domingo, 30 de dezembro de 2018

Ordem e progresso

Há já alguns meses que não falávamos. Aí desde o início do verão. Uma das coisas que lhe disse, na altura, foi para ver o Mecanismo, a série do Padilha. Desta vez, a conversa começou pela obrigatoriedade de votar de acordo com a lei brasileira, sob pena de coisas como, entre tantas outras, não poder renovar o passaporte, ser negado um pedido de empréstimo no banco, o ingresso na faculdade ser barrado. Ela disse que tinha votado nas últimas presidenciais e tinha guardado religiosamente o comprovativo, como sempre faz. E acrescentou que o voto tinha sido no Bolsonaro - o tema que, só aqui entre nós, eu queria aproveitar para discutir com eles, dois brasileiros dos seus 40 e picos anos.

Lancei mais algumas achas, o seguinte para a fogueira ganhar uma dimensão crítica e, a partir daí, arder por si: e esta do Moro aceitar ser ministro da Justiça? Defenderam a decisão dele, argumentando que é a única forma de acabar de fazer aquilo que começou enquanto juiz, sem os entraves e bloqueios que lhe foram semeando pelo caminho, e rodeado de pessoas da sua inteira confiança, sem ligações partidárias. Porque é preciso pôr ordem no país. E só um governo como o do Bolsonaro o pode fazer. Porque é preciso acabar com o ciclo da corrupção. Viu quando tentaram arranjar uma ordem de tribunal para pôr o Lula fora da prisão outra vez?

A forma como mentem descaradamente às pessoas. Olha o apartamento do Guarujá. É possível que seja o apartamento de um amigo e o Lula vai lá mais vezes que o amigo?? Há uma fotografia gigante dele na entrada? Você faria isso na casa do seu amigo, botar uma foto enorme sua na entrada?? Respondo negativamente e relembro que temos um ex-primeiro-ministro a contas com a Justiça por algo bastante similar. Têm a mesma escola, aprenderam uns com os outros, são farinha do mesmo saco.

E não são só os ricos e poderosos que se alimentam. Olha as bolsas que foram criadas para pobres. Pede-me desculpa por aquilo que acrescenta de seguida
Qual é a única coisa que pobre sabe fazer? É ter filho.
O montante é uma ninharia mas são importantes para a franja da população mais pobre, que se dedica a ter filhos como fonte de rendimento, através da acumulação destes apoios estatais. No fundo, são mecanismos de fidelização eleitoral: na prática, não são tomadas medidas que verdadeiramente mudem a vida destas populações e que lhes dêem melhores condições e possibilidades de vida; dão-lhes a esmola que lhes permite (sobre)viver e não mais, para que se tornem e permaneçam dependentes.

E o caso caricato das designadas bolsas-presidiário (cuja existência desconhecia), atribuídas aos dependentes de pessoas encarceradas. Não concordam com as visitas conjugais dos reclusos, mesmo quando tento contrapor dizendo que também têm direitos e relembrando a discussão suscitada pela recente greve dos guardas prisionais em Portugal. Descrevem-me como são as visitas conjugais domingueiras no país deles, que envolvem várias tendas no pátio da prisão. E, o que mais os escandaliza, a utilidade destas visitas para o aumento da prole e, neste caso concreto, a acumulação de bolsas atribuídas pelos filhos e pelo "estatuto" de presidiário.

Como é possível que isto aconteça quando há mulheres a dar à luz no chão de um hospital no Rio de Janeiro porque não há ninguém para tratar delas? - diz-me com a voz um pouco trémula e os olhos a humedecer ligeiramente. O vídeo circulou pela internet, encontrei esta reportagem da Globo.

E as questões de segurança. Ou melhor, de insegurança.
O que faz uma pessoa que sai à rua com um fusil? Não pode ser coisa boa. E não há outra forma de lidar com situações deste género senão recorrendo a mão pesada, acção decisiva. Aproveito para ir até às Filipinas e arrastar o encantador Duterte para a discussão mais a sua política musculada (um pleonasmo de utilização frequente neste contexto) de atirar a matar antes de julgar.
Tem que ser!
Tentam convencer-me (convencer-se?) que é a única forma de poder reganhar o controlo da situação. Porque a impunidade é demasiada, fazem o que querem.

