domingo, 23 de outubro de 2011

Cenas

Dormi perto de vinte horas este fim-de-semana. Já não me lembrava da última vez que fiz algo semelhante. O cansaço acumulou e parte dele escapou por entre os lençóis da cama, pese embora o facto de ter passado a maior parte do tempo – daquele em que não estive a dormir, claro – a trabalhar. No intervalo, ou seja, ao final da tarde de domingo, estive a tentar pôr nos dedos o As time goes by. Fui eu que escolhi, o pedido foi meu e agora soa-me tão estranho, tão foleiro. Estou a conseguir assassinar um clássico enorme. Pelo menos não será uma morte prematura. E agora se calhar vou dormir mais um bocado. Boa noite.

sábado, 15 de outubro de 2011

Unterhosen

«Monday we start. I’m in the locker room, getting my feet taped, and I realize I forgot to pack underwear in my tennis bag. The match is in five minutes. Can I play without underwear? I don’t even know if it’s physically possible.
Brad jokes that I can borrow his.
I will never want to him that badly.
(…)
In the fourth set I roll him, and all at once I’m walking off the court with one of the most improbable wins of my career.
(…)
In the second round, I stick with no underwear (I will never don underwear again. Something works, you don’t change). »

quinta-feira, 13 de outubro de 2011

Peruca III

«Match, Muster.
At the net he rubs my head, musses my hair. Apart from being condescending, his gesture nearly dislodges my hairpiece.
Good try, he says.
I stare at him with pure hatred. Big mistake, Muster. Don´t touch the hair. Don’t ever touch the hair. Just for that, I tell him at the net. I’ll make you a promise. I’ll never lose to you again.»

Open, Andre Agassi

terça-feira, 11 de outubro de 2011

Peruca II

«My third date with Brooke is the night before her foot surgery. We’re in Manhattan, in the ground-floor sitting room of her brownstone. We’re kissing, on the verge, but first I need to tell her the truth about my hair.
She can sense that I have something in my mind. What’s wrong? She asks.
Nothing.
You can tell me.
It’s just that I haven’t been completely honest with you.
We’re lying on the couch. I sit up, punch a pillow, take a breath. Still searching for the right words, I look at the walls. They’re decorated with African masks, eyeless faces with no hair. They’re eerie. Also, vaguely familiar.
Andre, what is it?
This isn’t easy to admit, Brooke. But look, I’ve losing my hair for quite some time and I wear a hairpiece to cover it up.
I reach out, take her hand, put it on my hairpiece.
She smiles, I had a feeling, she says.
You did?
It’s no big deal.
You’re just not saying that?
It’s you eyes I find attractive. And your heart. Not your hair.»

Open, Andre Agassi

segunda-feira, 10 de outubro de 2011

Peruca I

«Then, catastrophe strikes. The night before the final [Roland Garros 1990], I’m taking a shower and I feel the hairpiece Philly bought me suddenly disintegrate in my hands. I must have used the wrong kind of conditioner. The weave is coming undone – the damned thing is falling apart.
In a state of abject panic I summon Philly to my hotel room.
Fucking disaster, I tell him. My hairpiece – look!
He examines it.
We’ll let it dry, then clip it in place, he says.
With what?
Bobby pins.
He runs all over Paris looking for bobby pins. He can’t find any. He phones me and says, What the hell kind of city is this? No bobby pins?
In the hotel lobby he bumps into Chris Evert and asks her for bobby pins. She doesn’t have any. She asks why he needs them. He doesn’t answer. At last he finds a friend of our sister Rita, who has a bag full of bobby pins. He helps me reconfigure the hairpiece and set it in place, and keeps it there with no fewer than twenty bobby pins.
Will it hold? I ask
Yeah, yeah. Just don’t move around a lot.
We both laugh darkly.
(…)
Warming up before the match, I pray. Not for a win, but for my hairpiece to stay on. Under normal circumstances, playing in my first final of a slam, I’d be tense. But my tenuous hairpiece has me catatonic. »

Open, Andre Agassi

domingo, 9 de outubro de 2011

Funny how falling fells like flying for a little while

«I’m up a set, rolling along, when suddenly I feel as if I’ve stepped in a mousetrap. I look down. The bottom of my shoe has fallen off. Peeled away.
I didn’t bring an extra pair of tennis shoes.
I halt the match, tell officials that I need new shoes. An announcement is made over the loudspeaker, in urgent staccato German. Can someone lend a shoe to Mr. Agassi? Size ten and a half?
It has to be a Nike, I add – because of my contract.
A man in the upper bleachers rises and waves his shoe. He would be happy, he says, to loan me his Schuh. Brad goes up and retrieves it. Though the man is size nine, I force his shoe on my foot, like some half-wit Cinderela, and resume play.»

