«- Que vergonha! exclamou. – Que vergonha, Mr. Humbert! Coitado do rapaz, que acaba de ter sido matado [has just been killed] na Coreia.
Eu retorqui se não lhe parecia que vient de, seguido de infinitivo, exprimia os acontecimentos recentes com bastante mais rigor do que o abstruso presente perfeito do inglês?»
Lolita, Vladimir Nabokov
sexta-feira, 31 de agosto de 2018
quinta-feira, 30 de agosto de 2018
quarta-feira, 29 de agosto de 2018
terça-feira, 28 de agosto de 2018
Apesar de todas as diferenças entre os povos eslavos dos Balcãs há, no mínimo, uma coisa que os une.
E de uma forma bastante saliente. Podemos sentar à mesma mesa um sérvio e um croata, daqueles que tem a aspereza típica, a roçar a rudeza, similar à dos russos. E que, ainda por cima, nutrem uma rivalidade e uma antipatia entre si bastante evidentes. E ainda adicionar um bósnio (já parece uma anedota) e um montenegrino. E ainda um macedónio, cuja simpatia natural os coloca nos antípodas dos sérvios e croatas. É altamente provável que a reunião destas pessoas resulte em confusão e zaragata, próprias de quem consegue discordar de praticamente tudo. No entanto, é provável que, num aspecto muito particular, estejam em perfeita sintonia:
Albanians are strange
uma frase que ouvimos mais do que uma vez.
A tendência natural que temos de arrumar, organizar, etiquetar toda a informação com que nos deparamos é forçada, pelos albaneses, a trabalhar horas extraordinárias. Não são de todo como os restantes eslavos daquelas paragens. Mas também não são como os turcos ou como árabes. A língua, apesar de ser indo-europeia, ocupa um ramo próprio, isolada das demais. E, como se tudo isso não chegasse e não fosse suficientemente diferente, ainda pronunciam os “r” de forma enrolada, a fazer lembrar os brasileiros nordestinos.
De todos, a Bósnia é o país que sente mais diverso, eventualmente porque é o aquele onde a fronteira geográfica menos coincide com a da própria estrutura da população e, por isso, menos centrada numa única etnia, como nos restantes países. A organização político-administrativa é, também ela, diferente: ao conduzir no país, passamos pelas placas que assinalam a fronteira entre duas regiões, a fazer lembrar a forma como atravessamos as fronteiras da União Europeia. De um lado, a Federação da Bósnia Herzegovina, onde se localiza a capital Sarajevo, maioritariamente habitada por população bosníaca, essencialmente muçulmana, e croata; do outro lado, a República Sérvia, como o próprio nome indica, maioritariamente sérvia. A sede da Assembleia Nacional e do Governo desta última – que tem um presidente e um primeiro-ministro – e é Banja Luca. Finalmente, há ainda um pequeno distrito, perto da fronteira com a Sérvia, que é independente.
Parece haver claramente um espírito balcânico, que atravessa transversalmente aqueles lugares e aquelas gentes e os toca a todos, uma afirmação que tenho de acompanhar da devida ressalva de que se trata de uma perspectiva externa de quem é confessadamente pouco conhecedor da região e a da história. Da mesma forma que, pese embora me sinta manifestamente diferente de um espanhol, não deve haver muitos conjuntos de pessoas que nos sejam mais próximos.
Albanians are strange
uma frase que ouvimos mais do que uma vez.
A tendência natural que temos de arrumar, organizar, etiquetar toda a informação com que nos deparamos é forçada, pelos albaneses, a trabalhar horas extraordinárias. Não são de todo como os restantes eslavos daquelas paragens. Mas também não são como os turcos ou como árabes. A língua, apesar de ser indo-europeia, ocupa um ramo próprio, isolada das demais. E, como se tudo isso não chegasse e não fosse suficientemente diferente, ainda pronunciam os “r” de forma enrolada, a fazer lembrar os brasileiros nordestinos.
De todos, a Bósnia é o país que sente mais diverso, eventualmente porque é o aquele onde a fronteira geográfica menos coincide com a da própria estrutura da população e, por isso, menos centrada numa única etnia, como nos restantes países. A organização político-administrativa é, também ela, diferente: ao conduzir no país, passamos pelas placas que assinalam a fronteira entre duas regiões, a fazer lembrar a forma como atravessamos as fronteiras da União Europeia. De um lado, a Federação da Bósnia Herzegovina, onde se localiza a capital Sarajevo, maioritariamente habitada por população bosníaca, essencialmente muçulmana, e croata; do outro lado, a República Sérvia, como o próprio nome indica, maioritariamente sérvia. A sede da Assembleia Nacional e do Governo desta última – que tem um presidente e um primeiro-ministro – e é Banja Luca. Finalmente, há ainda um pequeno distrito, perto da fronteira com a Sérvia, que é independente.
Parece haver claramente um espírito balcânico, que atravessa transversalmente aqueles lugares e aquelas gentes e os toca a todos, uma afirmação que tenho de acompanhar da devida ressalva de que se trata de uma perspectiva externa de quem é confessadamente pouco conhecedor da região e a da história. Da mesma forma que, pese embora me sinta manifestamente diferente de um espanhol, não deve haver muitos conjuntos de pessoas que nos sejam mais próximos.
segunda-feira, 27 de agosto de 2018
Poucos quilómetros depois de termos saído de Sarajevo, logo após uma curva, vemos dois polícias ao lado da estrada.
Um deles aproxima-se mais do alcatrão e, com uma placa redonda na mão, agita-me um sinal de stop. Abrando e encosto ao lado da estrada, perto do carro deles. O polícia que me mandou parar chega-se ao meu vidro, dá-me um “dobro den” e eu devolvo-lhe um “good morning” acompanhado dos passaportes, documentos do carro e carta de condução. Inspecciona-os durante uns instantes, devolve tudo e, num inglês carregado de eslavo,
Daniel, problem is speeding.
Numa primeira reacção, a acusação até nem me parece má, tendo em conta que, pouco antes, tinha atravessado um traço contínuo para ultrapassar um camião lento. Informa-me que ia a 82 km/h quando o limite era 60 km/h. O limite, naquela estrada, devia ser 80 ou 90 km/h mas, nas curvas, é costume ser reduzido para 60 km/h, o que eu, pura e simplesmente, não reparei. E, por isso, – e à semelhança do que me aconteceu há mais de dez anos, na Croácia, a única outra multa de velocidade que recebi – os polícias colocam-se à saída destes percursos de velocidade temporariamente inferior para apanhar os incautos.
Pede-me para sair do carro e diz-me que terei de ir até Pale, uma localidade a algumas dezenas de quilómetros, pagar uma multa de 100 marcos conversíveis (ou seja, 50 euros) na estação da polícia, e regressar àquele local. Esta parte devia ter-me feito sorrir porque, de pouco provável ou, mesmo surreal, ajudou a clarificar rapidamente o que se estava a passar.
O polícia sentou-se no seu carro e começou a passar a multa. Enquanto escrevia, o colega aproximou-se do nosso carro para dar uma olhadela de aprovação, a única intervenção que teve em todo o processo. Expliquei-lhe que íamos para Belgrado naquele dia para entregar o carro e, no dia seguinte, tínhamos um voo de regresso bastante cedo, pelo que não teria tempo para regressar ali. Pagaria a multa em Pale e seguiria caminho. Acrescentou qualquer coisa, dando a entender que tinha entendido o que lhe tinha dito, mostrando alguma simpatia com o argumento,
Sorry, my English bad
acompanhado de uma cara franzida e um gesto com a mão direita a oscilar lateralmente.
Pediu-me para assinar a multa e mostrou-me o código da estrada onde estavam discriminados os montantes da multa para um excesso de velocidade superior a 20 km/h face ao limite estipulado: de 100 a 300 marcos conversíveis, para que tivesse noção que me estava a aplicar o mínimo previsto por lei. O que ainda não lhe tinha dito nesta altura é que só tinha 20 euros na carteira e pouco mais de 40 dinares sérvios, que perfazem a módica quantia de cerca de 35 cêntimos.
