domingo, 30 de dezembro de 2012

Bola de cristal

Nas missas do futuro, os padres vão ler passagens da Bíblia a partir de e-book readers.

sábado, 29 de dezembro de 2012

Detesto comer quando tenho fome

A disciplina de filosofia no 12º ano já foi há bastante tempo mas ainda me lembro de algumas coisas do Górgias, livro onde Platão contrapõe os verdadeiros filósofos aos sofistas. Sócrates, o protagonista, está a tentar levar um dos vários sofistas com quem tem uma contenda de palavras a entrar em contradicção quando, a certa altura, a discussão sobre necessidade e prazer toca em fome e sede. Pergunta ao rival se beber é simultaneamente um prazer e uma necessidade e o outro concorda. Sócrates então acrescenta uma frase que aos olhos dos meus 17 anos me pareceu lapidar: “desde que se tenha sede”.

A frase em epígrafe foi largada hoje à mesa e ainda não percebi se deva ou não concordar – possivelmente tenho que reler o Górgias. Mas de uma coisa penso estar seguro: foi possivelmente a maior tirada filosófica que ouvi nos últimos tempos – à mesa e fora dela.

terça-feira, 25 de dezembro de 2012

A rudeza tem o seu charme

«Leva contigo o teu único filho, isaac, a quem tanto queres, vai à região do monte mória e oferece-o em sacrifício a mim sobre um dos montes que eu te indicar. O leitor leu bem, o senhor ordenou a abraão que lhe sacrificasse o próprio filho, com a maior simplicidade o fez, como quem pede um copo de água quando tem sede, o que significa que era costume seu, e muito arraigado. O lógico, o natural, o simplesmente humano seria que abraão tivesse mandado o senhor à merda, mas não foi assim.»

Caim, José Saramago

domingo, 23 de dezembro de 2012

Meu querido diário

Às 7h35 estava a apanhar o autocarro para o aeroporto. Às 9h e qualquer coisa estava a embarcar. Voo. Ao meu lado um casal chato que me fez levantar umas cinco vezes em 2h30 para ir à casa-de-banho. Aproximação para aterrar em Lisboa. Quando o avião se está a fazer à pista, borrega e sobe apressadamente. Ladies and gentlemen, this is your capitain speaking. Um problema qualquer de comunicação com a torre de Lisboa impossibilitou o sistema de aterragem automático necessário dado o denso nevoeiro. Mas vamos voltar a fazer uma aproximação e conta que estejamos no chão dentro de aproximadamente dez minutos. Qual quê. Nova tentativa, nova borrega. Mais abrupta que a primeira. Primeiros sinais de tensão na cara das pessoas. Olham em redor, olhos esbugalhados. Alguns tiram o cinto e estão a tentar sair do lugar com o avião ainda a subir; as hospedeiras lançam-se rapidamente sobre eles e convencem-nos a sentar. Desta vez o avião não começa a dar a volta como da primeira e quando piloto volta a dirigir-se aos passageiros confirma as minhas piores suspeitas: vamos para Faro. Aterramos em Faro às 14h (a hora de chegada prevista a Lisboa era 12h35). Toda a gente se levanta quando o avião pára perto do terminal mas por pouco tempo, as instrucções são para sentar e esperar por uma resolução. Só a casa-de-banho está disponível. Não há comida (nem houve), é uma companhia low-cost. A última coisa no meu estômago foi um cappuccino às 9h da manhã enquanto acabava de ler um livro do Saramago e esperava pelo embarque. A hipótese de ainda voar para Lisboa está de pé. E fica mais uma meia-hora até que se desfaz. Anunciam que vamos ser transportados de autocarro. Ficamos até perto das 15h30 no avião à espera. Depois fazemos emigração no terminal, esperamos pelas malas, vamos até ao autocarro onde, segundo nos foi prometido, nos seria dado algo de comer e some refreshments. Uma confusão doida e já estamos para arrancar e da comida nada. Um pequeno levantamento popular começa a ganhar forma, está tudo morto de fome. Uma senhora gorda e ameaçadora chega a dizer "tenho três filhos e não saio daqui sem lhes dar de comer". A pressão junto da senhora da Portway resulta e dez minutos depois chegam as sandochas mal amanhadas e as garrafas de água. Arrancamos. Adormeço. Acordo com o som de um programa infantil com o rato Mickey, importante para acalmar os miúdos que cantam e repetem aquilo que é dito. Não volto a dormir mais. Paramos em Aljustrel. Meia hora depois voltamos a andar. Chegamos ao aeroporto de Lisboa perto das 20h da noite, quase oito horas depois da hora prevista para aterrar em Lisboa e mais de doze depois de ter saído de casa.

