domingo, 1 de janeiro de 2012

«E eis a litania:
Ámen! Louvor, honra, sabedoria, reconhecimento, glória e força do nosso Deus, de eternidade em eternidade!
- E respondeu o burro – I-han!
Ele carrega os nossos fardos, ele tomou a forma de um servidor; ele é de coração humilde e nunca diz não; e quem ama bem o seu Deus, bem o castiga.
- E respondeu o burro – I-han!
Ele não fala, salvo para aprovar sempre o mundo que criou; eis a sua maneira de louvar a sua criação. E se não fala, é por finura. Assim, raramente se engana.
- E respondeu o burro – I-han!
Ele passa desapercebido no mundo. Cinzenta é a cor favorita que cobre a sua virtude. Se tem espírito, oculta-o; mas todo o mundo crê nas longas orelhas.
- E respondeu o burro – I-han!
Quanta sabedoria se esconde naquelas longas orelhas, naquela decisão de dizer sempre sim e nunca não! Pois não criou ele o mundo à sua imagem, tão estúpido quanto é possível?
- E respondeu o burro – I-han!
Quer sigas caminhos direitos, quer tortuosos, pouco te importa aquilo que nos parece direito ou tortuoso, a nós, homens. A tua candura está em não saberes o que é a candura.
- E respondeu o burro – I-han!
Eis que não repeles ninguém, nem mendigos nem reis. Deixas vir a ti as criancinhas e quando os mais velhacos tentam engodar-te, respondes simplesmente: I-han!
- E respondeu o burro – I-han!
Amas as burricas e os figos frescos, não desdenhas a boa mesa. Um cardo te revigora quando tens fome. Aí reside uma divina sabedoria.
- E respondeu o burro – I-han!»

Assim falava Zaratustra, Friedrich Nietzsche

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