segunda-feira, 30 de novembro de 2015

Se fosse cão, mordia

Quando surgiu, a aplicação find my iPhone utilizava-se a partir do iCloud, para quem quisesse localizar o seu telemóvel perdido. Um amigo conseguiu recuperar um telemóvel roubado desta forma - ladrões pouco experientes que não o desligaram. Com a mais recente actualização do software do iPhone, a aplicação passa a estar no próprio aparelho. Já me aconteceu andar à procura de umas chaves que tinha na mão ou dos óculos que estavam na cara no sítio correcto. Ainda assim, esta localização da aplicação parece-me de utilidade menos evidente.

quinta-feira, 26 de novembro de 2015

It's heartache either way

Leio o título "Mas é bonito" da versão portuguesa do livro de Geoff Dyer. Demoro um bom bocado a perceber que se trata do "But Beautiful".

quarta-feira, 25 de novembro de 2015

Pé calçado

Num futuro que já poderia ser passado, as meias de vidro seriam de acrílico.

segunda-feira, 23 de novembro de 2015

We are the world

Referir-se a si próprio utilizando a primeira pessoa do plural é uma prática de dois extremos da sofisticação intelectual. É uma característica de textos técnicos e científicos e de entrevistas de jogadores de futebol. Em ambas as situações, transparece uma clara necessidade de acompanhamento quando se manifesta uma opinião: é mais fácil quando temos um conjunto de pessoas que a partilham connosco. Ou isso ou acompanhamento clínico.

sábado, 21 de novembro de 2015

The saturday essay

If so, it is, again, a great irony for Europe, and perhaps a tragic one. Having excoriated the U.S. for invading Iraq, Europeans played no small part in bringing on the crisis of confidence and conscience that today prevents Americans from doing what may be necessary to meet the Middle Eastern crisis that has Europe reeling.

SNAP out of it

Num cartaz grande, uma afirmação de Jorge Sampaio. Lisonjeira. Por debaixo, a identificação da campanha e do candidato presidencial: SNAP, Sampaio da Nova a Presidente. O acrónimo soa bem, é catchy. E até pode ter o benefício de chegar às camadas mais jovens da população, fazendo a associação com apps para telemóveis espertíssimos (embora, eventualmente, demasiado jovens para votar). Mas, indo à génese do termo, é capaz de não ser a expressão mais feliz para anunciar e publicitar uma candidatura.

sexta-feira, 20 de novembro de 2015

Rebeldia

Beber um copo de leite matinal à tarde. Ou à noite, antes de ir para a cama.

quinta-feira, 19 de novembro de 2015

DIY

Está sentado numa cadeira de madeira, baixa, tosca, desengonçada, de um tempo em que as pessoas tinham uma estatura mais baixa. Está encostado às costas do banco, do lado direito de quem entra. É hora de ponta, e a carruagem do metro, embora não vá a rebentar pelas costuras, vai ainda assim bastante cheia e o local que o velhote escolheu para se sentar perturba a entrada e saída de passageiros. Ele não parece muito ralado, não faz o mínimo gesto para facilitar o movimento dos outros. Só quando chega a sua paragem se levanta, pega na cadeira pelo encosto e sai da carruagem.

terça-feira, 17 de novembro de 2015

78 rotações

A aparelhagem deixou de ser hi-fi quando traiu o gira-discos com o televisor.

segunda-feira, 16 de novembro de 2015

Crib

As pessoas chiques não têm esqueletos no armário. Têm esqueletos no closet.

quarta-feira, 11 de novembro de 2015

Sapo a sapo, encher o saco

Há pouco, numa entrevista no telejornal da RTP, João Adelino Faria desculpou-se pelo termo antes de perguntar a Catarina Martins se ela não iria engolir um sapo nos casos de medidas em que o BE discorda do PS e que não estão vertidas no acordo que os dois partidos assinaram.

A expressão tem aliás tido bastante tempo de antena recentemente. Por exemplo, no Governo Sombra, Ricardo Araújo Pereira aconselhou Francisco Assis a, na próxima refeição com o seu grupo de apoiantes, a trocar o leitão na Mealhada por um sítio onde sirvam perninhas de rã para se ir habituando ao "sapinho" que terá de engolir.

Saber fazer cedências é saudável e, possivelmente, sinal de maturidade. Mas há um limite (também saudável) para as muitas (e grandes) cedências que estamos dispostos a tolerar. Em demasia podem acabar em azia - uma expressão que, curiosamente, surge mais no âmbito do futebol do que da medicina.

Este parece-me ser um grande problema actual: um conjunto variado de uma espécie de bombas-relógio, cujos ponteiros avançam sapo a sapo.

terça-feira, 10 de novembro de 2015

Void

A maior falha do Kamasutra - e que urge suprir - é não ter uma posição de demissionário.

segunda-feira, 9 de novembro de 2015

Novo acordo ortográfico

Na ementa de um restaurante chinês - tido como autêntico, onde os orientais também vão, não como os que normalmente se vêem - um cabeçalho com "novos platos". Dificilmente se poderá ver um melhor exemplo da aplicação do novo acordo ortográfico: a aproximação da linguagem escrita à oral.

sábado, 7 de novembro de 2015

Não poder comer carne processada é kafkiano.

Concordaram A. e P., entre duas dentadas numa bolacha saudável; depois, simpaticamente, relembraram.

quarta-feira, 4 de novembro de 2015

Enquanto (des)carregas

Percebe-se que a bateria do computador está afectada quando demora mais tempo a carregar do que a descarregar.

terça-feira, 3 de novembro de 2015

O funcionário do aeroporto do outro lado do balcão do check-in pronuncia “Frabang” em vez de “Prabang”, como até então tinha visto escrito.

