quinta-feira, 31 de dezembro de 2009

The worst is yet to come

«Ai estou tão só, não se ouve ninguém
e o pior está para vir
depois do almoço
todos os que restam vão partir

ai estou tão infeliz
com esta pasmaceira
até vim de calças de ganga
pela segunda vez na minha carreira

ai que solidão
o que vale é que logo para compensar
vou estar espremida
no meio da multidão

Ai o que me deu para vir na véspera de 2010
antes estivesse em casa
a gramar o Fernando a jogar PES :(»


Ode escrita pela S. (a quem educamente pedi a permissão para aqui reproduzir) que, tal como eu, trabalha no dia 31 de Dezembro.

quarta-feira, 30 de dezembro de 2009

Trapos de língua #19

E ainda há forma como se dizem as coisas. Que, por experiência, vamos adquirindo. Muitas vezes sem percepção. À boa moda portuguesa, “façam silêncio” é uma expressão perfeitamente aceitável; no entanto, ninguém no seu perfeito juízo se atreveria a dizer “make silence”. Também não diríamos “fazer os pratos” – a não ser que, por exemplo, trabalhássemos na Marinha Grande – mas os ingleses têm o “do the dishes”. Uma das expressões mais giras que temos foi-me explicada por um alemão: “limpar o pó”. O que é que é limpar o pó? Vocês limpam os grãozinhos de pó? O pó tira-se e manda-se fora, não se limpa. E, de facto, “Staub wischen” é exactamente isso.

terça-feira, 29 de dezembro de 2009

Kill off all my demons and my angels might die too

Progenitora exímia nas artes de bem progenitar, a minha mãe cedo me aconselhou a não falar com estranhos. Hoje, volvidos vinte e tal anos, dou por mim a ter que partilhar umas palavras com gente muito, mas muito estranha. E que, não contente com a estranheza, mistura nisso um certo toque de aborrecimento e mentecaptidão. Como sou banana e tenho dificuldade em frontalmente me desenvencilhar, faço uso da minha cobardia para resolver a questão:

“Desculpe, mas tenho mesmo que ir. É que a minha mãe não deixa, sabe…”

segunda-feira, 28 de dezembro de 2009

Do início até ao bop, nas palavras do Kerouac

«Once there was Louis Armstrong blowing his beautiful top in the muds of New Orleans; before him the mad musicians who had paraded on official days and broke up their Sousa marches into ragtime. Then there was swing, and Roy Eldridge, vigorous and virile, blasting the horn for everything it had in waves of power and logic and subtlety – leaning to it with glittering eyes and a lovely smile and sending it out broadcast to rock the jazz world. Then had come Charlie Parker, a kid in his mother’s woodshed in Kansas City, blowing his taped-up alto among the logs, practicing on rainy days, coming out to watch the old swinging Basie and Benny Moten band that had Hot Lips Page and the rest – Charlie Parker leaving home and coming to Harlem, and meeting mad Thelonius Mnk and madder Gillespie – Charlie Parker in his early days when he was flipped and walked around in a circle while playing. Somewhat younger than Lester Young, also from KC, that gloomy, saintly goof in whom the history of jazz was wrapped; for when he held his horn high and horizontal from his mouth he blew the greatest; and as his hair grew longer and he got lazier and stretched-out, his horn came down halfway; till it finally fell all the way and today as he wears his thick-soiled shoes so that he can’t feel the sidewalks of life his horn is held weakly against his chest, and he blows cool and easy getout phrases. Here were the children of the American bop night. »

On the road, Jack Kerouac

domingo, 27 de dezembro de 2009

Trapos de língua #18

As línguas germânicas têm um conjunto mais vasto de significados que os das línguas latinas. Talvez seja esta a característica que torna o inglês numa língua tão prática. Vamos a exemplos. A junção do “over” com o “sleep” na palavra inglesa “oversleep” resulta num significado que não possuímos em português: “deixei-me dormir” será, talvez, a expressão que mais usamos para estes casos, mas é algo que também pode ser dito na simples situação em que nos deixamos dormir. O “outplay” é fabuloso. Numa palavra, explicamos que dado jogador (ou equipa) jogou mais ou melhor que o adversário. Muitas vezes o “outplay” acaba em “outclass”: quando o tal jogador “outplay” em demasia o adversário e ganha com uma margem confortável, então entramos no campo do “outclass”. Outro que me apraz muito é o “clockwise”, que numa palavra arruma a um canto a expressão “no sentido dos ponteiros do relógio”. O “verpassen” alemão é interessante. Nós dizemos “perder o autocarro” o que pode ser estranho porque dá a entender que o autocarro, propriedade nossa, desapareceu do nosso alcance, não sabemos onde o pusemos. Lá está, os alemães têm esta palavra que traduz o verdadeiro significado de chegar demasiado tarde à paragem, depois de o transporte já ter passado.

Normalmente associa-se a elegância às línguas que soam bem, como italiano ou francês. Pois eu acho que esta lógica, esta maleabilidade e adaptabilidade das línguas germânicas é uma demonstração de elegância à prova de bala.

sábado, 26 de dezembro de 2009

Lover Man

«My mind was filled with that Great song ‘Lover Man’ as Billie Holliday signs it; I had my own concert in the bushes. ‘Someday we’ll meet, and you’ll dry all my tears, and whisper sweet, little things in my ear, hugging and a-kissing, oh what we’ve been missing, Lover Man, oh where can you be… ‘ It’s not the words so much a as the great harmonic tune and the way Billie sings it, like a woman stroking her man’s hair in soft lamplight.»

On the road, Jack Kerouac

sexta-feira, 25 de dezembro de 2009

Trapos de língua #17

Não é que as formas simples (leia-se, sem verbo auxiliar) de passado não existam em francês e alemão. Elas existem mas não muito empregues na oralidade. Estão reservadas sobretudo para a escrita e dão um carácter formalismo ao discurso, sobretudo no caso do francês. Na prática, as construções do tipo “j’ai mangé” ou “ich habe gegessen” são regra. Não é comum ver por aí gente a dizer “je mangeais” ou “ich aβ”. O mesmo existe no espanhol, embora de forma ligeiramente diferente. A construção com auxiliar refere-se a um tempo que está mais próximo enquanto a versão sem auxiliar usa-se para acções mais distantes e não há nenhuma relação com níveis de formalismo diferentes. Por exemplo, “hoy he comido” mas “ayer comí”, “esta semana he comido” mas “la semana pasada comí”, “este año he comido” mas “el año pasado comí”. No entanto, estamos sempre a falar de acções isoladas que decorreram e terminaram no passado.

Em português, nenhuma destas lógicas existe. Não há qualquer diferenciamento em termos do registo de linguagem (mais formal, menos formal). Há apenas alguma noção da proximidade da acção. Se disser “Eu comi” refiro-me a uma acção isolada e terminada. Se disser “Eu tenho comido” então estarei a: dar uma noção de que a acção decorreu recentemente; introduzir um carácter de repetição, como se acrescentasse “nos últimos tempos” ou “ultimamente” à frase. Para além disso, esta acção poderá prolongar-se para o futuro, como se se tratasse de um hábito recém-adquirido.

quarta-feira, 23 de dezembro de 2009

Seasons greetings

Cada vez me cansa mais ouvir. Enfada-me. Aborrece-me de morte. Cinco minutos de uma apresentação e estou a bocejar. Reuniões. Sobretudo se, à mesa, estão representantes daquele tipo de criaturas que adoram, deliram com a possibilidade de se ouvirem a si próprias a falar. Não aguento, nunca aguentei. A diferença, agora, é que não me dou ao trabalho de fingir que não aguento. Divago, apago. Desligo.