E os casos de abusos sexuais nos transportes públicos. "O ser humano" (ele usa esta expressão nas descrições) não faz mais nada, coloca-se de pé ao lado da mulher e satisfaz-se à frente de toda a gente. Ela complementa: já foi vítima de uma situação destas, era ainda uma adolescente de 16 anos. Ficou sem reacção, sem saber como reagir e defender-se. Se bem que a possibilidade de defesa, em princípio, não é muito elevada, já que quem ousa contestar é, de imediato, ameaçado ou alvo de represálias.

E é escusado ir à polícia. A polícia não faz nada. A polícia também tem medo, evita o confronto e foge como qualquer outro. Já para não dizer que também recebe dos próprios bandidos. Que fazer quando lhes pagam 1000 reais por mês? O bandido vem e só precisa perguntar quanto ele quer para olhar para o outro lado. Os pais dele, quando os visita nas férias, dizem-lhe para fazer sempre o que a polícia disser e para não abrir a boca em nenhuma circunstância.
Com o seu sotaque meio quebrado, percebem que você não é de cá e vão pensar que tem dinheiro.

Foi a minha vez de me desculpar antes de falar, pela pergunta que ia fazer e atrevi-me a fazê-la: não têm medo que o Brasil vire um estado autoritário e repressivo?
Confesso que, a esta pergunta, esperava uma resposta mais contida, que admitisse alguns riscos e perigos de perda de liberdades mas que estes, ainda assim, fossem compensados pelas vantagens que a mudança de presidente acarretaria. Nada disso:
Quem me dera! Ao menos podia sair à rua!

Têm idade suficiente para ter vivido algum tempo durante a ditadura brasileira, enquanto eram miúdos, e não era assim tão mau como dizem. Os brasileiros que vêm para cá acham Portugal um paraíso. E é nesta senda que, a certa altura, atravessa para este lado do Atlântico e diz o nome Salazar, preparando-se para acrescentar qualquer coisa como "também fez coisas boas". É nesse preciso momento que o interrompo, não permito que termine essa frase, não consigo senão contrapor. Começo por lhe dizer que, se ainda vivêssemos nesse tempo, não poderíamos sequer ter a conversa que estávamos a ter. Acrescento mais exemplos de censura, da falta de liberdade de imprensa, da PIDE e dos presos políticos. Neste caso - e só mesmo neste - consigo fazê-los recuar um pouco. A certa altura admitem que a ditadura portuguesa possa ter sido pior do que a brasileira. Como se existisse uma espécie de escala, de pantone para avaliar a gradação dos regimes autoritários.

É tarde. Ela entra noutra divisão por um bocado. Vai buscar o casaco e as suas coisas para sair. Eu já estou de casaco vestido e a preparar-me para ir embora. Ele ainda vai ficar.
O que está escrito na bandeira não é mais.
Diz-me, os olhos vidrados no vazio do chão de pedra.

quinta-feira, 27 de dezembro de 2018

segunda-feira, 24 de dezembro de 2018

Benéfico a longo prazo

«Em cada uma das conversas de 1973, Mao fez questão de transmitir a impermeabilidade da China a qualquer forma de pressão, mesmo e talvez especialmente à pressão nuclear. Se uma guerra nuclear matasse todos os chineses com mais de trinta anos, disse ele em fevereiro, isso podia revelar-se benéfico a longo prazo para a China, ao ajudar a unificá-la linguisticamente: «Se a União Soviética lançasse as suas bombas e matasse todos os que têm mais de 30 anos e são chineses, isso resolver-nos-ia o problema [da complexidade dos muitos dialectos da China]. Porque as pessoas de idade como eu não conseguem aprender chinês [mandarim].»»

Da China, Henry Kissinger

sexta-feira, 21 de dezembro de 2018

quarta-feira, 19 de dezembro de 2018

Vai Formosa e não segura

Não é China. Mas também não é o Japão ou a Coreia. É uma mistura, um caldeirão onde se misturam uma série de ingredientes diferentes, que resultam num caldinho único.