Mas, pouco após a consulta ao código da estrada,
I help you
e chama a minha atenção para o número 25 que digita num bloco de papel que tem no colo, seguido da fracção 1 sobre 2. E escreve este valor na multa, enquanto continua a repetir
I help you
Confirmamos com ele que não temos de ir a Pale e digo-lhe que só temos os tais 20 euros. De imediato, esvazio a carteira à frente dos seus olhos, mostro-lhe a (apetecível) nota e ainda retiro os 40 dinares sérvios.
No problem
Diz enquanto rabisca um 0 por cima do 5 que já tinha feito na multa e altera o valor para os 20 euros. Acena negativamente aos dinares sérvios e segura na mão a multa e a nota de 20.
I deliver this for you in Pale Police Station
Frase à qual ainda acrescentamos um agradecimento quase tão falso quanto a sua vontade de ser solícito.
Antes de voltarmos ao carro para retomar o caminho, deixou-me a advertência
Drive slowly
À saída, na fronteira, perguntam-nos em que dia entrámos no país, porque não temos o carimbo de entrada.
Daniel, problem is speeding.
Numa primeira reacção, a acusação até nem me parece má, tendo em conta que, pouco antes, tinha atravessado um traço contínuo para ultrapassar um camião lento. Informa-me que ia a 82 km/h quando o limite era 60 km/h. O limite, naquela estrada, devia ser 80 ou 90 km/h mas, nas curvas, é costume ser reduzido para 60 km/h, o que eu, pura e simplesmente, não reparei. E, por isso, – e à semelhança do que me aconteceu há mais de dez anos, na Croácia, a única outra multa de velocidade que recebi – os polícias colocam-se à saída destes percursos de velocidade temporariamente inferior para apanhar os incautos.
Pede-me para sair do carro e diz-me que terei de ir até Pale, uma localidade a algumas dezenas de quilómetros, pagar uma multa de 100 marcos conversíveis (ou seja, 50 euros) na estação da polícia, e regressar àquele local. Esta parte devia ter-me feito sorrir porque, de pouco provável ou, mesmo surreal, ajudou a clarificar rapidamente o que se estava a passar.
O polícia sentou-se no seu carro e começou a passar a multa. Enquanto escrevia, o colega aproximou-se do nosso carro para dar uma olhadela de aprovação, a única intervenção que teve em todo o processo. Expliquei-lhe que íamos para Belgrado naquele dia para entregar o carro e, no dia seguinte, tínhamos um voo de regresso bastante cedo, pelo que não teria tempo para regressar ali. Pagaria a multa em Pale e seguiria caminho. Acrescentou qualquer coisa, dando a entender que tinha entendido o que lhe tinha dito, mostrando alguma simpatia com o argumento,
Sorry, my English bad
acompanhado de uma cara franzida e um gesto com a mão direita a oscilar lateralmente.
Pediu-me para assinar a multa e mostrou-me o código da estrada onde estavam discriminados os montantes da multa para um excesso de velocidade superior a 20 km/h face ao limite estipulado: de 100 a 300 marcos conversíveis, para que tivesse noção que me estava a aplicar o mínimo previsto por lei. O que ainda não lhe tinha dito nesta altura é que só tinha 20 euros na carteira e pouco mais de 40 dinares sérvios, que perfazem a módica quantia de cerca de 35 cêntimos.
Mas, pouco após a consulta ao código da estrada,
I help you
e chama a minha atenção para o número 25 que digita num bloco de papel que tem no colo, seguido da fracção 1 sobre 2. E escreve este valor na multa, enquanto continua a repetir
I help you
Confirmamos com ele que não temos de ir a Pale e digo-lhe que só temos os tais 20 euros. De imediato, esvazio a carteira à frente dos seus olhos, mostro-lhe a (apetecível) nota e ainda retiro os 40 dinares sérvios.
No problem
Diz enquanto rabisca um 0 por cima do 5 que já tinha feito na multa e altera o valor para os 20 euros. Acena negativamente aos dinares sérvios e segura na mão a multa e a nota de 20.
I deliver this for you in Pale Police Station
Frase à qual ainda acrescentamos um agradecimento quase tão falso quanto a sua vontade de ser solícito.
Antes de voltarmos ao carro para retomar o caminho, deixou-me a advertência
Drive slowly
À saída, na fronteira, perguntam-nos em que dia entrámos no país, porque não temos o carimbo de entrada.
domingo, 26 de agosto de 2018
A maioria dos edifícios mais antigos de Sarajevo, anteriores à guerra, tem buracos de balas.
Como se fossem daqueles durões que gostam de exibir as cicatrizes resultantes de brigas e rixas. Neste caso, um cerco de mais de 1400 dias, o mais longo da história da guerra moderna. Coabitam com prédios de construção moderna, que parecem ser escritórios, envidraçados que espalham a luz como espelhos.
Na recepção do hotel, a funcionária veste um hijab azul, que contrasta com a pele muito branca. Tem uma voz doce e o melhor inglês com que nos deparámos em quase quinze dias. O quarto é no primeiro andar e, quando lhe perguntamos se há elevador, diz-nos que não
It’s ok, you are men
e faz um gesto que evidencia o bicípite. Pego na mala, pouco convencido.
Palmilhamos a zona central da cidade, as ruas pedonais que se iniciam na praça conhecida como a dos pombos, repletas de lojas e esplanadas, algumas das quais ocupadas por pessoas a fumar shisha. Comemos cevapi – umas salsichas pequenas de carne picada, servidas num pão circular, acompanhadas de bocados de cebola – e burek – uma espécie de pastel de carne. Entramos no pátio da mesquita, perto da torre do relógio.
Para lá da zona mais velha da cidade, as ruas adquirem um aspecto mais moderno, as lojas passam a ostentar as marcas internacionais. Passamos por uma igreja católica. Um grupo de miúdos faz uma sessão de breakdance atrás de um recipiente para receber moedas. De acordo com uma inscrição, pretendem ir a um concurso de dança e precisam de angariar dinheiro.
Na recepção do hotel, a funcionária veste um hijab azul, que contrasta com a pele muito branca. Tem uma voz doce e o melhor inglês com que nos deparámos em quase quinze dias. O quarto é no primeiro andar e, quando lhe perguntamos se há elevador, diz-nos que não
It’s ok, you are men
e faz um gesto que evidencia o bicípite. Pego na mala, pouco convencido.
Palmilhamos a zona central da cidade, as ruas pedonais que se iniciam na praça conhecida como a dos pombos, repletas de lojas e esplanadas, algumas das quais ocupadas por pessoas a fumar shisha. Comemos cevapi – umas salsichas pequenas de carne picada, servidas num pão circular, acompanhadas de bocados de cebola – e burek – uma espécie de pastel de carne. Entramos no pátio da mesquita, perto da torre do relógio.
Para lá da zona mais velha da cidade, as ruas adquirem um aspecto mais moderno, as lojas passam a ostentar as marcas internacionais. Passamos por uma igreja católica. Um grupo de miúdos faz uma sessão de breakdance atrás de um recipiente para receber moedas. De acordo com uma inscrição, pretendem ir a um concurso de dança e precisam de angariar dinheiro.
sábado, 25 de agosto de 2018
Não foi tarefa fácil perceber como se chegava de carro até ao apartamento.
A certa altura sou forçado a fazer marcha-atrás numa rua estreita que parece conduzir-nos a uma zona pedonal. Com algum custo, percebemos que existe outra forma de ir dar onde queremos, até avistarmos um parque de estacionamento com o nome que procuramos. O tipo do parque, depois de me ajudar a fazer a manobra, telefona a quem nos deverá receber. Más notícias, não é ali que vamos deixar o carro. Nova manobra até finalmente estacionar o carro definitivamente para o resto do dia.
Carregamos, uma vez mais, as malas por uma escadaria, até ao apartamento, uma tarefa quase diária. A janela dos quartos dá para uma mesquita, que nos deixa apreensivos em relação à possibilidade de sermos acordados com um chamamento de manhã cedo.