Sou um péssimo conversador de circunstância. Daquelas com muita chacha. Smalltalk. Encher chouriços. Nunca sei o que dizer, é confrangedor. As tentativas, mesmo que esforçadas, acabam quase sempre silêncios incómodos. Até mal-entendidos. E com pessoas a pensar que eu não jogo com o baralho todo. Suspiro quando a vítima se afasta e fico novamente sozinho. Escondo-me, refugio-me para que não me encontrem e não tenha que voltar a fazer o esforço de encetar um diálogo irrelevante. E isso cansa. E muito.

segunda-feira, 21 de dezembro de 2009

Começámos por avistar as primeiras leoas a caminhar e só depois vimos as duas mais jovens, de volta do que parece ser uma zebra.

Na verdade, é apenas uma pele de zebra sem nada que possam verdadeiramente comer. De repente, uma delas puxa uma das pontas daquele pedaço ressequido e consegue afastar a outra, que fica com um pedaço mais pequeno. O John diz-nos que estão tão fracas e cansadas que nem sequer lutam pelos despojos.

Nos últimos oito meses choveu apenas em duas ocasiões. A seca foi significativa e a ausência de pasto afugentou ou, pior, matou os animais dos quais as leoas se costumam alimentar. Estão agora magras, escanzeladas e o facto de estarem a debater-se por uma pele de zebra é um reflexo do desespero.





Samburu - Girafa reticulada

Samburu - Zebra de Grevy

domingo, 20 de dezembro de 2009

Girafa fantasma

Martin não se sentava nos bancos. Tinha um lugar só dele, num estrado de metal que separa a zona do condutor e do pendura do resto do veículo. Mas também tinha outro: no tejadilho, mesmo à frente, neste caso, por cima do condutor. E foi assim que acabámos fora da cabine, no topo do veículo, ao final do dia, uma perspectiva inesperada, com o sol a desaparecer. Sempre muito devagar, os solavancos seriam insuportáveis com o rabo de encontro ao metal rijo.

As fortes chuvadas fizeram o dia pouco promissor para avistar os bichos. De repente, ao fundo, algumas girafas. Curiosas, estacam a olhar para nós, animal ou objecto estranho. Aproximamo-nos. Mas não muito, não queremos vê-las, assustadas, a virar costas e desatar a correr daquela forma escangalhada e desengonçada como correm. Àquela distância, o flash engana a máquina e a bicha de pescoço comprido sai com este aspecto para o visor:



Mostro ao Martin que, tal como as girafas corredoras, se escangalha, aqui a rir, com os seus dentes branquíssimos. Quando recupera a fala, diz-me:

“It looks like a ghost!”.

sábado, 19 de dezembro de 2009

Zebralo ou Cavalebra.

Cavalo mais burro dá mula. Cavalo mais zebra dá nisto. Faz lembrar a história da galinha que andou a curtir com o Galo de Barcelos e depois acabou a pôr ovos da Páscoa. Enfim.

quarta-feira, 16 de dezembro de 2009

Tínhamos acabado de regressar ao jipe

A única vez que saímos e pisámos o chão em Masai Mara foi para ver mais de perto uns hipopótamos, ou melhor, uma parte da cabeça de alguns que estavam a banhos num curso de água. Seguimos novamente o trilho, atentos às árvores, aos arbustos. De repente, uma leoa foge e esconde-se na vegetação. Deixa para trás uma carcaça de um antílope, perto de trilho de terra. Estamos muito perto e ela permanece escondida. Olha-nos fixamente. É estranho: todos os leões que vimos até agora não têm o mínimo pudor em relação a seres humanos, agem como se não estivessem lá. Aliás, é verdadeiramente desconcertante o desinteresse, o desprezo deles. Até o John está perplexo: “why is she hidding?”. Continua a espreitar por entre as folhas e os ramos, mas não se atreve a aproximar do repasto novamente. Resolvemos arrancar e deixá-la comer em paz.

Masai Mara #8

Masai Mara #7

terça-feira, 15 de dezembro de 2009

Masai Mara - leopardo

Os leopardos são o oposto dos leões. Para além de terem uma vida relativamente solitária – tipicamente, quando se avista mais do que um, ou se trata de um casal, ou da fêmea com as crias – são também bastante recatados. “Very shy”. Por isso, quando surge um deitado na vegetação perto de um curso de água, a agitação no interior dos vários jipes repletos de mirones é intensa. Máquinas fotográficas disparam continuamente para o animal que olha para aquele circo com uns olhos extremamente desconfiados. De repente, um segundo animal irrompe por entre a vegetação na margem oposta, conseguimos vê-lo a correr, a atravessar de arbusto em arbusto, até finalmente se esconder novamente. O primeiro, mais perto de nós, levantou-se agora e, delicadamente, vira-nos as costas para se debruçar a beber água de uma poça. O Masai do acampamento que nesse dia nos acompanhou olha-nos com uma cara muito séria: “you are very lucky…”. Muito boa gente não chega sequer a ver um destes gatos.

Masai Mara #6

domingo, 13 de dezembro de 2009

John está à nossa espera no hall do hotel em Nairobi.

Apresenta-se e pergunta-nos “ready to go to Masai Mara?” enquanto nos cumprimenta. A sua missão é, literalmente, andar connosco ao colo durante sete dias, por vários locais do Quénia. É um homem extremamente reservado, taciturno, lacónico; exactamente o oposto da maioria dos quenianos com os quais nos cruzamos, extrovertidos, amistosos. John senta-se ao volante do Land Cruiser e conduz calado. Horas sem abrir a boca. A espaços abre a boca e solta um inglês difícil de perceber, claramente menos confortável que o swahili, para nos dar alguma explicação sobre um animal ou sobre o sítio onde estamos a passar. Tirando isso, só lhe ouvimos a voz sumida para nos falar dos problemas de corrupção e de planeamento do seu país.

Guia rápido, agitadamente, intempestivamente. Ultrapassa ostensivamente quem se coloca à sua frente. O jipe sacode, salta, derrapa ao sabor das estradas esburacadas, dos caminhos, dos trilhos, da areia, da lama. Às vezes só com uma mão no volante, enquanto a outra se entretém com o telemóvel ou com o termos (de café…?). Mas uma coisa é certa: ele está sempre calmo. Muito calmo. Mesmo quando encosta o veículo à berma e, sem soltar uma palavra, salta do jipe para se esconder atrás do vidro traseiro opaco de tão sujo e dos pneus sobressalentes, enquanto alivia a bexiga do líquido do termos.

Terá quarenta, cinquenta anos. Uns olhos de lince. Enquanto conduz, perscruta a savana continuamente, como um radar, à procura do “game”. Por vezes, indica-nos, de dedo apontado, onde está determinado animal, num exercício que parece impossível à vista desarmada. Outras vezes, pára o veículo e arma-se dos binóculos, para tirar teimas quando apenas os olhos não chegam.

