quarta-feira, 27 de fevereiro de 2013

Áspero

Sou um péssimo bebebor de café e chá e comedor de sopa: ando sempre com a língua queimada.

sábado, 23 de fevereiro de 2013

Ali

A tua vontade não chega para que as coisas aconteçam. Nunca chegou.

sexta-feira, 22 de fevereiro de 2013

Fica sempre até mais tarde do que eu.

Quando percebe que estou a arrumar as tralhas para sair – e mesmo assim não é propriamente cedo, não costumo sair antes das sete – retira os auscultadores enormes da cabeça e sorri. Depois desculpa-se. Diz-me que já não deve ficar muito mais tempo. Digo-lhe que não tem que se justificar mas como já não é a primeira vez que me meto com ela por fazer noitadas, justifica-se sempre.

You’re lucky you don’t have to give tutorials.

Ao que eu respondi instintivamente “but I have other shit!”. Ri-se e só percebo que é da minha falta de polidez quando repete as duas últimas palavras da minha frase. Repito-a corrigindo-me e perco a graça que não antevi que ia ter. Acrescento: dentro de pouco tempo estarei outra vez a trabalhar a tempo inteiro. A fazer babysitting de chefes. E foi aí que me ocorreu:

Bosssitting!

quinta-feira, 21 de fevereiro de 2013

Life is a cabaret

Vinte e um bocado páginas cheias de expressões feiosas, um molho de resultados de um paper para sintetizar numa curta apresentação, um resumo de proposta de investigação para outro paper. Guerras abertas com programação dinâmica, ARDL e agregados monetários. Para além disso, acho que o meu nariz está a tentar dizer-me que estou a ficar constipado.

terça-feira, 19 de fevereiro de 2013

Inscreveu-se em aulas de pole dancing.

Estava a explicar-nos como é difícil, é preciso ter muita força . Mas está a gostar. Há dias, em conversa com os pais – que por sinal são mais velhos do que eu esperava dada a idade dela – resolveu dizer-lhes. Fiquei a olhar para ela: why would you do that? Riu-se efusivamente. Perguntei-lhe pela reacção deles. Nada de especial, respondeu, a mãe perguntou-lhe se o varão era vertical ou horizontal. Fiquei a olhar para ela sem perceber. Acrescentou:

A minha mãe fez ballet.

sexta-feira, 15 de fevereiro de 2013

quinta-feira, 14 de fevereiro de 2013

Talvez seja o momento de parar de procurar as respostas.

Aceitar. Que não surgem que teimam em aparecer. Parar e aceitar. Deixar as perguntas cair em saco roto. Ignorar os pontos de interrogação. Altos e redondos. Curvos. Deixar as perguntas sem resposta.

Ou talvez seja o momento de parar de fazer as perguntas.

quarta-feira, 13 de fevereiro de 2013

Domingar

Lutou com a chuva e com a bicicleta - a corrente saltou a meio caminho e teve que sujar as mãos. Chegou atrasada e encharcada. Explicou-nos a história, a razão pela qual não queria regressar a casa a pedalar, preferia deixar ficar a bicicleta para trás e apanhá-la no dia seguinte. Gozámos um bocadito. Palavra puxa palavra e inventámos isto: sunday biker.

terça-feira, 12 de fevereiro de 2013

Mais sobre a senhora desdentada do bar da faculdade

Tenho o café na minha mão e estou a dirigir-me para pagar quando vejo o bolo de banana na prateleira a sorrir para mim. Não resisto: pego num dos pratos de papel para o efeito e pego na pinça. Reparo que as fatias são mesmo finas – não costuma ser assim – mas, que se lixe, levo à mesma. Na caixa está a minha amiga. Diz-me quanto lhe devo e depois acrescenta “go ahead a take another slice, love”. Sorri e comentei que estavam particularmente fininhas. Agradeci umas três vezes.

domingo, 10 de fevereiro de 2013

So ist es

Irlanda contra Inglaterra na Six Nations e chove desalmadamente. Não percebo nada de rugby mas antevejo muita lama. Disseram-me que não posso perder o espectáculo: o que vai ter lugar no Aviva Stadium - pela televisão - e o que vai ter lugar no pub - um qualquer, é irrelevante qual.