Open, Andre Agassi

quinta-feira, 6 de outubro de 2011

Morreu o Jobs e está tudo um bocado em alvoroço. Confesso que não tinha percebido que a sua morte fosse gerar tanto frisson. Tropecei numa fotografia antiga dele e vi uma cara rendonda, bochechuda. Saudável, quero dizer, de forma que fazia um contraste enorme com as últimas fotos dele, magro numa calças de ganga velhas e naquela camisola de gola alta preta feiosa. Feiosa como o câncro dele, ainda por cima do pâncreas, tipicamente de grande agressividade. Parece que a maior parte das pessoas se lembra dele como o tipo dos gadgets, daquelas mariquices do iPhone e iPod mas a mim lembra-me mais o gajo da doença, o gajo que lutou contra o cancro e, tal como tantos outros, perdeu.

segunda-feira, 3 de outubro de 2011

O ferry vai quase vazio, às moscas.

São pouco mais de oito da manhã, o céu limpo, o sol escandinavo incide sobre as águas plácidas do Báltico, um espelho enorme. Procuro como subir ao convés, ir lá em cima exposto ao ar livre e ao frio não me parece particularmente confortável a não ser pela possibilidade de tirar fotografias. Rapidamente percebo que não vou ter essa sorte: o ferry não tem zona aberta no convés superior. Conformado, procuro um lugar entre os inúmeros disponíveis. Dou-me ao luxo de escolher com critério, só me contento com um que tenha um banco corrido com um estofo convidativo, do género daqueles onde algumas pessoas se deitaram ao comprido para dormi. Leio. De vez em quando inspecciono a janela, olho para a luz reflectida que vem lá de fora.

O maior contraste ao entrar na Estónia é a misturada. Trinta por cento da população é russa. Ouve-se a língua por todo o lado. O mesmo não acontece na Finlândia, os russos são turistas. Estou sentado numa banquinha do mercado de Helsínquia a almoçar uma sopa de camarão e uma senhora de meia-idade dirige-se em russo à rapariga que está a servir. Leva uma resposta fria em inglês; a russa de meia-idade na cidade velha de Tallinn leva uma explicação na língua dela sobre os vários tipos de amêndoas que estão à venda numa banquinha de rua.

Como é que vocês resolveram isto? A vossa história, a vossa opressão é tão recente, isto tudo ainda está tão fresco e a repulsa que vejo por exemplo nos búlgaros e nos romenos em relação aos russos ainda devia ser a vossa repulsa. Regra de marketing – há três tipos de pessoas, as que estão a favor, contra e as que estão indiferentes. Podes tentar convencer os dois primeiros tipos de pessoas do contrário daquilo que defendem mas, em relação ao último grupo, esquece, nem sequer tentes. Somos demasiado indiferentes, aceitamos e toleramos os russos sem nenhum problema. Quando saímos do restaurante onde comemos uma sopa de peixe, o céu tinha escurecido, finalmente proporcionando a verdadeira experiência de uma viagem nesta latitude.

Filas de pessoas a fazer fila para o check-in no barco. Na maioria homens e de aspecto duvidoso. Levam sacos desportivos ao ombro, mochilas às costas, trolleys na mão, carregados de garrafas de bebidas alcoólicas que tilintam à medida que andam. O álcool é consideravelmente mais barato na Estónia e o diferencial fomenta este tipo de turismo alcoólico. Desta vez o barco vai cheio. Tão cheio que não encontro um lugar onde me sentar. Sigo o exemplo de outros passageiros e sento-me no chão, na alcatifa, sempre é mais confortável. À minha volta, latas e garrafas de cerveja são abertas, alguns chegam mesmo a deitar-se no chão, possivelmente efeito secundário. Outros, ainda não contentes com o carregamento, ainda compram mais bebidas na loja tax free do barco. É domingo, são nove da noite, vamos chegar por volta das onze, já vão bem abastecidos para a semana toda.

Chego a Helsínquia e chove uma chuva fininha.