Não conseguimos que se misture connosco. Oferecemos-lhe uma cadeira para se sentar ao nosso lado e rápida e energeticamente a recusa. Afasta-se e junta-se aos empregados dos acampamentos e dos lodges por onde vamos passando. Por vezes junta-se a eles, conversa com eles, nem sequer o vemos fora das horas em que temos actividades. Outras vezes janta sozinho, numa mesa isolada. Sempre silencioso, calmo, plácido. Terá esboçado dois sorrisos e soltado, no máximo, duas gargalhadas durante todos estes dias.

Mas foi uma óptima companhia.

quarta-feira, 9 de dezembro de 2009

Um aperitivo chamado Dubai

A expectativa em relação à chegada ao aeroporto do Dubai já vem influenciada: voamos na Emirates, uma companhia que oferece a qualidade de serviço que a TAP e outras companhias ocidentais ofereciam há dez, quinze anos, quando o transporte aéreo estava menos difundido e massificado. Não só pelo facto de os aparelhos serem novos e cheios de gadgets – o ecran pessoal para ver filmes ou séries de televisão, jogar jogos, acompanhar as gordas do serviço noticioso da BBC, fazer telefonemas para outro passageiro, e ainda alguns extras não gratuitos, como enviar e receber e-mails ou fazer telefonemas para terra – também pelas refeições, por exemplo. Ainda há um menu que permite a escolha entre dois pratos principais, não há limite para bebidas alcoólicas e, pasme-se, talheres de metal. Aqueles que não me lembro de ver num voo há muito muito tempo. E ainda os jornais e revistas, disponíveis para todos os passageiros. Noutras palavras, a Emirates oferece um serviço de executiva a preço de económica. E um preço de económica bastante económico.

Assim que, aterrar com num aeroporto enorme, descer umas escadas rolantes muito altas, ladeando um curso de água a imitar uma cascata e chegar a um hall de imigração tão amplo, não é nada de estranhar. É o primeiro aeroporto onde vi chuveiros, para quem estiver há algum tempo em viagem e tiver algum tempo morto entre ligações.

Se na Islândia não se sente o impacto da bancarrota senão na descida dos preços de níveis que são uma autêntica extorsão para algo mais normal, no Dubai a iminência de uma situação de insolvência contrasta com a opulência. O metro de superfície afasta-se do aeroporto e caminha em direcção à zona antiga da cidade. Os barcos típicos estão ancorados ao longo de espécie de enseada com edifícios modernos, espelhados a cortar a linha do horizonte. Novamente a bordo do metro, percebo melhor o que o Dubai é: duas avenidas que rasgam o deserto, dois segmentos de recta com quatro, cinco faixas em cada sentido, percorridos por carros de alta cilindrada, ladeadas por edifícios altos, arranha-céus, edifícios em construção, gruas, guindastes. Algures, o edifício mais alto do mundo, em forma de agulha, com mais de oitocentos metros. Mais à frente, a pista de ski, já a chegar ao enorme centro comercial.

Saímos a porta para a rua, não sem antes ter de perguntar ao segurança. O tempo está contado, o autocarro pode ser uma má opção, fazemos negócio com um taxista. Tem uma carrinha onde pode sentar os seis. Por quarenta dirhams, garante que nos leva para a segunda avenida, que percorre os quilómetros mais próximo da água do mar, e nos leva à palmeira, a Jumeirah, terreno que foi ganho às águas muito azuis daquele mar. Percorremos o caminho até ao final da palmeira, onde um hotel enorme se ergue virado para o mar. Damos a volta, vamos no sentido inverso, vamos sair. Dali ao hotel mais luxuoso do mundo é um tiro.

O Burj Al Arab e as suas sete estrelas só se deixam ver ao longe. O caminho de acesso está protegido por guardas, só autocarros do próprio hotel e Lamborghinis amarelos cruzam os portões. Turistas espreitam e tiram fotografias à distância debaixo do calor abrasador. Depois a praia. Só para espreitar. Repleta de indianos, paquistaneses e demais povos da imensa comunidade imigrante, que tomam banho, jogam à bola dentro de água, mas sempre relativamente vestidos. Não, a praia não é nada convidativa. Pelo menos aquela, que não é privativa. Hordas de homens (eventualmente privados), arrumados em fila, babam-se para o espectáculo de duas turistas em biquíni. Resultado: fotografia, meia-volta e volver.

O Dubai evoca fortemente Las Vegas, o deserto, o Strip e os hotéis doidos. Cidades inconsequentes, uma infantilidade. Não passam de uma cambada de miúdos crescidos com dinheiro a mais para gastar. E é por isso que, pese embora a curta estadia, regressar ao Dubai não parece ser uma decisão fácil. Já voltar a voar na Emirates e tomar um duche no aeroporto, bom, isso é outra conversa.

terça-feira, 8 de dezembro de 2009

Fly me to the moon

Faz sentido que os passageiros de primeira ou executiva saiam do avião antes dos outros. Mas não faz sentido que sejam os primeiros a entrar. Para mim, pagar mais por um bilhete significa ser o último a entrar e o primeiro a sair.

quinta-feira, 26 de novembro de 2009

O único reforço que me falta é o actimel

As vacinas da febre amarela e da tifóide são feitas aqui mesmo a seguir à consulta. A da hepatite A é feita numa qualquer farmácia, a primeira dose agora e a segunda seis meses depois. Comprimidos para a profilaxia da malária, a doença que mais pessoas mata em todo o mundo: cerca de 3 milhões por ano, uma criança por minuto. Não esquecer de começar a tomar um dia antes de entrar na zona de risco e, depois, manter a toma durante a estadia e mais sete dias. Mesmo com a protecção da malária, há ainda a possibilidade de receber uma dádiva dos insectos que se chama dengue. Neste caso, a única hipótese de defesa é usar repelente e redes mosquiteiras para dormir. De resto, cuidado com a alimentação, nada de alimentos crus, água só engarrafada e não pedir gelo. Em caso de diarreia usar um antidiarreico; se houver sangue nas fezes, se for acompanhada de febre ou durar mais de três dias, então deve tomar um antibiótico. Azitromicina, três comprimidos, um por dia. E, finalmente, tendo em conta o problema grave da sida em África, se acontecer alguma coisa, usar sempre o preservativo.

quarta-feira, 25 de novembro de 2009

O sítio ficava ali algures no largo do Junqueiro.

Um bar numa cave, descia-se umas escadas para lá chegar. A mim fazia-me imensa confusão que subissem ao palco com uma facilidade tremenda; eu ficava lá atrás meio escondido, não fosse alguém ter a triste ideia de me arrastar até lá à frente. Ainda assim, a maioria ia em grupo, é sempre mais fácil um tipo chegar-se à frente no meio da molhada, sente-se mais aconchegado. Mas tu não. Primeiro vi-te com o cardápio na mão a escolher a música. Depois, quando apanhaste uma aberta, foste ter com o tipo e indicaste o que ias cantar e saltaste para o palco de microfone na mão com uma facilidade, um à-vontade invejável. Não me perguntes se te saístes bem, se cantaste decentemente. Já não me lembro, isto já foi há uma data de anos. Só sei que cantaste isto:

terça-feira, 24 de novembro de 2009

Ontem, hoje e amanhã

«(…) tu e eu, temos mais ontens que qualquer pessoa. Precisamos de alguns amanhãs.»

