vinte minutos de escuridão que termina no outro lado da montanha. No lado onde as estradas estão abertas.
Seguimos viagem.
segunda-feira, 21 de maio de 2012
Há pessoas que falam da primeira recordação que têm.
Descrevem algo vívida e nitidamente e depois acrescentam que é a primeira coisa de que se lembram. Sempre me fez uma confusão tremenda: não faço a mínima ideia como é possível terem a noção de que não se lembram de nada do que está para trás. Ou de que o registo começou naquele preciso momento. É claro que tenho recordações – vívidas e nítidas, por sinal – de infância, aliás, da mais tenra. Embora tenha alguma noção da cronologia (esta aconteceu depois daquela, por exemplo), é-me totalmente impossível atribuir a qualquer delas o início.
domingo, 20 de maio de 2012
sábado, 19 de maio de 2012
domingo, 13 de maio de 2012
sexta-feira, 11 de maio de 2012
quinta-feira, 10 de maio de 2012
São Miguel
Numa das paredes da sala estava o quadro, um de tantos com imagens alusivas à França. Fotografias, a maioria com os grandes marcos de Paris, como não podia deixar de ser. A edificação no topo de uma rocha no mar era dos poucos (o único?) que não fugia à tirania da capital. É assim que me lembro de ter sido apresentado ao Mount Saint Michel, naquela sala de aula há cerca de metade da minha vida. Um dia perguntei à Angeline o que era e donde era exactamente a imagem. Explicou-me. Na altura, fiquei com a ideia de um sítio místico e inóspito, sujeito a ficar isolado do resto da França ao sabor dos caprichos das marés.
A imagem romântica foi desfeita quando, anos mais tarde, me falaram da afluência de turistas ao local. Mas só agora o comprovei. Aterro no Charles de Gaulle ao início da tarde e fazemo-nos ao caminho. Normandia, as praias cinzentas do desembarque, fustigadas pelo forte vento. Renomeadas com termos americanos: Omaha, Utah. Entretanto, a noite cai. A chuva não pára. E, lá ao fundo, as luzes que iluminam o monte surgem a certa altura. Inconfundíveis, os contornos da construção são distintos.
Deixamos as tralhas na espelunca onde vamos passar a noite e voltamos a sair para tirar uma fotografia nocturna. Pouco depois de Pontorson – que vive exclusivamente da proximidade ao local – e deparamo-nos com o enorme, gigante parque de estacionamento. A estrada está agora barrada alguns quilómetros antes: até há pouco tempo, era possível conduzir quase até à entrada. Agora il faut prendre les navettes. Ou andar. Andamos. Sem saber muito bem por onde, à noite todos os gatos são pardos. Disparo a máquina perto da estrada intransitável. Sinto os primeiros pingos nas mãos, cabeça. A chuva apanha-nos e voltamos para o carro.
O tempo teima em estragar-nos o dia seguinte. O local não tem metade da piada com o fundo cinzento das nuvens. Do lado direito, os antigos parques de estacionamento desertos. Entramos e subimos a ruela estreita de calçada, passando pelos cafés e pelas armadilhas de turistas e ultrapassando a enchente de japoneses. Há uma fila lá no alto à porta da abadia: chegámos cinco minutos antes de abrir, está escrito num cartaz. As salas enormes e despidas. Seguimos as indicações de um panfleto em, pasmem-se, português. No terraço tiramos as fotografias da praxe com os desenhos da água na areia e lama escuras.
A meio da manhã estamos despachados. Saímos. Vamos na direcção oposta à das hordas de locais e americanos – menos matutinos que os nipónicos – que sobem agora a ruela estreita. Corremos para o carro porque recomeçou a chover.
A imagem romântica foi desfeita quando, anos mais tarde, me falaram da afluência de turistas ao local. Mas só agora o comprovei. Aterro no Charles de Gaulle ao início da tarde e fazemo-nos ao caminho. Normandia, as praias cinzentas do desembarque, fustigadas pelo forte vento. Renomeadas com termos americanos: Omaha, Utah. Entretanto, a noite cai. A chuva não pára. E, lá ao fundo, as luzes que iluminam o monte surgem a certa altura. Inconfundíveis, os contornos da construção são distintos.