Agora se calhar vou para a cama.

sábado, 22 de dezembro de 2012

Momento creepy do dia

Uma pessoa com exactamente o mesmo nome do que eu - mas que eu não conheço de lado nenhum - adicionou-me ao facebook. Vamos ser amigos porque os nossos pais têm o mesmo gosto em matéria de nomes.

quinta-feira, 20 de dezembro de 2012

O problema é saber qual o fuso horário correcto

Porque tecnicamente o mundo pode ter acabado já na Austrália e em grande parte do Oriente. Mais umas horitas e desvenda-se o mistério.

quarta-feira, 19 de dezembro de 2012

segunda-feira, 17 de dezembro de 2012

domingo, 16 de dezembro de 2012

Anti-clockwise

A tua fotografia dá-me uma chapada na cara. Inesperada. Os olhos claros queimam-me, os cabelos escuros cegam-me. Semeámos uma pedra e, ao longo deste tempo, deixámo-la crescer. Aos poucos, lentamente, porque o tempo não gosta de tratar de nada precipitadamente: o tempo leva tempo a tratar das coisas. E a pedra cresceu, ganhou forma, ganhou tamanho, tornou-se num verdadeiro pedregulho, um calhau enorme, pesadíssimo. Ao ponto de ninguém conseguir pegar nela, totalmente inamovível. E depois cometemos o erro de pensar, supor, assumir que era suficiente. Que abafaria toda e qualquer chapada inesperada, claridade ardente, escuridão ofuscante. Que nos protegeria de tudo o que viria, de tudo o que veio. E tudo o que pode vir a ser. Um erro de principiante, claro, uma ingenuidade rotunda e ignorante. Há assuntos tão grandes que nenhuma pedra – por quão grande que seja – os pode cobrir. E é por causa da queimadura, da cegueira, da chapada sonora inesperada que nos deixa atónitos que gradualmente percebemos. A pedra que semeámos, cuidámos e deixámos lentamente que crescesse afinal quanto mais cresce mais pequena se torna – e é uma surpresa: uma vez mais, a ingenuidade rotunda e ignorante. Passa subitamente de um pedregulho, calhau enorme a uma pequena pedra, uma pedrinha.

O tamanho ideal para se alojar no nosso sapato.

terça-feira, 11 de dezembro de 2012

Ovelha negra

No meio da secretária de trabalho, replete de livros técnicos sobre África, sociologia, política e sistemas eleitorais – há um que destaca grandemente aos meus olhos, deitado no meio de uma pilha: “the new encyclopedia of modern body building”.

O autor é um certo Arnold Schwarzenegger.

quinta-feira, 6 de dezembro de 2012

I want a lawyer

A cortina que separa a classe executiva dos ranhosos da turística é fechada assim que avião atinge uma altitude respeitável. Para dar aquela pinta de exclusividade: os pindéricos, se quiserem saber o que passa por detrás daquele tecido cinzento, terão que pagar mais para a próxima para descobrir. Entretanto, ficam a pensar: refeições fartas, hospedeiras sexys. A verdade não podia estar mais longe. Ok, a refeição é melhor que a sandocha manhosa dos tesos mas não é assim tão impressionante. E as hospedeiras não são mais sexys, pelo contrário. São nomalmente as chefes de cabine que, por força da natureza, são as mais velhas. E que, normalmente, e também por força da natureza, não as mais sexys.

quarta-feira, 5 de dezembro de 2012

Cachecóis, luvas, gorros e chapéus.

Devem ter caído das mãos de algum incauto e alguém teve a bondade de os apanhar do chão e colocar em cima de muros, por exemplo, na expectativa de que o dono distraído se aperceba da sua falta e resolva refazer os passos para tentar reavê-los. Por vezes, as luvas embrulhadas umas nas outras, um quase requinte de exposição, uma decoração exterior. A cidade parece um perdidos e achados gigante.

segunda-feira, 3 de dezembro de 2012

Gelo estacionado nos telhados escuros de manhã.

Derrete, no entanto, em poucas horas após o amanhecer. O céu não está tão cinzento como esperado – não tem estado – aliás, a ausência de nuvens provavelmente levou a temperaturas mais baixas. A humidade potencia o frio mas é o vento que faz o frio furar o casaco e rasgar o torso, os ossos.