Beloved, Toni Morrison

Férias

A quebra da rotina faz-me esquecer de pormenores importantes. Dou por mim a pensar por que carga de água terei uma dor de cabeça irritante quando até dormi bem. Só depois me ocorre que são onze da manhã e ainda não bebi café.

segunda-feira, 23 de novembro de 2009

domingo, 22 de novembro de 2009

Bebop

Com a entrada dos Estados Unidos na Segunda Guerra Mundial, em 1942, o mercado do entretenimento sofre uma quebra assinalável. Como consequência, vários são os músicos e bandas que ficam com menos ou sem gigs para fazer. É o fim das big bands, das orquestras e da música pensada para pôr as pessoas a dançar. É o fim do swing.

Esta ruptura incentiva uma mudança fundamental nos músicos: concorrem agora mais agressivamente pelo menor número de oportunidades que existem. Para se destacarem dos demais e aumentarem a possibilidade de serem seleccionados, aperfeiçoam a sua música e a sua técnica. A própria circunstância de terem menos trabalho dá-lhes mais tempo para treinarem e desenvolverem um novo estilo.

É o início do bebop. Um estilo rápido, duro, frenético. Uma coisa de doidos. Uma nova vaga de músicos surge a substituir os pesos pesados da era anterior: Charlie Parker, Dizzie Gillespie, Max Roach, Thelonious Monk, etc.

Há uma história curiosa que envolve o Louis Armstrong e o bebop. Um dia perguntaram-lhe o que ele achava desse novo estilo. A reacção dele foi intempestiva. Novo? Este estilo não é novo. Isto era o que fazia quando era um miúdo! É isso, o bebop foi e é uma coisa de putos.

quinta-feira, 19 de novembro de 2009

Trapos de língua #16

O condicional é um tempo verbal que tem a ingrata tarefa de, muitas vezes, atribuir um certo formalismo ao discurso. No mínimo, dá um toque de sofisticação à frase, torna-a mais chique. Talvez por isso, na linguagem oral corrente e coloquial, evitamos a sua utilização, substituindo-o frequentemente pelo pretérito imperfeito. Por exemplo, dizemos, a torto e a direito, coisas como “se eu fosse a ti, fazia…” quando a forma correcta é “se eu fosse a ti, faria…”.

E isto dito por uma pessoa que tem como "outros venenos" o 31 da Armada e a Revista Atlântico

«Dito isto, porque é que duas pessoas do mesmo sexo não podem ter o mesmo reconhecimento social do seu amor do que eu? O casamento, que foi consagrado juridicamente para tutelar a família, tem de tutelar as famílias. Todas. Mesmo aquelas que não seguem as ilustrações dos livros da primeira classe.»

quarta-feira, 18 de novembro de 2009

As palavras, as frases, tudo isso foi contigo.

Seguiu-te quando saíste pela porta fora. Não consigo alinhavar três linhas que goste, que façam sentido. Escrevo e fico com um amontoado de palavras, frases, sem o mínimo interesse. Comida sem sabor. Cinzento. Levaste-me a força. A intensidade. O Groove, a verve. Sem isso, as palavras e as frases não valem nada. E por isso levaste-me isto tudo, a escrita. Saiu atrás de ti, não viste?, seguiu-te pela porta que bateste com toda a força quando saíste intempestivamente. Podias ter levado tudo. Podias ter ficado com tudo, que me interessa a mim essa porta ou o dinheiro, a honra ou o orgulho? Mas as palavras, as frases, passo os dias a lutar para as recuperar, para que voltem a entrar, pé ante pé, pela porta que bateste, o estrondo quando saíste. E não consigo. Comida sem sabor. Já não é o preto das letras no branco do papel, é o cinzento das palavras e frases ocas, desprovidas de vida, força, intensidade.

Não valem nada, levaste-me tudo.

segunda-feira, 16 de novembro de 2009

Trapos de língua #15

Só percebi quando percebi que não percebia os condicionais em francês. Nem eram tanto os condicionais, era o primeiro condicional. Porque “si je peux, j’irais” ou “si j’ai l’argent, j’achete” não faz sentido quando a comparação imediata que eu tinha à minha disposição era “se posso, vou” ou “se tenho dinheiro, compro”. E ela dizia-me que eu estava a exagerar e a complicar o que era fácil ao que respondia que aquilo não soava nada bem e acrescentava a forma que me era correcta, “se puder”, “se tiver dinheiro”.

O inglês nunca tinha tido este efeito. Talvez porque é suficientemente distante. “If I can”, “if I have”, não fazem disparar o alarme. Mas a sensação voltou com o espanhol, embora agora já estivesse, de certa forma, preparado para ela: “si puedo”, “si tengo dinero”.

Habituei-me. Mas, ainda hoje, a minha primeira reacção é achar que está errado.

domingo, 15 de novembro de 2009

CERN das questões

«Pássaro trava Big Bang – O acelerador de partículas construído perto de Genebra para recriar o Big Bang voltou a parar. […] Uma falha de energia eléctrica provocou o sobreaquecimento do acelerador. “A pessoa que foi investigar descobriu pão e um pássaro a comer o pão (na grelha eléctrica exterior”), explicou a porta-voz do CERN, Christine Sutton. O incidente coincide com a teoria do físico Holger Bech Nielsen, que acredita que é o próprio acelerador que, manipulando o tempo, está no futuro a sabotar-se. Este é o terceiro incidente, contando com a explosão ocorrida durante a sua construção.»

Revista Sábado

sábado, 14 de novembro de 2009

Pela primeira vez a barreira da idade.

Não estava preparado, confesso-te. Afinal não sou assim tão velho, caramba. Mas, ao teu lado, também já não sou assim tão novo. A culpa disso é a diferença. E nem sequer só a da idade propriamente dita. É verdade que os teus vinte e (muito?) poucos anos parecem-me agora tão frescos e de uma ingenuidade que me desarma. Mas garanto-te que pior é a da fase da vida. Essa cava um fosso maior. Estamos em fases distintas, capítulos diferentes. Já passei pelos teus e eu, para ti, sou uma espécie de “cenas do próximo capítulo”. E isso determina, condiciona, perspectivas, expectativas. A mesma diferença de idades na mesma fase teria um impacto bastante menor.

Menti. Menti-te. Menti-me, apercebo-me. Não é a primeira vez que esta história da barreira da idade: é a primeira vez em que não sou o mais novo, já estive no teu lugar. E isso, sim, fez-me sentir velho.

sexta-feira, 13 de novembro de 2009

Trapos de língua #14

O futuro próximo em português e francês: “Amanhã vou a Lisboa” e “Demain je vais à Paris”. Mas, em espanhol: “Mañana voy a ir a Madrid”.