Deixamos as tralhas na espelunca onde vamos passar a noite e voltamos a sair para tirar uma fotografia nocturna. Pouco depois de Pontorson – que vive exclusivamente da proximidade ao local – e deparamo-nos com o enorme, gigante parque de estacionamento. A estrada está agora barrada alguns quilómetros antes: até há pouco tempo, era possível conduzir quase até à entrada. Agora il faut prendre les navettes. Ou andar. Andamos. Sem saber muito bem por onde, à noite todos os gatos são pardos. Disparo a máquina perto da estrada intransitável. Sinto os primeiros pingos nas mãos, cabeça. A chuva apanha-nos e voltamos para o carro.
O tempo teima em estragar-nos o dia seguinte. O local não tem metade da piada com o fundo cinzento das nuvens. Do lado direito, os antigos parques de estacionamento desertos. Entramos e subimos a ruela estreita de calçada, passando pelos cafés e pelas armadilhas de turistas e ultrapassando a enchente de japoneses. Há uma fila lá no alto à porta da abadia: chegámos cinco minutos antes de abrir, está escrito num cartaz. As salas enormes e despidas. Seguimos as indicações de um panfleto em, pasmem-se, português. No terraço tiramos as fotografias da praxe com os desenhos da água na areia e lama escuras.
A meio da manhã estamos despachados. Saímos. Vamos na direcção oposta à das hordas de locais e americanos – menos matutinos que os nipónicos – que sobem agora a ruela estreita. Corremos para o carro porque recomeçou a chover.
sexta-feira, 4 de maio de 2012
Picar o ponto
Vir para partir outra vez. Últimos retoques numa mala que nunca chega a estar verdadeiramente desfeita: passa mais tempo no sofá do que eu. Em construção, de boca aberta à espera da tralha que falta.
quarta-feira, 2 de maio de 2012
Je ne suis pas votre élève
Sarko passa a vida a associar Hollande à esquerda do resto da Europa. A certa altura, Hollande usa Berlusconi e a direita dele para o associar à direita do Sarko. É ou não é verdade que o Berlusconi é da direita? Sarko foge. O François: não quer responder à minha pergunta?
Coisas chiques para uma noite de quarta-feira
Ver o debate entre o Sarko e Hollande na TF1.
sexta-feira, 27 de abril de 2012
A corrida contra o tempo
Disse-me que andava há algum tempo a sujeitar o corpo a poucas horas de sono. Habituei-me a dormir cinco, seis horas por dia e às veze sinto-me cansada. Mas que hei de fazer? Trabalhamos e é só depois disso que começa verdadeiramente a nossa vida. E há tanta coisa para fazer, como posso ir para a cama cedo? Fico acordada até à 1h30 quando não é mais tarde. Entendemo-nos. Entendo-te.
quinta-feira, 26 de abril de 2012
quarta-feira, 25 de abril de 2012
Acabei de reparar que faltavam as etiquetas nos posts anteriores
"Hors sujet" com "desporto" - ou qualquer outra coisa que fosse - roça o contraditório e, talvez por isso, tem graça. Continua 2-1. O Granero tentou roubar um penalty. Foi agarrado: o Mourinho já tem tema para a conferência de imprensa.
Está a correr bem, obrigado
Muito melhor que ao Mourinho. Faltam de minutos do prolongamento e não vislumbro fim a isto. Parecia tão bem encaminhado aí há cerca de uma hora atrás.
segunda-feira, 16 de abril de 2012
Tenho um vizinho que tem uma Harley Davidson
Estaciona sempre o bicho à minha janela. Às vezes, ao sábado ou domingo de manhã - mas manhã mesmo manhã - gosta de ir passear no bicho. Não gosto muito do meu vizinho.
domingo, 15 de abril de 2012
terça-feira, 3 de abril de 2012
Apanho o U sieben no centro da cidade. Rasga uma diagonal no sentido nordeste. Primeiro debaixo da terra – onde faz verdadeiramente jus ao nome de metro. Depois lentamente emerge onde a cidade já não é bem cidade, segue ao longo da estrada, separa os dois sentidos. Saio perto do fim da linha, atravesso, cruzo, caminho.
Há um mês que não fazia este percurso. Spring break, mais coisa menos coisa. Sigo para o corredor onde estão os cubículos insonorizados. De repente, reparo que me esqueci do papel com a indicação da sala em casa. Não sei onde me devo dirigir. Resolvo ficar à espera, há de estar ali alguém, há de passar ali alguém.