Faz-me evocar o The man in the high castle, romance no qual Philip K. Dick constrói uma História alternativa, resultante de um desenlace diferente na Segunda Guerra Mundial: parte da premissa da vitória da Alemanha nazi e do Japão e imagina o que resultaria desse cenário. No caso de Taiwan, o exercício seria a elaboração de um contrafactual que resultaria de assumir que o Partido Comunista não tinha ganho ao Partido Nacionalista no final da década de 40. Pura especulação: é muito difícil atribuir uma probabilidade à possibilidade de o resto da China continental se tornar em algo similar ao que é actualmente aquela ilha.

segunda-feira, 17 de dezembro de 2018

Dou por mim precisamente no mesmo sítio do aeroporto de Pequim:

ao fundo de umas escadas, obrigam-nos a dar volta por debaixo do lance e desembocar numa fila. Uma espécie de déjà vu que me leva a questionar se não estarei no Matrix. À frente, está um tipo que verifica o passaporte e o cartão de embarque e nos tira uma fotografia com uma câmara de computador. Depois deste primeiro controle, segue-se uma única fila para o aparelho de raio X.

A mesma rotina: retiro a máquina de dentro da mochila almofadada, espalho o corpo e as lentes num daqueles recipientes de plástico que parecem adequados para expor uns robalos ou fanecas, em cima de gelo, num mercado de peixe. Tudo decorrer com a maior normalidade até a funcionária que inspeciona as minhas coisas desligar, rudemente, o cabo USB que ligava ao meu telemóvel ao power bank.

De seguida, perscrutou intensamente o power bank, olhou detalhadamente enquanto virava o aparelho em todos ângulos. Mostrou a outro colega, o tipo que estava a controlar o monitor do raio X e que que, após alguns segundos, lhe devolveu o power bank com um encolher de ombros. Ao terceiro funcionário, já tinha arrumado todas as restantes tralhas e posto o cinto nas calças, recebo uma instrução
Come with me, sir

Leva-me pelo mar de outros aparelhos para verificar o interior das posses dos passageiros – ao qual os que estão em trânsito para as três regiões especiais não têm acesso – até a um balcão onde está o encarregado de segurança do aeroporto, a quem entrega o power bank.

Demora algum tempo até, também ele, se dedicar a examinar o aparelho. Sem que me tivesse sido explicado nada até ao momento, aproveito para lhe perguntar qual é o problema. Responde-me qualquer coisa e eu pouco ou nada percebo. Pega noutro power bank e mostra-me as especificações de capacidade que este tem escrito no próprio corpo e que, pelos vistos, o meu não tem. Argumento que então basta ver o modelo e procurar online as especificações e já estou com o telemóvel em riste quando me diz que isso não é possível.
Why?
It’s the rule.

Respiro fundo.
This is unacceptable (o “un” pronunciado com forte ênfase)
Digo-lhe que (i) a semana passada passei por aquele mesmo aeroporto e não levantaram problemas (ii) o power bank me custou perto de 100 euros (mais para os 50 ou 60) (iii) que estou quase sem bateria no telemóvel porque não permitem que se faça o carregamento dentro do avião.
May be unacceptable but it’s the rule

Digo-lhe que quero fazer uma queixa.
Complaint?
De início não percebe; depois aponta-me para um número de telefone. Atiro-lhe o saco de pano que vinha com o power bank para guardar e o cabo de alimentação e viro-lhe costas.

domingo, 16 de dezembro de 2018

Entro no autocarro e pergunto ao condutor quanto custa o bilhete.

Mostra-me um sinal onde está escrito 30 dólares taiwaneses. Tiro uma nota de 100 da carteira e, de imediato, o condutor diz-me
No change
Abro a bolsa onde estão as moedas e navego os dedos para separar as locais dos poucos euros. Sai-me uma moeda de 50 e algumas de 5. Começo a contar as de 5: são precisamente 5. Perante este cenário, preparo-me para colocar a moeda de 50 na ranhura e perder 20 dólares de troco

Passados uns dias, num café, peço aquele expresso pós-prandial que me vai ajudar a sobreviver mais uma tarde. Que, nestes sítios, é normalmente bastante caro face ao nível de preços – facilmente chega a metade do valor de uma refeição barata de rua. Pago e só depois me perguntam se é normal ou duplo, distinção que me esqueci de explicitar. Digo que quero duplo (peço quase sempre duplo) mas, entretanto, já tinha pago o preço do normal.
It’s ok
Diz-me a funcionária que me prepara o café e, pouco depois, o traz à minha mesa.

sábado, 15 de dezembro de 2018

Em tudo parecida a qualquer das outras que se vêem por estas ruas.