O verbo “ir” repetido parece estranho. Aparentemente, nós e os franceses suprimimos esta repetição que parece redundante. Embora a primeira aparição do verbo diga respeito ao tempo da acção e só o segundo explicite qual é, de facto, a acção em causa.

quinta-feira, 12 de novembro de 2009

Jelly Roll

Ferdinand “Jelly Roll” Morton could brag almost as well as he could play the piano – and, as the world knows, he played piano very well indeed. His most famous boast was provoked by a broadcast of Robert Ripley’s Believe It or Not radio program, which introduced W. C. Handy as the originator of jazz and the blues. “W. C. Handy is a liar,” Morton announced in a long letter addressed to Ripley and published in the Baltimore African-American and Down Beat magazine. The letter goes on to claim, “It is evidently known, beyond contradiction, that New Orleans is the cradle of jazz and I, myself, happened to be the creator in the year 1902.” That was not the first time he made that claim or something like it. The guitarist Danny Barker recalls that Morton would announce, “I created jazz and there’s no jazz but Jelly Roll’s jazz.” According to the musician and entrepreneur Reb Spikes, “[Jelly] would hear a piece and say, ‘They’re stealing that from me. That’s mine.’ Or ‘That guy’s trying to play like me.’” The trumpet player Lee Collins remembers going to see Morton in his hotel room: “He asked me to come work with him. ‘You know you will be working with the world’s greatest jazz piano player… not one of the greatest – I am the greatest.’”

Dead Man Blues, Phil Pastras

quarta-feira, 11 de novembro de 2009

Blitz

O que custa não é saber que não se pode voltar atrás. O que custa é saber que, mesmo que fosse possível recuar no tempo, o mais certo seria fazer tudo igual outra vez.

terça-feira, 10 de novembro de 2009

Esmiuçar

Fui bastante crítico dos anteriores programas de actualidades do Gato Fedorento, o Diz que é uma espécie de magazine e do Zé Carlos. Face aos formatos iniciais de sketches eram, para mim, chatos e tinham muito menos graça. Viviam essencialmente dos Tesourinhos Deprimentes e das imitações do Ricardo Araújo Pereira.

Agora que acaba este novo programa de curta duração (mas intenso, como o lusco-fusco) tenho que dar o braço a torcer, a mão à palmatória. Este novo formato à la Jon Stewart resultou lindamente. E, mais importante ainda do que ter tido graça, foi bem conseguido. (Quase) todos os ilustres passaram por aquela cadeira espinhosa (já agora, nota negativa para o Cavaco) e submeteram-me às perguntas pertinentes, corajosas e inteligentes do Ricardo Araújo Pereira.

Isto é uma diferença fundamental, por exemplo, face ao Herman. Sempre que tinha um ilustre político como convidado de um talk show, o Herman afastava por completo a discussão da política e nunca tecia qualquer comentário ou mostrava qualquer inclinação. Era sempre tudo muito suave e ameno.

E isto é significativo. É levar estas discussões para um público ainda mais alargado. Nem toda a gente vê o Expresso da Meia Noite ou a Quadratura do Círculo. E nem sequer nestes programas os intervenientes têm a lata e a ousadia de colocar as questões que os Gatos colocaram. Tudo sem ofensa porque aquilo é humor.

E humor a sério, porque para ser a sério tem que tocar na ferida.

segunda-feira, 9 de novembro de 2009

Trapos de língua #13

O mais elaborado dos números em alemão surge quando se atinge os vinte e um. Passamos por toda a zona dos onze aos dezanove a dizer coisas como “vierzehn” e “achtzehn” e, de repente, “einundzwantig”. Assim, sem mais nem menos. Parece ao contrário: literalmente, “um e vinte”. Já para não dizer que fica tudo pegado, com o “und” no meio a colar duas palavras. E a lógica segue. “Dreiundviertzig” é o quarenta e três e “funfundfunfzig” é o cinquenta e cinco. Ora o problema está na analogia com o inglês. Estes casos seriam, respectivamente, “twenty one”, “forty three” e “fifty five”, o que vai ao encontro do que parece instintivamente lógico.

Mas é curioso verificar que os alemães mantém uma certa coerência. Os números entre dez e vinte são compostos por um algarismo somado de dez: “sechzehn” é a soma de “sech” e “zehn”, ou seja, “seis” e “dez”. E é essa a coerência que é continuada para os vintes, como o tal “einundzwantig” ou “um e vinte”. Nós fazemos uma coisa parecida mas pela ordem inversa. Ou seja, dizemos, “dezasseis”, “dez” mais “seis” e depois “vinte e um”, “vinte” mais “um”. Quem baralha duas lógicas diferentes, afinal, são os anglo-saxónicos. Veja-se o “sixteen”, “six” mais “ten” e o “twenty one”, “twenty” mais “one”.

domingo, 8 de novembro de 2009

sábado, 7 de novembro de 2009

Trapos de língua #12

Os verbos “ser” e “ir” são normalmente uns bichos muito raros em qualquer língua que se preze. Altamente irregulares e cheios de coisas estranhas que só lá vão à lei da bala, ou seja, decorando. Um aspecto que me parece muito curioso em português e espanhol é o facto de que a conjugação do pretérito perfeito é exactamente igual (eu fui, tu foste, etc…). Dois verbos com significados tão díspares e, no entanto, são exactamente iguais neste tempo verbal. E só neste tempo verbal; nos restantes mantêm a sua diferença.

quinta-feira, 5 de novembro de 2009

À espera que o telefone toque. Ali, na mesa-de-cabeceira. Não te enganaste até agora. Não falhas uma. Nem quando pareces demasiado optimista, nem quando pareces demasiado pessimista. Derrotado. Derrotada. Também não se enganou, você. Já sabia. Mais tarde ou mais cedo. Estou pronto. Tenho as coisas arrumadas, estou à espera só que o telefone toque. Que me toquem com o telefone, a mesa-de-cabeceira, a cama, isto agora faz-me lembrar as coisas. Como, por exemplo, a casa, esta casa. Há-de lá ir, tenha calma. E agora, o vazio da minha cama com um edredon. Só recentemente tive um edredon. Antes eram os cobertores e as mantas. E agora, este edredon é vazio, totalmente vazio, o que é um edredon ao lado do cobertor e das mantas? Telefone. Espero. Não falhas. É hoje. Não passa de hoje. E, por isso, espero, ainda está para vir o dia em que te enganes, raios te partam, não falhas uma. É que nem uma, porra. O derrotismo pega-se, espalha-se, alastra e ela também sabia. Não é novidade para ela. Só para mim, que espero o toque do telefone.

segunda-feira, 2 de novembro de 2009

Trapos de língua #11

Se é verdade que a proximidade entre o português e o espanhol torna a aprendizagem mais fácil, também não é mentira que, por vezes, essa mesma proximidade não seja enganadora. Claro que em termos líquidos, são mais as vantagens do que as desvantagens.

O exemplo típico das desvantagens é o dos falsos amigos. E que normalmente até tem alguma graça. Ver a palavra “pilas” escrito num recipiente com um orifício pequeno que, na verdade, serve para depositar pilhas usadas para reciclar tem a sua graça. E, se Cuenca é uma cidade a roçar a palavra “cueca”, Braga é mesmo a versão feminina desse termo em espanhol.