Não me engano. A senhora que só vi no primeiro dia de aulas do semestre anterior. Leva outro tipo perdido ao local correcto e, ao passar por mim, pergunta-me se sei para onde devo ir, ao que respondo que não. Gleich bei Ihnen. E volta passado poucos segundos, digo-lhe que tenho aula com o Rudi e ela pergunta-me pelo raio da folha – ich habe es zu Hause vergessen. Vai à procura e antes de ir atira-me o meu apelido em forma de pergunta só para confirmar. Ja genau, fico espantado por saber mas depois ocorre-me que devo o nome mais estranho que ali anda para ela. Volta informada passado pouco tempo e deposita-me com o Rudi.
Na bateria está um puto – diferente do do semestre anterior. Boné na cabeça, cabelo estiloso, óculos retro, calções a cair pelo rabo abaixo. Pergunto-me que raio terá acontecido ao Simon enquanto tiro a guitarra do saco. Eles vão falando, o Rudi pergunta-lhe o que é que ele costuma tocar. As respostas começam a não me agradar, não está habituado a jazz, o Rudi senta-se à bateria para lhe demonstrar que tipo de ritmo terá que fazer. E, de repente, entra um tipo alto, meio careca, camisa aos quadrados, terrivelmente alemão. Onde está a Claudia, a avó italiana que costumava pianar connosco? É aqui que percebo que as turmas foram mudadas. Eu que estava perfeitamente convicto que tudo ia permanecer igual.
O Rudi fala imenso e a mim só me apetece tocar. Estou cansado e esta hora e meia é a minha ideia de perfeito relaxamento apenas se não tiver que seguir uma conversa em alemão sobre técnicas corporais aplicadas a músicos. Sinto-me ficar rezingão, de trombas e tento, esforço-me para que não se note. Finalmente vamos tocar qualquer coisa, depois de duas, três ameaças falhadas. Satin Doll. O pianista chuta para mim a melodia, o baterista entra demasiado depressa, asfixia o balanço da música. A segunda tentativa sai melhor, a estrutura correcta mas nada de especial.
E depois o Blue Bossa, tábua de salvação enquanto não acordamos qual o repertório que vamos tocar. A melodia vai dos meus dedos para os do pianista, sou o primeiro a improvisar. Começo com uma frase longa grave. A cada sol que dou a tarola vibra que é um disparate, o som irrita-me. Subo para um registo mais agudo e deixo-me ir. A certa altura reparo que não estou a pensar muito, não estou a pensar quase nada, estou a sentir. Sinto quando tenho que ir buscar esta e aquela nota, quando tenho que criar dinâmica, quando estou a receber dinâmica da secção rítmica. Fecho os olhos e aprecio como se fosse a alma do recém–falecido que observa o cadáver que acabou de abandonar. A certa altura volto a mim, percebo que se calhar estou a esticar a corda. Abrando, faço uma frase conclusiva, passo a bola a outro.
O melhor solo surge sempre na primeira aula depois de uma certa pausa. Teoria: o cérebro aproveita o intervalo no treino constante e regular para arrumar as ideias e quando é chamado novamente a executar depois da pausa, produz algo diferente – preferencialmente melhor. É claro que o efeito surpresa dura pouco. A segunda aula é a do pior solo porque é nela que a expectativa sai frustrada. A surpresa só é surpresa uma vez. A partir daí é normal e rotina. O processo de evolução contínuo é penoso e demorado, os incrementos não são visíveis a quem está demasiado perto. Da mesma forma que apreciamos o quanto o miúdo cresceu quando não o vemos há séculos, não quando somos pais e nos habituamos aos centímetros extra a cada dia.
No final, enquanto espera que acabe de arrumar as tralhas, o Rudi felicita-me. Não lhe digo que acho que é capaz de ser o melhor que alguma vez fiz. Até me sair outro melhor. Enquanto caminho para o metro penso que deveria gravar as sessões. Depois penso melhor. À terceira vez que ouvisse só iria descobrir erros. Prefiro atribuir a responsabilidade de guardar o melhor solo que alguma vez fiz à falibilidade da minha memória.