Estamos muito perto do centro histórico da cidade, uma zona de ruas estreitas empedradas, repletas de restaurantes, lojas de recordações e tralhas para turistas. E, claro, pejadas de turistas. Tão pejadas que a tarefa de encontrar um restaurante para jantar acaba por não ser tão fácil quanto isso. Acabamos por conseguir a nossa mesa à beira do rio, onde nos servem doses cavalares enquanto somos devorados por mosquitos. O empregado pergunta-nos a nossa nacionalidade e, perante a resposta, se entendemos espanhol, pelo que terminamos a refeição noutro idioma.
As fotografias ficam para a manhã do dia seguinte. Retomamos as mesmas ruas da noite anterior, e seguimos um pouco mais até atravessar a famosa ponte, reconstruída depois da guerra que a tombou.
O ponto seguinte na lista já é feito de carro, mais perto da saída da cidade. Um edifício que, antes da guerra, albergava um banco comercial mas, devido à localização e aos sete ou oito andares, acabou por se revelar de bastante utilidade para os atiradores furtivos. Passou e ficou a ser conhecido por snipper building. Hoje em dia, está abandonado e vedado, as paredes estão repletas de graffitis. A fachada do prédio que fica defronte, do outro lado da rua, está cravejada de buracos de balas, assim como o alcatrão da estrada.
Carregamos, uma vez mais, as malas por uma escadaria, até ao apartamento, uma tarefa quase diária. A janela dos quartos dá para uma mesquita, que nos deixa apreensivos em relação à possibilidade de sermos acordados com um chamamento de manhã cedo.
Estamos muito perto do centro histórico da cidade, uma zona de ruas estreitas empedradas, repletas de restaurantes, lojas de recordações e tralhas para turistas. E, claro, pejadas de turistas. Tão pejadas que a tarefa de encontrar um restaurante para jantar acaba por não ser tão fácil quanto isso. Acabamos por conseguir a nossa mesa à beira do rio, onde nos servem doses cavalares enquanto somos devorados por mosquitos. O empregado pergunta-nos a nossa nacionalidade e, perante a resposta, se entendemos espanhol, pelo que terminamos a refeição noutro idioma.
As fotografias ficam para a manhã do dia seguinte. Retomamos as mesmas ruas da noite anterior, e seguimos um pouco mais até atravessar a famosa ponte, reconstruída depois da guerra que a tombou.
O ponto seguinte na lista já é feito de carro, mais perto da saída da cidade. Um edifício que, antes da guerra, albergava um banco comercial mas, devido à localização e aos sete ou oito andares, acabou por se revelar de bastante utilidade para os atiradores furtivos. Passou e ficou a ser conhecido por snipper building. Hoje em dia, está abandonado e vedado, as paredes estão repletas de graffitis. A fachada do prédio que fica defronte, do outro lado da rua, está cravejada de buracos de balas, assim como o alcatrão da estrada.
sexta-feira, 24 de agosto de 2018
Não estava à espera de encontrar um parque de estacionamento tão grande.
Estacionamos à sombra e, ao caminhar em direcção à entrada, olhamos para uma indicação. Para além dos meses do ano, há um conjunto de números seguidos de “KM”. Lutamos um pouco até perceber que não se trata de uma distância, mas sim de preços: “KM” é a designação dos marcos convertíveis e não quilómetros mas, desde esse momento, passam a ser informalmente conhecidos pela palavra que designa a unidade de distância.
Nos meses de verão, o preço é o equivalente a 5 euros por pessoa. Na bilheteira não aceitam cartão (refrescante) e só temos uma nota de 5 euros. Explicamos e o funcionário, muito simpaticamente, faz um gesto de cagandismo e deixa-nos entrar. Cruzamo-nos com pessoas no sentido inverso – para além de nós, não há ninguém a entrar àquela hora do final da tarde – e, à medida que vamos descendo, vamos comprovando a impressão de que se trata de um local de banho, e não apenas uma cascata que se pode visitar pela vista e pela fotografia.
Avistamos a parede da cascata que não é muito alta mas tem uma extensão relativamente grande. A água enche uma pequena enseada, que estreita e converge para um rio, atravessado por uma ponte que liga as duas partes onde as pessoas se estendem ao sol, e onde existem alguns cafés. Alguns tomam banho na água com uma cor esverdeada. Outros trepam as pedras escorregadias e posam para a fotografia com a cascata no fundo.
Descansamos um pouco até fazer o caminho de regresso. Faltam apenas alguns quilómetros até Mostar, uma meia-hora deverá ser suficiente para o trajecto final.
Nos meses de verão, o preço é o equivalente a 5 euros por pessoa. Na bilheteira não aceitam cartão (refrescante) e só temos uma nota de 5 euros. Explicamos e o funcionário, muito simpaticamente, faz um gesto de cagandismo e deixa-nos entrar. Cruzamo-nos com pessoas no sentido inverso – para além de nós, não há ninguém a entrar àquela hora do final da tarde – e, à medida que vamos descendo, vamos comprovando a impressão de que se trata de um local de banho, e não apenas uma cascata que se pode visitar pela vista e pela fotografia.
Avistamos a parede da cascata que não é muito alta mas tem uma extensão relativamente grande. A água enche uma pequena enseada, que estreita e converge para um rio, atravessado por uma ponte que liga as duas partes onde as pessoas se estendem ao sol, e onde existem alguns cafés. Alguns tomam banho na água com uma cor esverdeada. Outros trepam as pedras escorregadias e posam para a fotografia com a cascata no fundo.
Descansamos um pouco até fazer o caminho de regresso. Faltam apenas alguns quilómetros até Mostar, uma meia-hora deverá ser suficiente para o trajecto final.
quinta-feira, 23 de agosto de 2018
Na manhã seguinte, trepamos os cerca de 1500 degraus até à fortaleza que se ergue sobre a vila.
Os degraus são irregulares e não ajudam o processo e o calor não dá tréguas. Lá no alto, turistas transpirados tiram fotografias da vista de cortar a respiração. É a última imagem que registamos do Montenegro: em seguida, descemos a escadaria, fizemos algumas compras para a viagem e seguimos pela estrada que ladeia o lago.
Dado que o desvio que implicaria era pouco significativo, optámos por passar por Dubrovnik, onde poderíamos passar umas horas na cidade, e só depois seguir em direcção à Bósnia. Um dia que, desta forma, incluiria três países. O trajecto correu de acordo com o planeado desde Kotor até à fronteira mas aí tudo se complicou. A saída do Montenegro foi um pouco demorada mas o pior ainda estava para vir. A fila comprida de carros para entrar na Croácia era muito lenta. De motor desligado, as pessoas começaram a sair para apanhar ar e tentar perceber a razão da demora. Quando nos aproximámos das cabines dos guardas, fomos instruídos indelicadamente a regressar e esperar no carro. Nem ao pedido de uma casa-de-banho acederam.
Quando finalmente atravessámos a fronteira, já tinham decorrido duas preciosas horas, aquelas que estavam previstas para passear um pouco em Dubrovnik. Depois de uma paragem estratégica à beira da estrada para resolver assuntos inadiáveis, seguimos rapidamente mas limitámo-nos a passar ao lado da cidade. Não muito depois, à medida que nos afastámos da costa, a qualidade das estradas piora, mais estreitas e com curvas.
O posto fronteiriço dificilmente poderia ser mais diferente do que aquele pelo qual entrámos na Croácia. À nossa frente, não há mais nenhum carro e está um pré-fabricado. Lá dentro está um guarda que conversa com outras pessoas que também estão no cubículo. Sem interromper a conversa, recebe os documentos, processa a informação, e devolve-me-os.
Poucos metros (talvez 10?) à frente, há um segundo pré-fabricado que parece ser o homólogo da Bósnia. No entanto, parece fechado e ninguém aparece para nos receber. Decidimos avançar lentamente.