São inúmeros os casos do género. O preferido da María, a maior responsável pela minha pronúncia, é o da “folha”: não é capaz de pedir um bocado de papel sem fazer um sorriso. Levado o exercício ao extremo, adora entrar numa pastelaria e pedir um café e um mil-folhas.

domingo, 1 de novembro de 2009

Alegria

Há uns bons anos atrás havia um gelado pequenino da Olá que se chamava “Banana Joe”; não sei se ainda existe. Na escola onde andava por altura do segundo ciclo havia uma senhora no bar que lhe chamava “Banana Joy”, mesmo depois de me ouvir dizer “Joe”. Lembrei-me disto porque ouvi o Nicolau Santos dizer “Joy” Berardo.

sexta-feira, 30 de outubro de 2009

Costuma estar logo ali ao lado da Versalhes.

Sentado sobre um cartão na calçada, encostado à parede. Uma manta, um cobertor sobre as pernas, os joelhos, um boné na cabeça. Uma caixa (de plástico?) à frente, para as moedas daqueles que resolvem contribuir. Para os outros, aqueles que como eu passam como todos os dias, tem umas palavras preparadas, prontas a ser disparadas mas em surdina, murmuradas, insinuantes.

Hoje, quando ia a passar, parou uma viatura comercial em segunda fila. Do lugar do pendura, saiu um homem de bata branca, careca, óculos. Levava qualquer coisa na mão, ia fazer certamente uma entrega no pequeno portão mesmo ao lado da parede onde as costas do pedinte repousam. Passou muito rápido pela manta e o cartão depositados no chão e soltou um “bom dia senhor engenheiro”. O outro, lá de baixo, respondeu “bom dia senhor arquitecto”.

quinta-feira, 29 de outubro de 2009

Words are very unnecessary

Uma das coisas mais complicadas de aprender na música é a fazer silêncios. Há uma tendência natural para tocar demasiadas notas, encher muito os espaços, respirar pouco. É assim como na vida: saber estar calado também é uma arte.

Da série perguntas que me fizeram na estação de metro do Saldanha

“Olhe, desculpe, como é que se vai para a rua…?”

quarta-feira, 28 de outubro de 2009

Trapos de língua #10

Há uma certa uniformidade nos “nãos” de várias línguas. Por exemplo, “no”, “non”, “nein”, “niet”. Os “sins”, contrariamente, são diferentes. Por exemplo, “sí”, “oui”, “ja”, “yes”, “da”.

terça-feira, 27 de outubro de 2009

Cinco um

Bach escrevia com uma cadência impressionante. Há quem diga que era porque tinha uma família enorme para sustentar: sete filhos de um primeiro matrimónio e treze de um segundo, segundo (consegui pôr esta palavras duas vezes e, ao escrever a palavra “duas”, ainda consigo fazer uma aproximação ao cardinal) a Wikipedia. O que é certo é que teve que criar mecanismos para poder ter um caudal muito regular de produção musical. Talvez daqui venha a ideia de que se trata de música com um cariz matemático marcado. Talvez. Como se isso fosse uma espécie de máquina de chouriços. No limite, até pode ser essa a sua grande virtude: como pode uma música de cariz matemático ter tanta alma? Há também quem diga que uma dessas invenções foi a noção de tensão/repouso, uma característica transversal à música ocidental. Uma coisa é certa: não devia mudar muitas fraldas, o senhor.

segunda-feira, 26 de outubro de 2009

Cenoura

Era um péssimo jogador de xadrez e sabia que nunca iria melhorar. Era uma questão de incentivo: não lhe agradava que o objectivo fosse fazer o “mate” com o rei. Ainda se fosse com a rainha.

domingo, 25 de outubro de 2009

Trapos de língua #9

Para um português, o verbo “esquecer” é, sem dúvida, reflexivo. “Eu esqueço-me com facilidade”, “esqueci-me de te telefonar”. Para um brasileiro, o mesmo já não é verdade: “eu esqueci” é suficiente, não é preciso mais nada. Os espanhois recorrem ao “olvidar” mas também dizem “he olvidado” e não acrescentam mais nada. Em alemão, a mesma coisa, “ich habe vergessen” e acabou-se a conversa.

Os franceses têm duas possibilidades. O verbo “oublier” não reflexivo é a tradução do “esquecer”. “J’ai oublié de t'appeler”. Agora, a variante reflexiva do mesmo verbo tem um significado bastante diferente: “Elle s’est oubliée”, na tradução mais adequada que me ocorre para português, será “ela descuidou-se”.

Escusado será de dizer já me descuidei imensas vezes em francês, não resisto a conjugar o verbo na forma reflexiva, influenciado pelo “esquecer-me”.

sábado, 24 de outubro de 2009

sexta-feira, 23 de outubro de 2009

Trapos de língua #8

Ela insistia no “je me lave les mains” e eu continuava a achar um absurdo. Aquele “me” estava claramente a mais. Não faz sentido nenhum. Mas é óbvio que eu lavo as minhas próprias mãos; você anda para aí a lavar as mãos de outros? E discutimos mais. Ela insistia: o verbo é reflexivo, tem que ter o pronome.

E depois desarmou-me. “Je me lave”, pura e simplesmente. Porque em português, à boa moda do Pilates, eu diria “lavo as mãos” mas poria sempre o “me” – este luso – da discórdia para dizer “eu lavo-me”. Sem as duas letrinhas a seguir ao hífen posso estar não só a mim próprio, mas também à louça suja, ao carro, etc.

Finalmente comecei a atribuir alguma lógica a “lavar-me as mãos”. Ainda para mais porque em espanhol e alemão também há, respectivamente, um “me” – este castelhano – e um “mich” algures na frase equivalente. Agora, uma coisa é certa: soa terrivelmente mal e ninguém me convence do contrário.

quinta-feira, 22 de outubro de 2009

Trapos de língua #7

De início fazia-me alguma confusão que fosse preciso ter sempre o pronome perto do verbo conjugado. “Je sais”, “I know”. Porque em português eu podia dizer “sei” e estava arrumado o assunto, toda a gente sabia que era eu que sabia. Depois reparei na relação unívoca entre as formas verbais e as pessoas a que se referem. A forma “sei” não se confunde com a de outra pessoa e, portanto, só posso estar a referir-me ao “eu”. Da mesma forma que, por exemplo, “sabes” só pode ser “tu” e “sabemos” “nós”. E da mesma forma que os espanhóis, porque “sé” só se for “yo”, “sabes” “tu”, etc.

É claro que em inglês isto é impossível. O “know” pode referir-se a “I”, “you” (singular e plural), “we”, “they”. Em francês, embora a escrita permita diferenciar alguns dos casos (primeira e segunda pessoas da terceira, no caso do verbo “savoir”) a fonética é exactamente igual: “je sais”, “tu sais”, “il sait” não têm nenhuma diferença excepto no pronome. Com verbos regulares do primeiro grupo, a confusão alastra um pouco mais: “je mange”,”tu manges”, “il mange”, “ils mangent”. Em alemão, a primeira e terceira pessoas do plural, no presente, são iguais ao infinitivo do verbo: “wir wissen” e “sie wissen”.