Há um mês que não fazia este percurso. Spring break, mais coisa menos coisa. Sigo para o corredor onde estão os cubículos insonorizados. De repente, reparo que me esqueci do papel com a indicação da sala em casa. Não sei onde me devo dirigir. Resolvo ficar à espera, há de estar ali alguém, há de passar ali alguém.
Não me engano. A senhora que só vi no primeiro dia de aulas do semestre anterior. Leva outro tipo perdido ao local correcto e, ao passar por mim, pergunta-me se sei para onde devo ir, ao que respondo que não. Gleich bei Ihnen. E volta passado poucos segundos, digo-lhe que tenho aula com o Rudi e ela pergunta-me pelo raio da folha – ich habe es zu Hause vergessen. Vai à procura e antes de ir atira-me o meu apelido em forma de pergunta só para confirmar. Ja genau, fico espantado por saber mas depois ocorre-me que devo o nome mais estranho que ali anda para ela. Volta informada passado pouco tempo e deposita-me com o Rudi.
Na bateria está um puto – diferente do do semestre anterior. Boné na cabeça, cabelo estiloso, óculos retro, calções a cair pelo rabo abaixo. Pergunto-me que raio terá acontecido ao Simon enquanto tiro a guitarra do saco. Eles vão falando, o Rudi pergunta-lhe o que é que ele costuma tocar. As respostas começam a não me agradar, não está habituado a jazz, o Rudi senta-se à bateria para lhe demonstrar que tipo de ritmo terá que fazer. E, de repente, entra um tipo alto, meio careca, camisa aos quadrados, terrivelmente alemão. Onde está a Claudia, a avó italiana que costumava pianar connosco? É aqui que percebo que as turmas foram mudadas. Eu que estava perfeitamente convicto que tudo ia permanecer igual.
O Rudi fala imenso e a mim só me apetece tocar. Estou cansado e esta hora e meia é a minha ideia de perfeito relaxamento apenas se não tiver que seguir uma conversa em alemão sobre técnicas corporais aplicadas a músicos. Sinto-me ficar rezingão, de trombas e tento, esforço-me para que não se note. Finalmente vamos tocar qualquer coisa, depois de duas, três ameaças falhadas. Satin Doll. O pianista chuta para mim a melodia, o baterista entra demasiado depressa, asfixia o balanço da música. A segunda tentativa sai melhor, a estrutura correcta mas nada de especial.
E depois o Blue Bossa, tábua de salvação enquanto não acordamos qual o repertório que vamos tocar. A melodia vai dos meus dedos para os do pianista, sou o primeiro a improvisar. Começo com uma frase longa grave. A cada sol que dou a tarola vibra que é um disparate, o som irrita-me. Subo para um registo mais agudo e deixo-me ir. A certa altura reparo que não estou a pensar muito, não estou a pensar quase nada, estou a sentir. Sinto quando tenho que ir buscar esta e aquela nota, quando tenho que criar dinâmica, quando estou a receber dinâmica da secção rítmica. Fecho os olhos e aprecio como se fosse a alma do recém–falecido que observa o cadáver que acabou de abandonar. A certa altura volto a mim, percebo que se calhar estou a esticar a corda. Abrando, faço uma frase conclusiva, passo a bola a outro.
O melhor solo surge sempre na primeira aula depois de uma certa pausa. Teoria: o cérebro aproveita o intervalo no treino constante e regular para arrumar as ideias e quando é chamado novamente a executar depois da pausa, produz algo diferente – preferencialmente melhor. É claro que o efeito surpresa dura pouco. A segunda aula é a do pior solo porque é nela que a expectativa sai frustrada. A surpresa só é surpresa uma vez. A partir daí é normal e rotina. O processo de evolução contínuo é penoso e demorado, os incrementos não são visíveis a quem está demasiado perto. Da mesma forma que apreciamos o quanto o miúdo cresceu quando não o vemos há séculos, não quando somos pais e nos habituamos aos centímetros extra a cada dia.