Não percebo como aquele “p” pode virar um “f” e é só mais tarde me apercebo que, para os entendidos, se trata de Louangphrabang. Assim, junto e comprido e com “ph”.

Do alto da janela do avião dificilmente se vê mais do que o verde gritante da floresta e o castanho do Mekong. O ar é menos carregado, sente-se menos humidade e o calor, embora intenso, é aqui menos sufocante.

O maior contraste talvez seja o do ritmo. Tudo é mais calmo aqui, tudo transmite um tempo que avança de outra forma. Os laoitas falam mais espaçadamente e despedem-se com uma vénia muito ligeira só com a cabeça, ao mesmo tempo que juntam as duas mãos à frente do peito. As buzinadelas incessantes das ruas vietnamitas não se fazem ouvir, nem mesmo quando vários veículos se aproximam de um cruzamento. A cidade está repleta de templos budistas, dentro dos quais os monges de laranja açafrão cantam ao lado de estátuas coloridas e seráficas.

segunda-feira, 2 de novembro de 2015

Levam-nos a um estabelecimento que mais parece um restaurante do que o café ou pastelaria que eu tinha imaginado para um pequeno-almoço.

Mas que, tendo em conta o que nos é servido, acaba por fazer sentido. As mesas de madeira têm bancos corridos, sentamo-nos os três de um lado, elas do outro. Primeiro vêm pequenos pratos com lima, malagueta muito vermelha em rodelas e um recipiente com algo que se assemelha a farturas. E, pouco tempo depois, colocam-nos à frente taças consideráveis com uma sopa. Noodles, ervas aromáticas, rebentos de soja e, de acordo com a nossa escolha, carne de vaca. Trata-se da típica phó, inscrição que vi em vários toldos e ementas nos dias anteriores.
Explicam-nos como se come: as farturas dentro da água quente a amolecer, cuidado com a malagueta, reservada aos mais audazes. A lima no fim, só um pouco, para acabar o caldo picante. Fazemos perguntas sobre o prato – por exemplo, se se come normalmente àquela hora da manhã – e pronunciamos o nome como a nossa mente lusa o vê escrito: com um “ó” seco e rígido no fim, como o acento nos indica. A pronúncia fá-las sorrir e ficar um pouco desconfortáveis. Explicam-nos que a vogal tem que ser mais longa
Phóóóó.
Caso contrário pode ser interpretado como outra palavra. E, pela explicação seguinte, mais do que uma singela e inocente palavra, percebemos que o segundo significado é um palavrão. A bad word. O vietnamita também é traiçoeiro.
No imediato, dado o aparente desconforto com que nos ensinam as vicissitudes da pronunciação curta e longa de vogais, não ousamos perguntar qual o famigerado segundo significado da palavra phó com um “ó” curto. Mas, passado algum tempo, um de nós não consegue suster a curiosidade e rasga o desconforto com a pergunta. Segue-se um novo pequeno riso, um trocar de opiniões a dois (a duas, neste caso) na língua autóctone, baixinho como se por milagre da natureza algum de nós conseguisse minimamente entender. E depois, com algum embaraço, vem a revelação
It means bitch.
E este bitch, dado o secretismo inicial, sabe-nos a pouco, parece demasiado inócuo para ser a bad word. Não é assim tão bad para o nosso referencial ocidental.
Passados uns dias, a propósito de algo de que já não me lembro, oiço, em bom português, a frase
Ou então comemos uma phó.
Não resisto a perguntar se se trata de uma phóóóóó ou de uma phó.

domingo, 1 de novembro de 2015

Descansamos um pouco após a primeira tirada a subir o monte.

Bebemos água – apesar do céu carregado, do caminho relativamente acessível, o calor faz-se sentir e cola-se-nos à pele. A vista não é a que queremos, a camada de nevoeiro não nos deixa ver tudo o que se poderia alcançar.
Paramos para almoçar num casinhoto, à beira de um cruzamento entre duas estraditas de cimento, juntamente com outros grupos de turistas que fazem trekkings como nós. A seguir ao almoço
“F’ied ‘ice with chick’n”,
a preferência que tinhamos manifestado ao início da manhã, somos rodeados por senhoras que treparam a encosta connosco de manhã e que, pelo caminho, já haviam manifestado a vontade de que lhes comprássemos algo
“You buy something f’om me, sir’”,
com um sorriso de dentes escuros mas contagiante. Algumas fizeram o percurso de chinelos e de pés imundos, uma com um bebé corpulento às costas o tempo todo. Abrem os sacos e mostram-nos o que têm para vender, colocam em cima da mesa. Não conseguimos dizer que não e deixamos algum dinheiro em troco de algumas bolsas, trapos e instrumentos musicais.
Quando acabamos as compras pós-prandiais, a nossa guia senta-se connosco e oferece-nos duas alternativas. A partir daqui, a maioria dos trekkings segue a estrada de cimento que foi colocada para as motos atingirem a montanha até à aldeia no sopé. Em alternativa, propõem-nos seguir um little path, sem turistas, e much more beautiful. É mais difícil e escorregadio, e só pode ser feito porque hoje não choveu. De imediato, e obviamente, escolhemos a segunda opção.
O caminho exige a nossa constante atenção mas, nos intervalos em que deixamos de olhar para baixo e pensar no próximo obstáculo, vemos os campos de arroz. Quase como numa espécie de socalcos, alimentados por pequenos carreiros e cursos de água.
A certa altura passamos no que parece ser as traseiras de uma casa, um grupo de miúdos riem-se à nossa passagem e falam entre eles. A nossa guia ouve a conversa e ri-se também. Explica-nos (traduz-nos) que os miúdos comentam que nunca viram gente tão grande.