Só num pormenor a lógica falha: nas terceiras pessoas. “Ele” ou “ela” “sabe”; “eles” ou “elas” “sabem”?

quarta-feira, 21 de outubro de 2009

Trapos de língua #6

É um castigo saber os dias da semana noutras línguas. Em miúdo, das coisas que mais me custou foi distinguir “tuesday” de “thursday”. Lembro-me das aulas na escola, íamos rotativamente ao quadro escrever o “summary” e isso implicava escrever a data. Por extenso. Houve um ano em que as aulas eram às terças e quintas e, de todas as vezes que percorria o caminho entre a última fila de cadeiras (sim, eu ficava sempre lá ao fundo) e o quadro, ia a fazer contas de cabeça. Em princípio, não me enganava. Mas tinha que pensar, usar mnemónicas, nunca foi algo que saísse naturalmente.

E não ficou por aqui. Depois foi “mardi” e a “jeudi”. E “lundi”. Por qualquer razão “mercredi” e “vendredi” foram fáceis. Assim como “miercoles” e “viernes”, embora, lá está, “martes” e “jueves” não sejam nada naturais. “Mittwoch” é fácil porque é auto-explicativa: meia semana. Agora “Dienstag” e “Donnerstag” ainda terão que ser bem treinadas.

É curioso notar que o sábado e o domingo nunca foram dias problemáticos. A proximidade com português é bastante maior. E quebrou-se aquela associação natural que não consigo deixar de fazer entre dias da semana e números. Do dois ao seis. E é isso que depois me dificulta a transposição para as terças-feiras e quintas-feiras das outras línguas: falta-lhes o número do dia.

terça-feira, 20 de outubro de 2009

Trapos de língua #5

“De dez em dez minutos uma pessoa é assaltada em Nova Iorque”. A interpretação normal desta frase seria presumir que as vítimas dos assaltos são pessoas distintas. No entanto, esta frase é ambígua porque também pode ser empregue para referir o caso em que é sempre o(a) mesmo(a) infeliz que é assaltado(a) vezes sem conta. A razão para a escolha da primeira interpretação é simples: o primeiro caso é mais provável do que o segundo caso.

Há um princípio economicista por detrás da evolução das línguas. Aparentemente, tornar o discurso “desambiguo” é custoso. E, portanto, para uma frase que possa ter mais do que um significado mas em que um deles tem uma probabilidade suficientemente grande (ou suficientemente pequena), introduzir uma explicação adicional que resolva essa ambiguidade é de uma utilidade praticamente nula. Esta ideia de que todos nós fazemos uma espécie de análise de máxima verosimilhança quando comunicamos é o que diz (de outra forma e mais coisa menos coisa) a regra de Horn.

Dois pequenos orgulhos nacionais

1
2

segunda-feira, 19 de outubro de 2009

Leben

«Até porque a minha vida não tem interesse nenhum, o que interessa são os meus livros.»

António Lobo Antunes

Lavo o meu carro escandalosamente poucas vezes.

Uma por ano, na melhor das hipóteses. Neste momento parece que acabei de regressar do Paris-Dakar. Em particular, as jantes estão tão pretas que é difícil perceber onde é que elas acabam e começa o pneu. Sempre que um cão alça a pata contra uma delas, a poça resultante fica escura do óleo que vem agarrado. Para aligeirar a minha consciência junto do meu carro que suspira por detergente, digo sempre que são os cães que mijam petróleo.

sábado, 17 de outubro de 2009

Hide your heart from sight, lock your dreams at night

É um crime que não exista no youtube uma versão disto ao vivo, só esta imagem pirosa com uma banda sonora magnífica.

sexta-feira, 16 de outubro de 2009

quinta-feira, 15 de outubro de 2009

Trapos de Língua #4

Não foram os primeiros, longe disso, a perguntar-me se temos outra língua ou dialecto. Falei-lhes do mirandês, língua com a qual praticamente nunca tive qualquer tipo de contacto. Ficam um pouco admirados. Mais nada? Sim, só o mirandês. Não temos mais nenhuma língua oficial ou dialecto que eu conheça. Temos diferentes sotaques regionais mas é só isso. De resto, só unidade linguística.

E depois ficámos a remoer. Eles, espanhóis, tinham, para além do castelhano, o catalão, o basco, o galego, para dar como exemplos. Síndrome de país pequeno? Não. Lembrei-me da Holanda. Os dialectos. Todos falam flamengo, com sotaques diferente no norte e no sul. E depois, nas vilas e aldeias do Limburgo, cada um daqueles holandeses vai para casa falar um qualquer dialecto com os pais, dialecto esse cujo uso está confinado a uma área geográfica bastante restrita.

quarta-feira, 14 de outubro de 2009

Trapos de língua #3

É por isso que gosto muito de línguas mas não gosto das maternas. Por mim, falaria muitas línguas mas nenhuma seria materna. As línguas maternas são uma espécie de pequenos tiranos influenciadores. Moldam definitivamente formas de pensar e era essa espécie de jugo que preferia não ter. Preferia ser capaz de passar de idioma para idioma com a ligeireza de quem não tem um passado ligado de forma indelével à língua portuguesa. Sem falsos amigos. Com fluidez. Irrita-me saber que nunca vou dominar nenhuma outra língua tão bem como o português.

terça-feira, 13 de outubro de 2009

Roleta

«Deutsche Bank foreclosed on the $3.9 billion Cosmopolitan Hotel; only it couldn’t find a buyer, so the bank is in the odd position of owning a casino – though given the way banks have operated in this decade, that seems like a logical business extension. »

Revista Time

segunda-feira, 12 de outubro de 2009

Bip

Tenho um atendedor de chamadas em casa mas as únicas mensagens que recebo são o som de um telefone a desligar-se.

domingo, 11 de outubro de 2009

Trapos de língua #2

National Gallery, algures lá para as traseiras do Trafalgar. Seguindo a numeração das salas repletas de quadros, entro, vindo da direita, numa sala onde está um quadro com uma tela grande na parede do fundo. Olho para ele. É um retrato de dois homens com umas boas centenas de anos em cima, bem-apessoados, bem vestidos. Olho para a descrição, em baixo, à direita. Os tipos retratados são representantes diplomáticos – um inglês e do outro não me lembro da nacionalidade – e o quadro representa as relações diplomáticas tensas entre os países que representam. Logo em seguida, referem o tapete cinzento que se pode ver entre as duas figuras. E explicam que há mais nele do que ser apenas um tapete. Visto do lado esquerdo, com uma perspectiva diferente, os olhos humanos vão conseguir aperceber-se de que está também ali uma caveira, a simbolizar as tais relações complicadas. Depois de ler esta indicação, voltei-me novamente para o quadro e, de repente, lá estava a caveira que eu ainda não tinha visto e provavelmente não veria caso não me tivessem dito que ela estava lá. Mais: a partir desse momento, não mais consegui ver o tapete, independentemente da posição – vindo da direita, da esquerda.

Isto também acontece com músicas. Há dias ensinaram-me a ouvir o Kurt Cobain dizer “não há pão quente” com sotaque açoriano na primeira frase do Smells Like Teen Spirit. E não é que é mesmo isso que ele diz? Eu só conhecia o “cá vou eu” gutural que o Eddie Vedder diz no Tattoeded e o “cavalinho na feira a correr” dos Men at Work.