Dado que o desvio que implicaria era pouco significativo, optámos por passar por Dubrovnik, onde poderíamos passar umas horas na cidade, e só depois seguir em direcção à Bósnia. Um dia que, desta forma, incluiria três países. O trajecto correu de acordo com o planeado desde Kotor até à fronteira mas aí tudo se complicou. A saída do Montenegro foi um pouco demorada mas o pior ainda estava para vir. A fila comprida de carros para entrar na Croácia era muito lenta. De motor desligado, as pessoas começaram a sair para apanhar ar e tentar perceber a razão da demora. Quando nos aproximámos das cabines dos guardas, fomos instruídos indelicadamente a regressar e esperar no carro. Nem ao pedido de uma casa-de-banho acederam.
Quando finalmente atravessámos a fronteira, já tinham decorrido duas preciosas horas, aquelas que estavam previstas para passear um pouco em Dubrovnik. Depois de uma paragem estratégica à beira da estrada para resolver assuntos inadiáveis, seguimos rapidamente mas limitámo-nos a passar ao lado da cidade. Não muito depois, à medida que nos afastámos da costa, a qualidade das estradas piora, mais estreitas e com curvas.
O posto fronteiriço dificilmente poderia ser mais diferente do que aquele pelo qual entrámos na Croácia. À nossa frente, não há mais nenhum carro e está um pré-fabricado. Lá dentro está um guarda que conversa com outras pessoas que também estão no cubículo. Sem interromper a conversa, recebe os documentos, processa a informação, e devolve-me-os.
Poucos metros (talvez 10?) à frente, há um segundo pré-fabricado que parece ser o homólogo da Bósnia. No entanto, parece fechado e ninguém aparece para nos receber. Decidimos avançar lentamente.
quarta-feira, 22 de agosto de 2018
Fazemos um desvio para passar no parque natural do largo Skadar.
Percorremos uma estrada de cabras que nos leva até àquela que é porventura a imagem mais emblemática destas paragens: a “horseshoe bend”, uma curva do Rijeka Crnojevica, à semelhança da famosa curvatura do rio Colorado. Paramos o carro e saímos para tirar fotografias. Um barco percorre lentamente as águas do rio. As nuvens encobrem o sol e a cor não é ideal mas, pouco depois, os primeiros raios começam a ver-se, progressivamente, à medida que o sol se escapa daquela capa cinzenta. A fuga do sol é apenas temporária e a oportunidade de tirar uma fotografia com luz mais favorável não dura muito tempo, a próxima nuvem está mesmo ao lado e caminha rapidamente.
Daqui até Kotor – o fjord mais austral da Europa e único no Mediterrâneo – o percurso é relativamente rápido. O nosso hotel fica do lado oeste do lago, o lado oposto ao da vila. A estrada é bastante apertada e os constantes cruzamentos com outros carros são um castigo. Ao longo dela, são inúmeros os pequenos pontões e outros acessos à água. Como aquele mesmo perto do hotel onde, logo após deixar as malas no quarto com uma vista impressionante, aproveitamos para, de imediato, tomar um banho, ao mesmo tempo que o sol, lentamente, se esconde atrás do enorme rochedo. À noite fazemos os 3 a 4 quilómetros até à vila para jantar dentro das muralhas da povoação.
Daqui até Kotor – o fjord mais austral da Europa e único no Mediterrâneo – o percurso é relativamente rápido. O nosso hotel fica do lado oeste do lago, o lado oposto ao da vila. A estrada é bastante apertada e os constantes cruzamentos com outros carros são um castigo. Ao longo dela, são inúmeros os pequenos pontões e outros acessos à água. Como aquele mesmo perto do hotel onde, logo após deixar as malas no quarto com uma vista impressionante, aproveitamos para, de imediato, tomar um banho, ao mesmo tempo que o sol, lentamente, se esconde atrás do enorme rochedo. À noite fazemos os 3 a 4 quilómetros até à vila para jantar dentro das muralhas da povoação.
terça-feira, 21 de agosto de 2018
As estradas da Riviera Albanesa fazem-nos pagar caro pela vista.
Ziguezagues constantes, subidas e descidas e, claro, camiões lentos de fazer desesperar. E, ao fundo, o mar que, por vezes, ostenta um azul turquesa muito desejável. Outra tirada longa e cansativa, cortada a meio para uma noite perto da lagoa de Narta, para a segunda e última tarde de ripanço. Uma estirada final leva-nos até à capital Tirana.
Uma das principais atracções turísticas da cidade são os antigos bunkers do regime comunista albanês, recentemente abertos ao público. A cerca de 5 quilómetros do centro de Tirana encontra-se o Bunkart 1, o bunker construído para Enver Hoxha e os principais membros do seu regime. O bunker, que acabou por nunca ser usado, é enorme, um longo corredor que ramifica em cerca de meia dúzia de outros corredores. Lá dentro, vemos o quarto reservado a Hoxha, o único com casa-de-banho privativa, assim como um sem número de outros quartos. Nestes, foi construída uma exposição que nos leva aos primórdios do povo albanês, passando pelas invasões do Império Otomano, as guerras mundiais, a ocupação da Itália de Mussolini e, logo a seguir, da Alemanha nazi e, finalmente, ao regime comunista e à sua queda no início da década de 90. O ponto alto é a sala de reuniões, uma autêntica sala de espectáculos subterrânea.
Chove agora copiosamente e é complicado conduzir pelas ruas da cidade no meio da bátega e do trânsito errático. Depois de pararmos o carro no hotel, saímos de impermeável. Estamos apenas a algumas centenas de metros da praça Skanderberg, o centro da cidade, mas o curto trajecto é mais do que suficiente para ficar encharcado. Ao fundo, num dos extremos, está a entrada para o Bunkart 2, o segundo bunker do dia. Este tem uma dimensão menor, foi feito para o Ministro do Interior albanês e a exposição no interior dedica-se ao regime ditactorial comunista. As descrições das escutas, perseguições, torturas são detalhadas e pesadas, em alguns casos, verdadeiros murros no estômago. Pelo meio, também há elementos caricatos da paranoia do regime, como o barbeiro residente no aeroporto, encarregue de cortar cabelos e aparar barbas de estrangeiros que quisessem visitar o país e não apresentassem o decoro capilar necessário.
Para além destes dois bunkers convertidos em museu e preenchidos com exposições, há uma série de outros de menor relevância. No período de bunkerização do país, foram construídos mais de cem mil destas construções subterrâneas oficiais e há quem diga que as não oficiais são bastante mais. Pelo caminho, à beira da estrada, no meio dos campos, vemos, de vez em quando, as características abóbodas de cimento que sinalizam a sua entrada. Uns estão ao abandono, meio destruídos. Outros foram aproveitados e são estabelecimentos, como um que vimos que foi transformado numa loja de tatuagens.
À noite, depois de jantar literalmente à porta de um restaurante, andamos um pouco pelas ruas e passamos pela pirâmide de Tirana, o edifício desenhado pela filha arquitecta de Hoxha, com o intuito de vir a albergar um museu dedicado ao legado do pai, após a sua morte. Inaugurado em 1988, deixou de ser um museu após a queda do regime comunista e foi transformado num centro de conferências. Mais tarde, durante a guerra do Kosovo, chegou a servir de base da NATO. Hoje em dia, está abandonado, de vidros partidos e paredes cheias de graffitis.
Uma das principais atracções turísticas da cidade são os antigos bunkers do regime comunista albanês, recentemente abertos ao público. A cerca de 5 quilómetros do centro de Tirana encontra-se o Bunkart 1, o bunker construído para Enver Hoxha e os principais membros do seu regime. O bunker, que acabou por nunca ser usado, é enorme, um longo corredor que ramifica em cerca de meia dúzia de outros corredores. Lá dentro, vemos o quarto reservado a Hoxha, o único com casa-de-banho privativa, assim como um sem número de outros quartos. Nestes, foi construída uma exposição que nos leva aos primórdios do povo albanês, passando pelas invasões do Império Otomano, as guerras mundiais, a ocupação da Itália de Mussolini e, logo a seguir, da Alemanha nazi e, finalmente, ao regime comunista e à sua queda no início da década de 90. O ponto alto é a sala de reuniões, uma autêntica sala de espectáculos subterrânea.