Os mais de 30 kms calcorreados em dois dias, de mochila com a máquina fotográfica pesada às costas, fizeram-me as pernas e as costas um pouco moídas Saio do apartamento pelas 18h30, para fazer a massagem antes do jantar.

Indico à senhora atrás do balcão que quero a full body massage de uma hora, sem óleo, que custa 700 dólares taiwaneses, um pouco menos de 20 euros. Sento-me no sofá para tirar os sapatos, que ela guarda num armário donde também tira os chinelos que vou usar. Indica-me as escadas para o piso superior e, uma vez lá em cima, uma das divisórias, que têm um colchão no chão. Dá-me uns calções e uma espécie de colete para o cobrir o torso.

Estou a tentar perceber como se ata o cordão do colete à minha volta quando entra a massagista, que me ajuda com o processo. Recebo a instrução para me deitar de barriga para baixo e ela abre as hostilidades, massajando dos glúteos até aos ombros e pescoço. De seguida, diz-me para me virar de barriga para cima e é a vez das minhas pernas serem massacradas: gémeos, quadricipedes, adutores, todos são torturados. Por vezes a massagista usa o seu antebraço para pressionar ainda mais fortemente os músculos. Numa das ocasiões, coloca-me primeiro com a perna direita a passar sobre a esquerda e passa fortemente o braço sobre o meu glúteo estirado.

Assim como a senhora não se coíbe de me dar pancada, também eu não me inibo de largar um ai ou um ui. Penso cá para os meus botões que este é o tipo de massagem que vai custar e ser desconfortável, mas cujos efeitos positivos vou sentir posteriormente.

Terminada a sessão de pancada nas pernas, senta-se ao meu lado direito e estica o meu braço direito, para prosseguir nessa zona do corpo. No entanto, ainda pouco aí mexido quando me diz
Money
abre uma mão a indicar o número 5
Five
e com a outra mão toca ao de leve os calções por cima da minha zona privada.
Digo-lhe
No
E ela insiste
Special massage
Enquanto continua a acariciar-me.
No special massage, just normal
Digo-lhe assertivamente, com a maior calma, como se propostas destas me fossem feitas amiúde.

Resigna-se, com uma cara quase desiludida ou desapontada, e faz o resto da massagem.

sexta-feira, 14 de dezembro de 2018

Entro no restaurante coreano perto do hotel.

Para me atender, vem o funcionário que tem mais desenvoltura com a língua inglesa. Peço uma das panquecas típicas com frutos do mar e um bibimbap. Tenta explicar-me em que consistem os pratos e eu tento explicar-lhe delicadamente que os conheço.

Primeiro vem a garrafa de cerveja. Aproveito para lhe perguntar se têm wifi. Diz-me que não e, pouco tempo depois, regressa com uma password para aceder ao telefone do colega e, desta forma, ter sinal. Depois traz os pratinhos com o kimchi e outros acompanhamentos explica-me que são grátis e, desta vez, opto por não lhe dizer novamente que também estou a par. Não resiste e pergunta-me
Where are you from?
Respondo-lhe mas continuo a ver o ponto de interrogação estampado na cara. Pergunta-me se é na Europa e eu digo-lhe que é ao lado da Espanha. Tento explorar a estratégia mais fácil – futebol e Cristiano Ronaldo – mas este é um país de baseball e ele não faz a mais pálida ideia. Pede-me para lhe digitar no telefone e fica a observar no Google maps. E atreve-se mais um pouco
What are you doing here?
E pergunta-me se estou em negócios ou férias. Digo-lhe que estou de férias e o espanto dele ainda parece aumentar, como se fosse totalmente inesperado que alguém – ou, mais especificamente, um europeu – resolvesse escolher aquele local para passar o seu tempo livre.