No final, enquanto espera que acabe de arrumar as tralhas, o Rudi felicita-me. Não lhe digo que acho que é capaz de ser o melhor que alguma vez fiz. Até me sair outro melhor. Enquanto caminho para o metro penso que deveria gravar as sessões. Depois penso melhor. À terceira vez que ouvisse só iria descobrir erros. Prefiro atribuir a responsabilidade de guardar o melhor solo que alguma vez fiz à falibilidade da minha memória.
segunda-feira, 2 de abril de 2012
28
Tiraram-me do gabinete onde passei o último ano. Um gabinete grande de duas pessoas. Onde estiveram efectivamente duas pessoas até há cerca de um mês e meio, quando o meu antigo colega se foi embora. Virado a poente. A vista não era nada de especial mas o pôr-do-sol era glorioso, rasgado pelos milhentos riscos esbranquiçados dos aviões.
Mudaram-me para o outro lado do corredor. Tenho muito menos luz. Do meu novo gabinete vejo um pouco do centro da cidade mas tenho constantemente uma torre gigante a olhar-me para dentro da janela. Parece que me vigia. Um giant brother.
Mudaram-me para o outro lado do corredor. Tenho muito menos luz. Do meu novo gabinete vejo um pouco do centro da cidade mas tenho constantemente uma torre gigante a olhar-me para dentro da janela. Parece que me vigia. Um giant brother.
domingo, 1 de abril de 2012
Há uma doçura inexplicável em ti.
Suave e quente. Como se estivesses sempre pronta a receber. Até a quem te trata mal. Portas abertas, coração escancarado. Um sentimento de pertença, no limite, quase se assemelha a algo materno. E é por isso que é excessivo. Um conforto que se torna desconfortável.
domingo, 25 de março de 2012
É de manhã e eu faço a minha rotina.
Faço a rua que vai da praça à ponte. A meio, paro no semáforo. Sem nada para fazer naqueles instantes em que a luz teima em não ficar verde, olho em redor. À minha frente está um engravatado como eu. Leva um portátil ao ombro e traz um saco na mão direita. Um saco de papel daqueles decentes, de loja de roupa. Dentro do saco estão camisas embrulhadas, está com ar de quem vai passar na lavandaria antes de ir para o escritório. O mais interessante é que, no meio das camisas, estão duas baquetes de bateria. Bom gosto: marca Vic Firth.
quarta-feira, 14 de março de 2012
Oh pra mim montes da geek
Uma distribuição pergunta ao marido, enquanto se olha ao espelho:
- Honey, do you think I have a fat tail?
- Honey, do you think I have a fat tail?
terça-feira, 13 de março de 2012
segunda-feira, 12 de março de 2012
Rente ao chão
A história do prefácio espelha bem o nível de Cavaco. E, por arrasto, (reforça) o mau Presidente da República que é.
domingo, 11 de março de 2012
sábado, 10 de março de 2012
terça-feira, 28 de fevereiro de 2012
Oracle
A parte melhor de não ser o gajo importante da reunião é a possibilidade de sair da sala com o pretexto de ir ver o mail por não ter blackberry.
segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012
domingo, 26 de fevereiro de 2012
GI Jane
Para um actor ou actriz, fazer uma cena em que se rapa o cabelo deve ser tramada. Um segundo take não é propriamente uma opção.
quinta-feira, 23 de fevereiro de 2012
quarta-feira, 22 de fevereiro de 2012
terça-feira, 21 de fevereiro de 2012
segunda-feira, 20 de fevereiro de 2012
Numbness
«The man who looks for security, even in the mind, is like a man who would chop off his limbs in order to have artificial ones which will give him no pain or trouble.»
Sexus, Henry Miller
Sexus, Henry Miller
domingo, 19 de fevereiro de 2012
Trilho
Tentaste convencer-me que o caminho natural da ilusão é, inevitavelmente, a desilusão. E, com isso, desiludiste-me. Inevitavelmente.
sábado, 18 de fevereiro de 2012
Queimar a pestana
Às vezes penso seriamente se ler tanta coisa não me vai fazer mal. Estes olhinhos que a terra há-de comer vão chegar ao fim completamente gastos e desfeitos. Logo eles que não são grande espiga, coitados. Enquanto penso nisso, cá vai mais um capítulo.
terça-feira, 14 de fevereiro de 2012
segunda-feira, 13 de fevereiro de 2012
Sá
Quando se trata de clubes que fazem rir pela escolha de treinadores, nada bate o Sporting.
sábado, 11 de fevereiro de 2012
quinta-feira, 9 de fevereiro de 2012
terça-feira, 7 de fevereiro de 2012
Tanta coisa...