Ora isto embica direitinho na questão de como a forma como vemos, ouvimos, sentimos as coisas pode ser condicionada ou manipulada com relativa facilidade. Não é algo de mecânico porque os nossos órgãos continuam a captar informação da mesma forma. A interpretação dessa informação por parte das células cinzentas é que sofre as consequências.

As línguas maternas têm esse impacto. Moldam e influenciam a forma como processamos informação e como comunicamos e nos expressamos.

sábado, 10 de outubro de 2009

Trapos de língua #1

«What we aquire as a system of sensibility by our mother tongue will afect our ability in learning other languages, verbal or symbolic. That is perhaps why the highly literate Westerner steeped in the lineal and homogeneous modes of print culture has much trouble with the non-visualworld of modern mathematics and physics.»

The Gutenberg Galaxy, Marshall McLuhan

sexta-feira, 9 de outubro de 2009

Âncora

Às vezes gostava de ser como aqueles que estão bem como estão. Assim. Despreocupados. Descontraídos. Sem sentir nenhum apelo para algo, sem precisar de mudar. Estou farto de estar farto. Cansa-me. Assim como o discurso de que estar farto, no fundo, até é bom porque é meio caminho andado para mudar, fazer, acontecer. Porque isto desgasta. Rói, corrói. Estar constantemente a pensar no “e se”. A impaciência. Questionar as merdas todas. Tenho uma inaptidão para lidar com a imobilidade. E daí até àquelas banalidades estilo “tempo perdido” é só um pulinho. E o mais irritante é que não sei porquê. É que não sei mesmo. Que raio virá a cair do céu aos trambolhões com isto tudo? Provavelmente nada. O ponto é esse: rigorosamente nada. E não conseguir evitá-lo.

quinta-feira, 8 de outubro de 2009

Mala leche

“É esquisito ter lembranças de coisas que ainda não aconteceram, acabo de lembrar que Matilde vai sumir para sempre.”

Leite Derramado, Chico Buarque

Belle du jour

O outdoor da TMN que mistura as caras do Rui Costa e do Sá Pinto é assustador. O resultado parece o Mickey Rourke num dia complicado.

quarta-feira, 7 de outubro de 2009

Velhos são os trapos

Porte-se bem.
Vou fazer-lhe uma maldade.
O mal que cá trazia.
Quem é este senhor?
Olha que não fico a dever nada a ninguém.
Estou uma moça.
Leva-me para tua casa.
A minha cabeça.
Vá lá querida, não se mexa agora.
Não, já não tenho.
Tem que comer!
Algum dia sairei daqui?
Já não se lembra?
Agoniada.
Porte-se bem. Ouviu?
Coma.
Não diga isso.
Quer água?
Vou ter que lhe fazer uma maldade.
Já não se lembra?
Já não saio daqui.
Se alguma vez pensei. Se alguma vez pensei.
Quem é este senhor, lembra-se?
A minha cabeça
Algum dia sairei daqui?
Não diga isso
E olhe que velhos são os trapos.

Do or die

Recebo mais junk mail que mail.

terça-feira, 6 de outubro de 2009

Politeísmo

O mundo está dividido entre aqueles que acreditam na existência da letra “guê” e aqueles que acreditam na existência da letra “gê”. Sem saber muito bem porquê, pertenço ao segundo grupo.

domingo, 4 de outubro de 2009

Uma vez, quando era miúdo, levei com uma pedra na testa. Sangrou bastante e ficou uma marcazinha pequena que, com o tempo, foi desaparendo.

Mas isso não explica tudo.

sábado, 3 de outubro de 2009

«Today, more than half of African Americans have incomes more than double the poverty line. By one standard, this is middle class. Amid this success, however, much black poverty remains. The African-American poverty rate, at 23.6% in 2006, is triple the white rate. Black unemployment remains double that for whites. […] about 7,9% of black males age 18-64 are either in jail or in prison. The black male incarceration rate exceeds the white male rate by a factor of eight to one. Appalingly, the lifetime chances of a black male youth entering prison exceed 25% - and this figure excludes those who will only go to the local jail.»

Animal Spirits, Akerlof e Schiller

sexta-feira, 2 de outubro de 2009

Catering

A refeição a bordo da Portugália devia ser um prego e uma cervejinha. E um arroz de gambas em executiva. Mas com a cervejinha, à mesma.

quarta-feira, 30 de setembro de 2009

Picar o ponto

No meu local de trabalho existe um sistema de controle de horários de trabalho. Picamos o ponto. Os funcionários, de acordo com o seu perfil de horário, têm que colocar um determinado número de marcações no sistema. Estas marcações podem ser feitas em terminais – espalhados por vários locais, concentrados nas entradas e perto dos elevadores – que lêem o cartão de funcionário ou através de uma aplicação no computador que também permite olhar para o histórico de marcações e lançar as férias, por exemplo.

Há dias observei pela primeira vez o sistema de ponto nos hospitais. Aquele em que é necessário colocar o dedo para que a maquineta faça a leitura da impressão digital. São uns pinchavelhos metálicos, cilíndricos, com uma abertura à altura da cintura para pôr o dedo e um teclado para introduzir a identificação do funcionário.

Achei aquilo degradante. Ofensivo. É óbvio que eu percebo que o sistema assim é mais rígido, menos susceptível de ser torneado. Mas eu não gostaria que me obrigassem a ter que pôr o meu indicador numa porcaria daquelas de cada vez que entro no meu local de trabalho. Porque é assumir, à partida, que eu sou mentiroso e que, à mínima possibilidade, vou tentar aldrabar e fazer menos horas do que aquelas que tenho que fazer.

Ver caras, ver corações #2







terça-feira, 29 de setembro de 2009

It's up to you

Texto que acompanha o envio da minha carta de condução (e as maiúsculas não são minhas): “JUNTO SE ENVIA A SUA CARTA DE CONDUÇÃO. DEPENDERÁ DE SI O SEU BOM USO.” Estava a pensar pô-la dentro da carteira e mantê-la lá a esmagadora maioria do tempo. A tirá-la, seria apenas a pedido (ou imposição) de algum agente da autoridade. Ou se o tipo do aluguer de automóveis quiser vê-la. Não sei se este é o uso adequado.

Titicaca by morning

Titicaca by dawn

segunda-feira, 28 de setembro de 2009

Kuumemittari

Abstenção - 39,4
Minha temperatura corporal - 36,9
Partido Socialista - 36,6
Partido Social Democrata - 29,1

Ciclicality

“The measure of the facts is yet to be met by the measure of our acts”

Barack Obama

domingo, 27 de setembro de 2009

Rock n' roll

O jazz teve uma Era do Swing. Mais ou menos lá para a década de trinta do século passado; morreu com a Segunda Guerra Mundial. Caracterizada pelas Big Bands. Os nomes mais sonantes eram o Duke Ellington e o Benny Goodman.

Hoje em dia vivemos numa Era de Swing Voters. Caracterizada por plataformas políticas relativamente vazias e pouco diferenciadas.

Unhas vermelhas

A barba do Rodrigo Guedes de Carvalho é interessante; a Ana Lourenço está uma autêntica estampa.

La Raya