quarta-feira, 6 de fevereiro de 2013

Licht

Fecha a porta quando saires. Fecha a porta e apaga a luz. Se faz favor. Sai. Sai como se nunca tivesses estado cá dentro, sai como se nunca tivesses posto um pé cá dentro. Vamos fingir que nunca entraste aqui. Vamos fingir que isto nunca aconteceu. Nada disto. Desde que saias e feches a porta, desde que saias lentamente e deixes tudo às escuras, tal e qual como encontraste quando entraste. Mas vamos esquecer isso. Vamos evitar falar disso, vamos deixar tudo cair no esquecimento e não mais referir que, a certa altura, alguém mexeu no interruptor. Já sabes. Fecha a porta atrás de ti.

E não te esqueças de apagar a luz.

terça-feira, 5 de fevereiro de 2013

Ahora voy a decir lo que pienso

Tell me it's not true

Não sei como te dizer que não gosto de ti. Quer dizer, não é bem não gostar de ti, claro que gosto de ti, seria impossível a quem quer que fosse não gostar de ti. Só não gosto de ti a esse ponto. Convenceste-te
e tentaste convencer-me
que gostava de ti a esse ponto. E não é verdade. Nunca foi verdade e é estranho que alguma vez pudesses ter tido, eu pudesse ter tido dúvidas em relação a isso. Sei-o agora.
Sempre soube, para ser honesto
E agora não sei como te dizer que sei que não gosto de ti. Embora às vezes pense que já percebeste, que já sabes que não sei como te dizer. Mas preferes não pensar nisso, preferes pensar que gosto de ti
A esse ponto
E por isso censuras-me quando não to digo – deveria dizer-to – quando na verdade o que não te digo é exactamente o oposto daquilo que te deveria dizer.

segunda-feira, 4 de fevereiro de 2013

Combustão interna

O drogado foi a correr tirar a carta de condução porque ouviu falar em road tripping. De pesados.

sábado, 2 de fevereiro de 2013

Was geht ab?

O café fica no piso térreo do edifício, perto da porta que abre o relvado sempre verde. No meio, um Lavazza point, uma espécie de joia da coroa para os amantes de suposto café premium – porque também é possível tirar outros mais baratos numa daquelas máquinas duvidosas. Escusado será de dizer que sou um habitué. Para pessoas como eu, há um cartão com seis chávenas pequenas e uma sétima maior: ao fim de meia dúzia de bebidas, a sétima é por conta da casa. O registo é feito com um carimbo pequenino que esborrata o nome da faculdade.

Há uma das senhoras que lá trabalha a quem acho particular graça. Incrivelmente feia, magra, gasta, os poucos dentes que lhe sobram estão completamente espalhados e são castanhos. A fazer lembrar desenhos-animados ou caricaturas (demasiadamente) exageradas, estilo Ren and Stimpy. Mas chama-me “my love”. Por exemplo: “so what’s it going to be, my love?” e estas coisas a mim caem-me (demasiadamente) bem, mesmo sabendo que não é tratamento especial, faz o mesmo a toda a gente. Leva-me até Cuba e às senhoras que vendiam tretas aos turistas: “hola mi amor”, “te queda muy bien, mi amor”.

Sexta-feira a seguir ao (meu) almoço (tardio) o bar estava estranhamente deserto. No Lavazza Point, havia apenas uma rapariga alta à minha frente. Pediu o que queria e aparentemente não conhecia o cartão da meia dúzia e sétimo café à pala. A senhora desdentada explicou-lhe rapidamente e, quando chegou à altura do carimbo, em vez de um, foram uns três ou quatro em catadupa, depois de olhar para ver se ninguém a estava a controlar. A rapariga olhou para mim, riu-se, eu olhei para ela com a cara de espanto que consegui improvisar. Quando chegou a minha vez e coloquei o meu cartão – que por acaso só ainda tinha um carimbo – em cima do balcão para o registo do double espresso que acabara de pedir, olhou para lá de mim, disse-me “move just a little bit to your left, love” e depois de assegurar que eu estava a bloquear o campo de visão da colega que também trabalha ali, carimbou desenfreadamente.