De natureza biométrica, o meu passaporte regista uma série de dados XPTO sobre mim em locais recônditos que não estão visíveis mas que os senhores das fronteiras dos EUA conhecem perfeitamente. No final, ficam a saber mais sobre mim do que eu próprio. Mas, curiosamente, um dos poucos dados que já existia nas versões antigas de passaportes, está claramente errado: eu não meço 1,76.
segunda-feira, 6 de fevereiro de 2012
O piloto começa com a lengalenga do costume...
... boa noite senhores passageiros, fala o comandante assim assado, iniciámos a descida, contamos aterrar dentro de vinte minutos às tantas horas, hora local mais tantas do que em Lisboa. E depois acrescenta: "A temperatura é de onze graus negativos" e de imediato surge um burburinho infernal dentro do avião
sábado, 4 de fevereiro de 2012
Contar histórias
Com "h", continuo a armar-me em Vasco Graça Moura e a não acatar as novas regras da minha (?) língua. Mas dizia, contar histórias. É isso que faço. E não é só aqui, apercebi-me há pouco tempo. No trabalho, passamos a vida a discutir enredos: "What is the story behind this?".
quinta-feira, 2 de fevereiro de 2012
quarta-feira, 1 de fevereiro de 2012
terça-feira, 31 de janeiro de 2012
É desta que o Inverno resolveu bater à porta
Menos não sei quantos graus com "feels like" de ainda mais menos não sei quantos graus. O frio normal da época que até então só tinha tido um frio anormal de tão tímido. O ar gélido entra queima a pele, rasga as entranhas quando entra em direcção aos pulmões. Os pés regelam, os olhos lacrimejam, o maxilar parece que não quer mexer quanto tento falar.
segunda-feira, 30 de janeiro de 2012
domingo, 29 de janeiro de 2012
sábado, 28 de janeiro de 2012
Anda Maria!!
Pela primeira vez em muito muito tempo vou colar-me ao televisor para ver uma final feminina.
quinta-feira, 26 de janeiro de 2012
Feeble
A companhia aérea Norwegian Air Shuttle airlines vai comprar 222 aviões de enfiada. E não uns aviõezinhos de papel quaisquer: 122 Boeing 737 e 100 Airbus. A frota total da Lufthansa ronda os 300 aviões. Os noruegues estão doidinhos das ideias.
quarta-feira, 25 de janeiro de 2012
Fusos
Fizeram a maldade de engendrar um Nadal-Federer para logo de manhã. E isto é uma chatice porque eu até tenho que trabalhar. Enfim, resta a consolação de um resultado pouco original.
terça-feira, 24 de janeiro de 2012
It ain't complicated
Missão do mês: sentir o dois e o quatro em vez do um e do três.
segunda-feira, 23 de janeiro de 2012
domingo, 22 de janeiro de 2012
Chega de saudade
Esqueceste-te da caneta. Em cima da mesa, ladeada de cadeiras toscas. Uma caneta velha, uma daquelas BIC
BIC laranja BIC cristal
Tosca como as cadeiras da mesa de madeira. Nem sequer tem tampa. Uma daquelas BIC que usávamos na escola para mandar bolas de papel uns aos outros. Tiraste-a de dentro da mala juntamente com uma molhada de papéis, tudo embrulhado. Quase me senti mal quando me senti mais organizado do que tu
Esqueceste-te dela aqui.
É estranho ter em casa uma coisa que te pertence. Quase não te conheço, sinto quase que a BIC esquecida
BIC laranja BIC cristal
é um pequeno intruso, um cavalo de Tróia que deixaste aqui para invadir esta casa, fortaleza. Para me invadir. Agora não sei o que fazer: devolvo-te a caneta da próxima vez que te vir? Se fosse uma Mont Blanc não hesitaria nem que fosse pela etiqueta do preço. Mas devolver uma BIC parece uma coisa reles. Ainda por cima nem sequer tem tampa. Tiraste-a de dentro da mala com a mesma destreza com que te livraste dos sapatos quando entraste depois de me teres perguntado. Para mim é indiferente, faz como se estivesses em tua casa.