Chove agora copiosamente e é complicado conduzir pelas ruas da cidade no meio da bátega e do trânsito errático. Depois de pararmos o carro no hotel, saímos de impermeável. Estamos apenas a algumas centenas de metros da praça Skanderberg, o centro da cidade, mas o curto trajecto é mais do que suficiente para ficar encharcado. Ao fundo, num dos extremos, está a entrada para o Bunkart 2, o segundo bunker do dia. Este tem uma dimensão menor, foi feito para o Ministro do Interior albanês e a exposição no interior dedica-se ao regime ditactorial comunista. As descrições das escutas, perseguições, torturas são detalhadas e pesadas, em alguns casos, verdadeiros murros no estômago. Pelo meio, também há elementos caricatos da paranoia do regime, como o barbeiro residente no aeroporto, encarregue de cortar cabelos e aparar barbas de estrangeiros que quisessem visitar o país e não apresentassem o decoro capilar necessário.
Para além destes dois bunkers convertidos em museu e preenchidos com exposições, há uma série de outros de menor relevância. No período de bunkerização do país, foram construídos mais de cem mil destas construções subterrâneas oficiais e há quem diga que as não oficiais são bastante mais. Pelo caminho, à beira da estrada, no meio dos campos, vemos, de vez em quando, as características abóbodas de cimento que sinalizam a sua entrada. Uns estão ao abandono, meio destruídos. Outros foram aproveitados e são estabelecimentos, como um que vimos que foi transformado numa loja de tatuagens.
À noite, depois de jantar literalmente à porta de um restaurante, andamos um pouco pelas ruas e passamos pela pirâmide de Tirana, o edifício desenhado pela filha arquitecta de Hoxha, com o intuito de vir a albergar um museu dedicado ao legado do pai, após a sua morte. Inaugurado em 1988, deixou de ser um museu após a queda do regime comunista e foi transformado num centro de conferências. Mais tarde, durante a guerra do Kosovo, chegou a servir de base da NATO. Hoje em dia, está abandonado, de vidros partidos e paredes cheias de graffitis.
segunda-feira, 20 de agosto de 2018
Ksamil fica numa espécie de península, uma língua de terra muito perto da fronteira com a Grécia.
É também dos poucos locais onde as praias têm areia em vez das pedras que magoam os pés e desafiam o equilíbrio, quais aprendizes de faquir que caminham sobre brasas. Num dos extremos, fica a antiga povoação de Butrint, originalmente grega, mas com mão romana posterior, foi classificada como Património Mundial da UNESCO em 1992. As ruinas incluem um anfiteatro, banhos romanos, capela e basílica, entre outros.
A visita, de manhã, é a única coisa que fazemos de cultural ou produtivo o dia todo. De resto, após o check in no hotel, limitamo-nos a uma merecida espreguiçadeira, bem perto de um mar de cor límpida. Pagamos ao rapaz que rapidamente surge para nos cobrar, depois de alguma conversa a propósito do câmbio que nos quer fazer: não temos a totalidade em leks e quer euros à taxa de 100 leks para 1 euro, quando 80 cêntimos bastariam para os tais 100 leks. Diz-nos que facilita os cálculos; rimo-nos e dizemos-lhe que, curiosamente, também o beneficia.
No café, pergunto se aceitam cartão e a resposta é negativa. Apesar de termos euros, não queremos sujeitar-nos à taxa de câmbio manipulada, pelo que não há outra forma senão dar uma saltada à caixa automática mais próxima, que a empregada nos diz ser a cerca de 10 minutos. Munimo-nos do estritamente suficiente para um almoço ligeiro (uma salada de frango ou atum) que permita continuar a mergulhar sem limitações. Peço um café, não à empregada, que nos atendeu mas a um tipo mais velho. Diz-me o que parece ser que não servem cafés, embora não o tenha entendido exactamente. Quando a empregada passa para levantar os pratos, pedimos-lhe o tal café mas, passado um pouco, quando regressa, diz-nos que a máquina está avariada. Claramente começa a cheirar a esturro.
É o dia da final do Campeonato do Mundo e consideramos a hipótese de nos sentar numa mesa a ver o jogo acompanhado do café que não bebemos ao almoço. Regressamos ao mesmo sítio e procuramos uma mesa livre no mar das que estão ocupadas. Manifestamos a nossa intenção ao dono do estabelecimento e somos, de imediato, rejeitados. Que aquilo são mesas para quem está a comer e não beber, estão a ver alguém a beber em algum sítio? Saímos sem antes o mandar a um determinado sítio.
O empregado do café ao lado mostra-se mais receptivo, embora a única mesa disponível esteja relativamente longe do televisor. Deixamos ali os leks remanescentes enquanto a Croácia empata e os espectadores vão ao rubro, não há a mínima dúvida em relação às preferências. Quando o árbitro faz a indicação de que quer rever as imagens de um lance na área e, logo a seguir, assinala grande penalidade a favor da França, apenas um tipo se levanta a regozijar. Ao intervalo, com o meu copo de frappé vazio, regressamos à espreguiçadeira e ao livro. Na areia com, agora, muito menor densidade populacional, vamos ouvindo as exclamações de sofrimento à medida que a França dilata o resultado e apenas uma alegria temporária aquando do frango de Lloris.
Antecipamos a resistência que certamente também vamos encontrar com o pagamento em cartão para o jantar. No primeiro sítio que vemos, perguntamos ao dono, que nos responde negativamente e acrescenta
Albanian people like to sleep with their money
juntamente com um gesto de quem coloca o dinheiro debaixo da cabeça, a fazer de almofada. Perguntamos em mais uma meia dúzia de locais enquanto descemos a rua até à inevitável caixa automática, só pela piada. Ninguém aceita cartão. Um diz que a máquina está avariada. Optamos pelo primeiro apenas porque teve a resposta mais gira. E optamos bem porque acabamos por jantar bastante bem.
A visita, de manhã, é a única coisa que fazemos de cultural ou produtivo o dia todo. De resto, após o check in no hotel, limitamo-nos a uma merecida espreguiçadeira, bem perto de um mar de cor límpida. Pagamos ao rapaz que rapidamente surge para nos cobrar, depois de alguma conversa a propósito do câmbio que nos quer fazer: não temos a totalidade em leks e quer euros à taxa de 100 leks para 1 euro, quando 80 cêntimos bastariam para os tais 100 leks. Diz-nos que facilita os cálculos; rimo-nos e dizemos-lhe que, curiosamente, também o beneficia.
No café, pergunto se aceitam cartão e a resposta é negativa. Apesar de termos euros, não queremos sujeitar-nos à taxa de câmbio manipulada, pelo que não há outra forma senão dar uma saltada à caixa automática mais próxima, que a empregada nos diz ser a cerca de 10 minutos. Munimo-nos do estritamente suficiente para um almoço ligeiro (uma salada de frango ou atum) que permita continuar a mergulhar sem limitações. Peço um café, não à empregada, que nos atendeu mas a um tipo mais velho. Diz-me o que parece ser que não servem cafés, embora não o tenha entendido exactamente. Quando a empregada passa para levantar os pratos, pedimos-lhe o tal café mas, passado um pouco, quando regressa, diz-nos que a máquina está avariada. Claramente começa a cheirar a esturro.
É o dia da final do Campeonato do Mundo e consideramos a hipótese de nos sentar numa mesa a ver o jogo acompanhado do café que não bebemos ao almoço. Regressamos ao mesmo sítio e procuramos uma mesa livre no mar das que estão ocupadas. Manifestamos a nossa intenção ao dono do estabelecimento e somos, de imediato, rejeitados. Que aquilo são mesas para quem está a comer e não beber, estão a ver alguém a beber em algum sítio? Saímos sem antes o mandar a um determinado sítio.