Para desmoer o jantar, dou uma volta pelo mercado nocturno de máquina fotográfica na mão. Está um pouco descaraterizado: os mesmos estrangeiros que participaram na corrida de dragon boat ocupam muitas das mesas. Alguns sotaques europeus – franceses e italianos a falar inglês –, outros que me pareceram australianos. Algumas caras bem vermelhas de sol a mais e protector solar a menos. Uns mais barulhentos que outros mas quase todos com uns copos a mais.

quinta-feira, 13 de dezembro de 2018

De regresso à estação, aproveito a proximidade do lago Lótus

Na zona mais próxima, há um templo confucionista. À entrada, os funcionários pedem-me que assine o livro de visitantes para registarem o número e a proveniência dos visitantes. Sigo pela margem norte, visito um conjunto de templos garridos, construídos sobre a água do lago, até chegar ao limite oeste, onde se encontram os pagodes do tigre e do dragão.

A entrada é feita ou pela boca do tigre, à esquerda, ou do dragão, à direita, cada um deles à frente do respectivo pagode. Do topo dos pagodes, vê-se a margem sul do lago Lótus repleta de gente: está a decorrer uma corrida de dragon boat e tanto atletas como espectadores preenchem o espaço relvado com vista para a água.

Regresso à estação para resgatar a mochila do cacifo e daí sigo para o hotel onde vou passar uma noite. Na recepção sou recebido por um homem de meia-idade que, lutando com o inglês, trata das formalidades do check in. Terminado o processo, um moço, que entretanto se tinha aproximado e aparenta ser filho do senhor que me atendeu, diz-me
Obrigado
Olho para ele com um sorriso e respondo
De nada
E ele explica-me: fez um estágio na Madeira há pouco tempo atrás, qualquer coisa relacionada com a cadeia do hotel. Gostou muito, fez amigos e tem vontade de lá voltar e, desta vez, visitar também o continente.

quarta-feira, 12 de dezembro de 2018

1h30 para fazer os cerca de 300kms de Taipé a Kaohsiung.

Praticamente do extremo norte da ilha ao extremo sul, num comboio rápido, exactamente igual ao Shinkansen japonês. À chegada, na estação, deixo a mochila num dos cacifos e perco-me um pouco à procura da paragem do autocarro. Acabo por descobrir que existem duas zonas de paragens de autocarros e a que pretendo – claro está, lei de Murphy – fica exactamente do lado oposto.

São uns bons três quartos de hora – ainda assim, bem melhor do que a hora e meia que tinha lido online – até o autocarro parar perto da entrada do Museu do Buda de Fo Guang Shan. À minha frente está um complexo enorme. Uma avenida pedonal, ladeada de quatro pagodes de cada lado, conduz até um edifício, com um aspecto piramidal, atrás do qual se ergue uma estátua dourada gigante do Buda.

Subo ao longo dos pagodes da esquerda. Entro no primeiro que funciona como um centro de informações. Lá dentro, uma senhora de chinelos e cabelo rapado oferece-se para me exibir um filme que explica as motivações e origens da construção daquele museu. Sou o único dentro da sala de sofás modernos e confortáveis a visualizar a versão inglesa daquele filme, que explica a intenção daquela construção para albergar um dos dentes do Buda – os outros estão em Pequim e Kandy, no Sri Lanka.

Continuo a subir ao longo dos pagodes – os seguintes não são para visita do público – até atingir o edifício principal. Lá dentro, no conforto do ar-condicionado, visito um conjunto de salas, com exposições e informações sobre a origem e história do budismo. Para além destas, que ocupam a maioria do edifício, há ainda, uma sala com uma estátua dourada do Buda bem como o ex libris, a sala onde está guardado o tal dente. Deixamos os sapatos nos armários para o efeito. À entrada, após um lance de escadas, uma senhora, atrás de uma mesa, oferece-nos uma lâmpada em forma de vela para colocarmos junto a uma estátua em jade branco do Buda deitado. Não consigo não aceitar a oferenda da senhora, que coloco no local onde vejo todas as outras lanternas. Depois, sento-me nas almofadas colocadas no chão. Por cima da estátua, lá bem em cima, vejo a vitrina onde se encontra o recipiente que guarda o dente.

Termino a visita subindo ao terceiro e último piso do edifício, onde existe um auditório, vedado naquele dia por não existir nenhum evento. Saio para o topo do edifício e caminho em direcção à estátua impressionante do Buda. Por debaixo, há uma sala para os quiserem aprender caligrafia chinesa.

terça-feira, 11 de dezembro de 2018

As indicações não são as mais óbvias

Sou levado, pelo efeito manada e o cansaço de uma viagem que já vai longe nesta fase, a seguir a maioria das pessoas, que formam uma fila avolumada e pouco convidativa. Só depois me apercebo que estão a tratar dos trâmites de emigração. Lá à frente está uma funcionária a guardar uma entrada, que me indica o trajecto correcto para os passageiros em trânsito, uma estreita passagem para o terminal afecto a voos internacionais e a voos com destino a Hong Kong, Macau e Taiwan.

