É por esta altura que Beatriz começa a ficar intrigada. De olhos esbugalhados, fixados naquelas manchas que certamente não compreende, levanta-se e dirigi-se até elas, para as ver de mais perto. Qual astrónomo que varre a abóbada celeste em busca de estrelas, Beatriz perscruta o tecto polvilhado de rasgões luminosos. A espaços, olha para nós e solta pequenos miados, como que partilhando o mistério connosco.
Sobe para cima da mesa, para cima dos móveis, para ficar mais perto, possivelmente desejando ter um telescópio que auxiliasse a observação. Quando os objectos estão nas paredes, opta por uma observação ainda mais directa: apoia-se nas patas de trás e estica-se para lhes tocar com as patas dianteiras.
É certo que, por vezes, a culpa é nossa: sentados no sofá e armados em safados, pegamos no telemóvel naquela posição e inclinação óptimas para gerar um reflexo. Que é ainda mais convidativo que os outros estáticos, uma vez que este tem o condão de se mexer.
De inicio dava por mim a tentar explicar-lhe "Beatriz, é só um reflexo sua maluquinha". Com o tempo, fui percebendo que o conceito de "só um reflexo" não existe. Ironia do destino: agora, quando chega aquela hora, também eu viro a cabeça para cima e aprecio aqueles rasgões luminosos, projectados no bocado de edifício que nos separa dos vizinhos de cima.
Estou emocionada.
ResponderEliminar