O empregado do café ao lado mostra-se mais receptivo, embora a única mesa disponível esteja relativamente longe do televisor. Deixamos ali os leks remanescentes enquanto a Croácia empata e os espectadores vão ao rubro, não há a mínima dúvida em relação às preferências. Quando o árbitro faz a indicação de que quer rever as imagens de um lance na área e, logo a seguir, assinala grande penalidade a favor da França, apenas um tipo se levanta a regozijar. Ao intervalo, com o meu copo de frappé vazio, regressamos à espreguiçadeira e ao livro. Na areia com, agora, muito menor densidade populacional, vamos ouvindo as exclamações de sofrimento à medida que a França dilata o resultado e apenas uma alegria temporária aquando do frango de Lloris.
Antecipamos a resistência que certamente também vamos encontrar com o pagamento em cartão para o jantar. No primeiro sítio que vemos, perguntamos ao dono, que nos responde negativamente e acrescenta
Albanian people like to sleep with their money
juntamente com um gesto de quem coloca o dinheiro debaixo da cabeça, a fazer de almofada. Perguntamos em mais uma meia dúzia de locais enquanto descemos a rua até à inevitável caixa automática, só pela piada. Ninguém aceita cartão. Um diz que a máquina está avariada. Optamos pelo primeiro apenas porque teve a resposta mais gira. E optamos bem porque acabamos por jantar bastante bem.
domingo, 19 de agosto de 2018
A praia é mesmo ao lado do hotel.
Um paredão com cadeiras e espreguiçadeiras e escadas de metal para aceder à água, como se fosse uma piscina. Está bastante vento e a aquela (chamemos-lhe) praia desprovida de areal ganha contornos muito pouco convidativos. Já para não dizer que a viagem entre o lago de Ohrid e Saranda, mais de seis horas para cerca de 300 kms, teve o seu desgaste: várias vezes fomos enviados pelo Google para caminhos sem saída ou estradas ao abandono; outras tantas, não reconheceu a existência de estradas que, manifestamente (juro!), existem.
Subimos até ao terceiro andar, uma vez mais sem um elevador que nos ajude com as malas, para o quarto com uma varanda virada para a varanda do prédio da frente – num canto, dá para ver um pouco da assim-designada praia. A casa de banho é mínima, o chuveiro é tão pequeno que seria impossível ter porta; nem sequer cortinado tem, o esforço de evitar encharcar o chão é a definição de inglório.
Com desejos de peixe, não satisfeitos pela oferta nas zonas servidas pelo lago – trutas, carpas e pouco mais, espécies que não aguçam muito o olho – aproveitamos o facto de estar na primeira zona costeira da viagem. O restaurante com a melhor classificação no trip advisor é um estabelecimento pequenino, familiar, com uma meia dúzia de mesas de duas pessoas, na rua, que quase bloqueiam o passeio. Dois casais de turistas, com pinta de alemães, terminam a refeição. O menu é curto e grosso. Pedimos uma dose de camarões, polvo e, supostamente, apenas uma dourada. Mas quando, após os primeiros pratos, o senhor aparece com dois pratos de dourada, sou incapaz de dizer que não.
Subimos até ao terceiro andar, uma vez mais sem um elevador que nos ajude com as malas, para o quarto com uma varanda virada para a varanda do prédio da frente – num canto, dá para ver um pouco da assim-designada praia. A casa de banho é mínima, o chuveiro é tão pequeno que seria impossível ter porta; nem sequer cortinado tem, o esforço de evitar encharcar o chão é a definição de inglório.
Com desejos de peixe, não satisfeitos pela oferta nas zonas servidas pelo lago – trutas, carpas e pouco mais, espécies que não aguçam muito o olho – aproveitamos o facto de estar na primeira zona costeira da viagem. O restaurante com a melhor classificação no trip advisor é um estabelecimento pequenino, familiar, com uma meia dúzia de mesas de duas pessoas, na rua, que quase bloqueiam o passeio. Dois casais de turistas, com pinta de alemães, terminam a refeição. O menu é curto e grosso. Pedimos uma dose de camarões, polvo e, supostamente, apenas uma dourada. Mas quando, após os primeiros pratos, o senhor aparece com dois pratos de dourada, sou incapaz de dizer que não.
sábado, 18 de agosto de 2018
Quando regressamos ao hotel, o televisor está ligado num canal onde estão a transmitir a primeira meia-final de Wimbledon.
O sul-africano Kevin Anderson e o americano John Isner disparam ases uns atrás dos outros. Sento-me nas cadeiras do lobby a ver o jogo e o funcionário da recepção vem ter comigo e pergunta-me se quero ver o jogo lá fora, na esplanada. Digo-lhe que sim e ele liga o televisor só para mim. Ficamos um pouco à conversa. Está, como eu, à espera da meia-final seguinte entre o Djokovic e o Nadal, e não propriamente interessado neste jogo aborrecido que, ainda por cima, havia de se prolongar por várias horas.
Está a torcer pelo sérvio, quer vê-lo regressar à forma que o levou a número um mundial e que lhe tem escapado nos últimos dois anos. Pergunto-lhe se é comum que as pessoas ali apoiem um sérvio e ele diz-me que sim, que sem dúvida sentem a proximidade e a comunhão com os restantes povos,
My father lived 40 years in Yugoslavia.
Pergunto-lhe se o sentimento é extensível ao futebol e à Croácia e responde que também. E, em relação à Croácia, fala-me também de Goran Ivanisevic, o jogador excêntrico, que surgiu nos anos 90 e acabou por conseguir ganhar em Wimbledon em 2001.
É ele que, após o nosso merecido duche, nos aconselha alguns restaurantes e, mais importante, nos põe ao telefone com alguém que organiza voos de parapente. Depois de alguma negociação ao telefone, agendamos para o dia seguinte às 9h00, hora a que nos apanham no hotel. Daí conduzem-nos até um local diferente do que havíamos combinado, que deixa de ser opção dadas as condições do vento.
Segue-se uma breve palestra de informação e segurança e a distribuição por cada um dos pilotos profissionais
When I tell you, you run
diz-me Goran, que ficou encarregue de me levar. Perguntamos-lhe se aprendeu a voar a ver uns tutorials no youtube na noite anterior. Ri-se
My friend, 22 years
Muitos anos de voo.
Ready?
E prende o meu arnês à estrutura da asa. À instrução dele, tento correr, lutando contra a força da asa, até sentir que os pés já não estão no chão e, de repente, estamos a voar. Permanecemos talvez 15 minutos no ar, não temos a sorte do parapente que vai à nossa frente, que se farta de apanhar térmicas e ganhar altitude.
Finda a aventura, somos conduzidos novamente até ao hotel. Pelo caminho, quando lhes dizemos o trajecto que já fizemos até agora e o que ainda nos falta fazer, dão-nos algumas dicas sobre a Albânia. Mas também advertências, a principal das quais é em relação à condução dos albaneses.
Albanians are strange, they are a strange people
Está a torcer pelo sérvio, quer vê-lo regressar à forma que o levou a número um mundial e que lhe tem escapado nos últimos dois anos. Pergunto-lhe se é comum que as pessoas ali apoiem um sérvio e ele diz-me que sim, que sem dúvida sentem a proximidade e a comunhão com os restantes povos,
My father lived 40 years in Yugoslavia.
Pergunto-lhe se o sentimento é extensível ao futebol e à Croácia e responde que também. E, em relação à Croácia, fala-me também de Goran Ivanisevic, o jogador excêntrico, que surgiu nos anos 90 e acabou por conseguir ganhar em Wimbledon em 2001.
É ele que, após o nosso merecido duche, nos aconselha alguns restaurantes e, mais importante, nos põe ao telefone com alguém que organiza voos de parapente. Depois de alguma negociação ao telefone, agendamos para o dia seguinte às 9h00, hora a que nos apanham no hotel. Daí conduzem-nos até um local diferente do que havíamos combinado, que deixa de ser opção dadas as condições do vento.
Segue-se uma breve palestra de informação e segurança e a distribuição por cada um dos pilotos profissionais
When I tell you, you run
diz-me Goran, que ficou encarregue de me levar. Perguntamos-lhe se aprendeu a voar a ver uns tutorials no youtube na noite anterior. Ri-se
My friend, 22 years
Muitos anos de voo.