Prefiro estar descalça
Em cima da mesa de madeira clara, as cadeiras toscas, uma de cada lado, sentaste-te de frente para mim, um copo de água na mão direita – pediste-me água – a caneta que usaste para tomar nota de alterações, para tomar nota da lista para a próxima vez
Vamos encontrar-nos outra vez, não é?
Claro que sim. Vamos encontrar-nos outra vez e eu talvez te leve a caneta sem tampa que deixaste em cima do tampo da mesa de madeira clara com duas cadeiras toscas, uma BIC como eu já não via há imenso tempo.
BIC laranja BIC cristal
Tosca como as cadeiras da mesa de madeira. Nem sequer tem tampa. Uma daquelas BIC que usávamos na escola para mandar bolas de papel uns aos outros. Tiraste-a de dentro da mala juntamente com uma molhada de papéis, tudo embrulhado. Quase me senti mal quando me senti mais organizado do que tu
Esqueceste-te dela aqui.
É estranho ter em casa uma coisa que te pertence. Quase não te conheço, sinto quase que a BIC esquecida
BIC laranja BIC cristal
é um pequeno intruso, um cavalo de Tróia que deixaste aqui para invadir esta casa, fortaleza. Para me invadir. Agora não sei o que fazer: devolvo-te a caneta da próxima vez que te vir? Se fosse uma Mont Blanc não hesitaria nem que fosse pela etiqueta do preço. Mas devolver uma BIC parece uma coisa reles. Ainda por cima nem sequer tem tampa. Tiraste-a de dentro da mala com a mesma destreza com que te livraste dos sapatos quando entraste depois de me teres perguntado. Para mim é indiferente, faz como se estivesses em tua casa.
Prefiro estar descalça
Em cima da mesa de madeira clara, as cadeiras toscas, uma de cada lado, sentaste-te de frente para mim, um copo de água na mão direita – pediste-me água – a caneta que usaste para tomar nota de alterações, para tomar nota da lista para a próxima vez
Vamos encontrar-nos outra vez, não é?
Claro que sim. Vamos encontrar-nos outra vez e eu talvez te leve a caneta sem tampa que deixaste em cima do tampo da mesa de madeira clara com duas cadeiras toscas, uma BIC como eu já não via há imenso tempo.
sexta-feira, 20 de janeiro de 2012
Flight
Ponho a moeda
enfim, não é bem uma moeda
de plástico a simular uma moeda mas das verdadeiras
50 cêntimos, um euro?
de uma cadeia de supermercado que é concorrente daquela onde estou agora
como se pusesse uma moeda que diz Continente num carrinho do Pingo Doce
no carrinho de supermercado e tenho sempre aquela impressão que o estou a enganar
não só porque a moeda não é verdadeira, é de plástico
mas a imitar uma das verdadeiras
50 cêntimos, 1 euro?
mas também porque não é desta cadeia de supermercados
é doutra
e fico sempre à espera que o carrinho pare e se recuse a andar mais
a mim não me enganas
e eu não sei se o engano por usar uma moeda que não é uma moeda
se por usar uma coisa de plástico que pretende simular uma moeda mas que é da concorrência
50 cêntimos, 1 euro?
enfim, não é bem uma moeda
de plástico a simular uma moeda mas das verdadeiras
50 cêntimos, um euro?
de uma cadeia de supermercado que é concorrente daquela onde estou agora
como se pusesse uma moeda que diz Continente num carrinho do Pingo Doce
no carrinho de supermercado e tenho sempre aquela impressão que o estou a enganar
não só porque a moeda não é verdadeira, é de plástico
mas a imitar uma das verdadeiras
50 cêntimos, 1 euro?
mas também porque não é desta cadeia de supermercados
é doutra
e fico sempre à espera que o carrinho pare e se recuse a andar mais
a mim não me enganas
e eu não sei se o engano por usar uma moeda que não é uma moeda
se por usar uma coisa de plástico que pretende simular uma moeda mas que é da concorrência
50 cêntimos, 1 euro?
quarta-feira, 11 de janeiro de 2012
Acho piada aos cinemas manhosos.