Passo o passaporte no leitor da máquina, de seguida coloco o código do cartão de embarque num segundo leitor e as portas de vidro abrem-se, ao mesmo tempo que uma seta verde surge no visor do aparelho. Desço os dois lances de escadas que terminam num funcionário dos serviços de fronteiras chineses. Recebe o meu passaporte e o cartão de embarque, que carimba incisivamente após uma rápida inspecção. O procedimento de segurança demora, uma vez que só há uma máquina de raio-X. Para além disso, têm algumas regras mais restritas do que noutros aeroportos: pedem-me que retire a máquina fotográfica e as lentes da mochila e espalhe tudo num daqueles recipientes plásticos. O meu power bank é analisado em grande detalhe, perscrutado, até finalmente me ser devolvido e dada a indicação de que posso seguir.

segunda-feira, 10 de dezembro de 2018

Olho para os monitores para procurar a localização dos balcões da TAP pela primeira vez em muito tempo:

no local onde costumavam estar estão agora os de outras companhias. Em baixo, perto da entrada, descubra a nova localização. Dirijo-me de imediato ao primeiro funcionário que encontro sem lhe dar o tempo para me perguntar seja o que for. Indica-me um outro colega que tratará de fazer o check in que não consegui fazer online.

O problema é que, depois de muito bufar e gemer, chega à conclusão que apenas consegue para o primeiro segmento. “Vá ali às meninas das reservas” que, de casaco vermelho a condizer com o baton, também não conseguem. Na ausência de representação da Air China no aeroporto de Lisboa (nem a Groundforce nem a Portway) acabo no balcão da TAP, já que é responsável pelo primeiro segmento. Faz-me o check in para o primeiro segmento e diz-me que só mesmo em Frankfurt poderei tratar dos segmentos seguintes. Quando lhe saliento que só tenho 1h30 de escala, diz-me que há muitas ligações a partir de lá, hão de arranjar alternativas

Regresso aos balcões de drop-off: ainda falta despachar a mala. Preciso inserir os dados numa máquina que deverá imprimir o autocolante – como faziam antes as pessoas que trabalhavam nos balcões de drop off – mas que se recusa terminantemente. O funcionário que está mais perto diz-me para ir falar novamente com o que bufa e geme. O problema é que, entre tanto saltitar de balcão em balcão, passou perto de uma hora e o aeroporto está agora bastante mais cheio do que quando cheguei. Começo a ver a vida a andar para trás, não falta assim tanto para o embarque. Felizmente o enésimo menos um funcionário é sensível ao meu problema e leva-me à enésima funcionária, que trata, chamemos-lhe “manualmente”, de despachar a minha mala. Até Frankfurt.

Já por várias vezes fiz um voo numa quase angústia, a desejar que por milagre demore menos do que o programado, na dúvida de saber se vou conseguir apanhar a ligação seguinte. Neste caso não sofri, ia apenas resignado. Ainda para mais quando, à chegada à Frankfurt, permanecemos parados na pista um bocado à espera que a manga fique disponível.

Faço o percurso até à recolha de bagagens em velocidade cruzeiro mas sou surpreendido quando, pouco tempo depois de ter chegado ao tapete, as malas começam a sair e a minha é das primeiras. Nesta altura resolvo apressar-me e subo de imediato do piso das chegadas para o hall gigante das partidas. O balcão de check in da Air China fica um pouco mais à frente e acelero o passo. Para minha segunda surpresa, está completamente vazio.

Explico a situação, a funcionária questiona-se porque não conseguiram tratar de tudo em Lisboa e, descontraidamente, passa-me dois cartões de embarque, enquanto a minha mala é arrastado pelo tapete novamente para as entranhas do aeroporto. Don’t worry, you will make it, diz-me, o que é escusado nesta altura porque já era perceptível. Ironia do destino, o voo atrasa uns minutos e ainda acabo por esperar sentado perto da porta de embarque.