Ready?
E prende o meu arnês à estrutura da asa. À instrução dele, tento correr, lutando contra a força da asa, até sentir que os pés já não estão no chão e, de repente, estamos a voar. Permanecemos talvez 15 minutos no ar, não temos a sorte do parapente que vai à nossa frente, que se farta de apanhar térmicas e ganhar altitude.
Finda a aventura, somos conduzidos novamente até ao hotel. Pelo caminho, quando lhes dizemos o trajecto que já fizemos até agora e o que ainda nos falta fazer, dão-nos algumas dicas sobre a Albânia. Mas também advertências, a principal das quais é em relação à condução dos albaneses.
Albanians are strange, they are a strange people
sexta-feira, 17 de agosto de 2018
No local que nos indicaram no hotel não se avista catamaran nenhum.
Apenas uns barcos mais rudimentares, de pescadores convertidos em taxistas aquáticos, mas um pouco distantes do sítio exacto. Sentamo-nos um pouco à espera, que acaba por ser curta. Pouco depois das 8h, vemos o pequeno catamaran, lentamente, aproximar-se do paredão até parar para que subamos a bordo.
O skipper chama-se Nicola. Veste uma camisola de manga cava amarela, que expõe uns braços avermelhados da intensidade do sol, e uns calções de uma cor muito parecida à dos braços queimados. Dentro do catamaran há outras duas famílias – pai, mãe e dois filhos, cada. Fazemos ainda outra paragem para recolher mãe e filha holandesas e estamos prontos a seguir caminho.
O rádio dispara música energética e Nicola, apesar do aspecto seco, parece estar bem disposto. Convida os miúdos, um pouco atónitos, a sentar-se ao volante do barco e a comandar os nossos destinos. Depois, aproxima-se de um dos outros catamarans que fazem o mesmo percurso para pedir uma garrafa que lhe é prontamente arremessada para as mãos. Serve, aos adultos, um pequeno copo de plástico de uma bebida, cujo sabor é parecido ao do whisky, e que, àquela hora da manhã, custa um pouco a mandar abaixo.
O primeiro destino é a Baía dos Ossos, na qual se encontra uma reconstituição de antigas povoações, que foram erigidas dentro do lago, com recurso a casas sobre estacas. Aliás, as estacas suportam uma estrutura rectangular, que faz de chão e sob a qual, por sua vez as habitações se encontram.
Mais à frente paramos num pequeno mosteiro, local onde aproveitamos para o primeiro mergulho do dia. Ainda a pingar, regressamos ao barco para nos dirigirmos ao Mosteiro de Saint Naum. Aqui, depois de visitar o mosteiro, ficamos algumas horas, na praia, até chegar a hora do regresso. Lá no alto, vemos um grupo a pairar de parapente. No trajecto, numa zona de águas calmas algures a meio do lago, paramos para mais um mergulho.
O skipper chama-se Nicola. Veste uma camisola de manga cava amarela, que expõe uns braços avermelhados da intensidade do sol, e uns calções de uma cor muito parecida à dos braços queimados. Dentro do catamaran há outras duas famílias – pai, mãe e dois filhos, cada. Fazemos ainda outra paragem para recolher mãe e filha holandesas e estamos prontos a seguir caminho.
O rádio dispara música energética e Nicola, apesar do aspecto seco, parece estar bem disposto. Convida os miúdos, um pouco atónitos, a sentar-se ao volante do barco e a comandar os nossos destinos. Depois, aproxima-se de um dos outros catamarans que fazem o mesmo percurso para pedir uma garrafa que lhe é prontamente arremessada para as mãos. Serve, aos adultos, um pequeno copo de plástico de uma bebida, cujo sabor é parecido ao do whisky, e que, àquela hora da manhã, custa um pouco a mandar abaixo.
O primeiro destino é a Baía dos Ossos, na qual se encontra uma reconstituição de antigas povoações, que foram erigidas dentro do lago, com recurso a casas sobre estacas. Aliás, as estacas suportam uma estrutura rectangular, que faz de chão e sob a qual, por sua vez as habitações se encontram.
Mais à frente paramos num pequeno mosteiro, local onde aproveitamos para o primeiro mergulho do dia. Ainda a pingar, regressamos ao barco para nos dirigirmos ao Mosteiro de Saint Naum. Aqui, depois de visitar o mosteiro, ficamos algumas horas, na praia, até chegar a hora do regresso. Lá no alto, vemos um grupo a pairar de parapente. No trajecto, numa zona de águas calmas algures a meio do lago, paramos para mais um mergulho.
quinta-feira, 16 de agosto de 2018
O condutor provou-me errado:
afinal ainda era possível levar mais pessoas naquela mini-van onde, aos meus olhos, não cabia nem mais uma ervilha. Primeiro uma senhora que se sentou no degrau ao fundo do corredor, antes da última fila de bancos. Um senhor de ficou de pé no corredor e um jovem acabou a partilhar banco com um dos passageiros que, gentilmente, lhe ofereceu parte do seu.
Pelo caminho, uma folha é posta a circular pelos passageiros para que escrevam os nomes e números de passaporte. Mesmo assim, as formalidades na fronteira são morosas. Os guardas recolhem os passaportes de todos, entram no posto e demoram a regressar e devolver os passaportes carimbados.
Chegamos à estação de autocarros cerca de duas hora e meia depois. O caminho em direcção ao centro da cidade faz-se pelo meio de um bairro habitacional, que vai desembocar a uma avenida movimentada, com várias lojas. Seguimos por essa avenida até nos depararmos com um primeiro ex libris: a estátua de um Bill Clinton sorridente, que acena com uma mão e, com a outra, segura um livro. Ao lado uma bandeira dos EUA. Ao fundo, prédios coloridos, velhos, sujos. Só depois de fotografar a estátua, vejo que avenida recebeu o nome do ex-presidente americano.
A próxima paragem, um pouco mais à frente, depois de um pequeno jardim, é a biblioteca universitária de Pristina, considerada, em alguns fóruns online, como um dos edifícios mais feios do mundo. Não muito longe, uma avenida pedonal repleta de esplanadas onde, ao fundo, crianças de fato-de-banho brincam nuns repuxos de água.
Quando damos por nós, estamos sentados a beber um café numa esplanada perto de um símbolo do território: um letreiro com letras metálicas bem grandes, que formam a palavra “newborn” e que, a propósito dos 10 anos da declaração unilateral de independência, foi alterado para new10rn”. Consultamos os horários de regresso a Skopje. Temos um autocarro dentro de meia hora. Consultamos o Google maps que calcula a duração do percurso a pé até à estação em meia-hora. Pagamos rapidamente e largamos a correr.
Compramos os bilhetes e dirigimo-nos à plataforma com um misto de expectativa e receio em relação ao que vamos encontrar. Desta vez, sentamo-nos num autocarro bastante maior mas também bastante mais velho, sem ar condicionado. Felizmente vai quase vazio, apenas alguns passageiros para além de nós. Por cima da porta, as indicações do número de lugares sentados e em pé estão em francês.
A agressividade do condutor não inspira grande confiança. Para além das inúmeras chamadas que atende ao longo do caminho, por vezes resolve observar as actualizações no Facebook. Quando já estamos perto da cidade, pára numa estação de serviço para abastecer. Deixa o veículo com o motor ligado e sai. Regressa já depois do abastecimento estar feito, traz dois sacos de compras na mão.
Mais à frente, o trânsito começa a adensar. Falam entre eles, calculamos que tenha acontecido qualquer coisa. Explicam-nos: há uma greve dos taxistas que está a gerar o pandemónio. Chegam à conclusão que não vale a pena insistir em chegar à estação de autocarros, que será mais fácil sairmos antes e fazer o percurso a pé. Ainda antes de sair, vemos um velhote num carro a tentar entrar numa estrada em contramão, a partir da saída. Um dos tipos atrás
Macedonia, ok
e rimo-nos. Saímos e, simpaticamente, dão-nos as indicações para regressarmos ao centro da cidade.