Aqueles com salas velhas e manhosas, ecrãs pequenos e cadeiras desconfortáveis, com cheiro a guarda-roupa. Não há pipocas. Há filmes um pouco, meio e totalmente marados. Os anúncios são mais curtos. Os bilhetes nunca esgotam. Começam logo por ter tipos mal-encarados a entender nas bilheteiras, que claramente não ganham à comissão. Estão sempre a fazer qualquer coisa para ajudar a passar o tempo – não têm muitos clientes – e, sempre que aparece um, ficam chateados por ter de interromper a leitura da revista. E depois aquela coisa de não haver lugares marcados. Que às vezes é pior do que os cinemas em que há e estão à pinha porque as pessoas ficam a hesitar qual das inúmeras cadeiras vazias hão-de escolher. Casais quase discutem se devem ir mais para a frente ou para trás, meio ou de ladecos. Ora, tudo isto só pode melhorar a experiência de ver um filme.
quinta-feira, 5 de janeiro de 2012
domingo, 1 de janeiro de 2012
«E eis a litania:
Ámen! Louvor, honra, sabedoria, reconhecimento, glória e força do nosso Deus, de eternidade em eternidade!
- E respondeu o burro – I-han!
Ele carrega os nossos fardos, ele tomou a forma de um servidor; ele é de coração humilde e nunca diz não; e quem ama bem o seu Deus, bem o castiga.
- E respondeu o burro – I-han!
Ele não fala, salvo para aprovar sempre o mundo que criou; eis a sua maneira de louvar a sua criação. E se não fala, é por finura. Assim, raramente se engana.
- E respondeu o burro – I-han!
Ele passa desapercebido no mundo. Cinzenta é a cor favorita que cobre a sua virtude. Se tem espírito, oculta-o; mas todo o mundo crê nas longas orelhas.
- E respondeu o burro – I-han!
Quanta sabedoria se esconde naquelas longas orelhas, naquela decisão de dizer sempre sim e nunca não! Pois não criou ele o mundo à sua imagem, tão estúpido quanto é possível?
- E respondeu o burro – I-han!
Quer sigas caminhos direitos, quer tortuosos, pouco te importa aquilo que nos parece direito ou tortuoso, a nós, homens. A tua candura está em não saberes o que é a candura.
- E respondeu o burro – I-han!
Eis que não repeles ninguém, nem mendigos nem reis. Deixas vir a ti as criancinhas e quando os mais velhacos tentam engodar-te, respondes simplesmente: I-han!
- E respondeu o burro – I-han!
Amas as burricas e os figos frescos, não desdenhas a boa mesa. Um cardo te revigora quando tens fome. Aí reside uma divina sabedoria.
- E respondeu o burro – I-han!»
Assim falava Zaratustra, Friedrich Nietzsche
Ámen! Louvor, honra, sabedoria, reconhecimento, glória e força do nosso Deus, de eternidade em eternidade!
- E respondeu o burro – I-han!
Ele carrega os nossos fardos, ele tomou a forma de um servidor; ele é de coração humilde e nunca diz não; e quem ama bem o seu Deus, bem o castiga.
- E respondeu o burro – I-han!
Ele não fala, salvo para aprovar sempre o mundo que criou; eis a sua maneira de louvar a sua criação. E se não fala, é por finura. Assim, raramente se engana.
- E respondeu o burro – I-han!
Ele passa desapercebido no mundo. Cinzenta é a cor favorita que cobre a sua virtude. Se tem espírito, oculta-o; mas todo o mundo crê nas longas orelhas.
- E respondeu o burro – I-han!
Quanta sabedoria se esconde naquelas longas orelhas, naquela decisão de dizer sempre sim e nunca não! Pois não criou ele o mundo à sua imagem, tão estúpido quanto é possível?
- E respondeu o burro – I-han!
Quer sigas caminhos direitos, quer tortuosos, pouco te importa aquilo que nos parece direito ou tortuoso, a nós, homens. A tua candura está em não saberes o que é a candura.
- E respondeu o burro – I-han!
Eis que não repeles ninguém, nem mendigos nem reis. Deixas vir a ti as criancinhas e quando os mais velhacos tentam engodar-te, respondes simplesmente: I-han!
- E respondeu o burro – I-han!
Amas as burricas e os figos frescos, não desdenhas a boa mesa. Um cardo te revigora quando tens fome. Aí reside uma divina sabedoria.
- E respondeu o burro – I-han!»
Assim falava Zaratustra, Friedrich Nietzsche
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