Pelo caminho, uma folha é posta a circular pelos passageiros para que escrevam os nomes e números de passaporte. Mesmo assim, as formalidades na fronteira são morosas. Os guardas recolhem os passaportes de todos, entram no posto e demoram a regressar e devolver os passaportes carimbados.
Chegamos à estação de autocarros cerca de duas hora e meia depois. O caminho em direcção ao centro da cidade faz-se pelo meio de um bairro habitacional, que vai desembocar a uma avenida movimentada, com várias lojas. Seguimos por essa avenida até nos depararmos com um primeiro ex libris: a estátua de um Bill Clinton sorridente, que acena com uma mão e, com a outra, segura um livro. Ao lado uma bandeira dos EUA. Ao fundo, prédios coloridos, velhos, sujos. Só depois de fotografar a estátua, vejo que avenida recebeu o nome do ex-presidente americano.
A próxima paragem, um pouco mais à frente, depois de um pequeno jardim, é a biblioteca universitária de Pristina, considerada, em alguns fóruns online, como um dos edifícios mais feios do mundo. Não muito longe, uma avenida pedonal repleta de esplanadas onde, ao fundo, crianças de fato-de-banho brincam nuns repuxos de água.
Quando damos por nós, estamos sentados a beber um café numa esplanada perto de um símbolo do território: um letreiro com letras metálicas bem grandes, que formam a palavra “newborn” e que, a propósito dos 10 anos da declaração unilateral de independência, foi alterado para new10rn”. Consultamos os horários de regresso a Skopje. Temos um autocarro dentro de meia hora. Consultamos o Google maps que calcula a duração do percurso a pé até à estação em meia-hora. Pagamos rapidamente e largamos a correr.
Compramos os bilhetes e dirigimo-nos à plataforma com um misto de expectativa e receio em relação ao que vamos encontrar. Desta vez, sentamo-nos num autocarro bastante maior mas também bastante mais velho, sem ar condicionado. Felizmente vai quase vazio, apenas alguns passageiros para além de nós. Por cima da porta, as indicações do número de lugares sentados e em pé estão em francês.
A agressividade do condutor não inspira grande confiança. Para além das inúmeras chamadas que atende ao longo do caminho, por vezes resolve observar as actualizações no Facebook. Quando já estamos perto da cidade, pára numa estação de serviço para abastecer. Deixa o veículo com o motor ligado e sai. Regressa já depois do abastecimento estar feito, traz dois sacos de compras na mão.
Mais à frente, o trânsito começa a adensar. Falam entre eles, calculamos que tenha acontecido qualquer coisa. Explicam-nos: há uma greve dos taxistas que está a gerar o pandemónio. Chegam à conclusão que não vale a pena insistir em chegar à estação de autocarros, que será mais fácil sairmos antes e fazer o percurso a pé. Ainda antes de sair, vemos um velhote num carro a tentar entrar numa estrada em contramão, a partir da saída. Um dos tipos atrás
Macedonia, ok
e rimo-nos. Saímos e, simpaticamente, dão-nos as indicações para regressarmos ao centro da cidade.
quarta-feira, 15 de agosto de 2018
Ainda não são 7h30 quando desço e peço, na recepção do hotel, para chamarem o táxi.
A hora que nos tinham dito no dia anterior que seria mais do que suficiente, uma vez que a viagem até à estação não demoraria mais de 10 minutos e já tínhamos comprado os bilhetes. A funcionária de cabelo curto apanhado demora um pouco até começar a mover-se languidamente para ir buscar o telefone. Depois, por azar, a primeira tentativa que faz revela-se infrutífera: a empresa não tem táxis disponíveis. Explica-me o sucedido e enceta uma segunda tentativa, enquanto os minutos continuam a passar e passam mesmo alguns até finalmente confirmar que está um táxi a caminho.
Passam outros tantos até ouvirmos o ruído de um veículo e é ela mesmo que nos diz que o táxi deverá ter chegado. E, de facto, vemos um táxi à saída do hotel mas, quando me dirijo para ele e começo a falar com o taxista, vejo-o a carregar uma mala e, logo em seguida, ser ocupado por uma senhora. O nosso táxi só virá um pouco depois e, por esta altura, começa a parecer muito à tangente face às 8h a que parte o nosso autocarro.
Para complicar ainda mais contas, os tais dez minutos que deveria demorar o trajecto até à estação de autocarros acabam por durar mais. Nesta altura já dizemos mal às nossas vidas e criticamo-nos por acreditar nas estimativas temporais realizadas nestas bandas que, invariavelmente, acabam por se revelar erradas e sempre no sentido da subestimação.
São 7h58 quando abro a porta do táxi e me lanço num sprint pela estação a dentro. O tipo que controla a entrada mediante a verificação dos bilhetes é sensível à nossa pressa e limita-se a indicar-nos o caminho após lhe termos dito o nosso destino. Quando vejo a plataforma 1 e uma mini-van onde esperaria ver um autocarro fico, por um curto instante, um pouco desnorteado. O condutor lá de dentro
Prí-ch-tina?
e eu digo-lhe que sim e ele faz-me sinal para entrar. Mas lá dentro está tudo cheio, a mini-van deve ter uns doze lugares e já só sobra o banco que se abre nas costas dos bancos da frente, virado para o corredor, como os assentos dos membros da tripulação dos aviões. É neste banco e no último disponível dos dois da frente que nos sentamos e, muito pouco depois, a mini-van arranca, com o som embalador do ar condicionado a fazer-se ouvir.
Passam outros tantos até ouvirmos o ruído de um veículo e é ela mesmo que nos diz que o táxi deverá ter chegado. E, de facto, vemos um táxi à saída do hotel mas, quando me dirijo para ele e começo a falar com o taxista, vejo-o a carregar uma mala e, logo em seguida, ser ocupado por uma senhora. O nosso táxi só virá um pouco depois e, por esta altura, começa a parecer muito à tangente face às 8h a que parte o nosso autocarro.
Para complicar ainda mais contas, os tais dez minutos que deveria demorar o trajecto até à estação de autocarros acabam por durar mais. Nesta altura já dizemos mal às nossas vidas e criticamo-nos por acreditar nas estimativas temporais realizadas nestas bandas que, invariavelmente, acabam por se revelar erradas e sempre no sentido da subestimação.
São 7h58 quando abro a porta do táxi e me lanço num sprint pela estação a dentro. O tipo que controla a entrada mediante a verificação dos bilhetes é sensível à nossa pressa e limita-se a indicar-nos o caminho após lhe termos dito o nosso destino. Quando vejo a plataforma 1 e uma mini-van onde esperaria ver um autocarro fico, por um curto instante, um pouco desnorteado. O condutor lá de dentro
Prí-ch-tina?
e eu digo-lhe que sim e ele faz-me sinal para entrar. Mas lá dentro está tudo cheio, a mini-van deve ter uns doze lugares e já só sobra o banco que se abre nas costas dos bancos da frente, virado para o corredor, como os assentos dos membros da tripulação dos aviões. É neste banco e no último disponível dos dois da frente que nos sentamos e, muito pouco depois, a mini-van arranca, com o som embalador do ar condicionado a fazer-se ouvir.
terça-feira, 14 de agosto de 2018
Barrigudo e de sorriso na cara, cumprimenta-nos com o “dobro den” da praxe.
Entrego-lhe os passaportes e os documentos do carro. Olha alguns segundos e, antes de me os devolver, diz três palavras
Portugal football out
Respondemos-lhe – seguindo a mesma lógica de debitar algumas palavras sem grande consideração para com a construção frásica – que sim, que foi demasiado cedo, com uma cara de “que é que se há-de fazer?”. Seguimos caminho por estradas onde as placas estão escritas em cirílico, alfabeto latino e em albanês
É difícil colocar Skopje (recuso-me a escrever Escópia) numa dada gaveta, arrumá-la numa determinada prateleira. Não se parece com nada que conheça. Não tem as características das cidades europeias, seja as dos países de leste que lhe são mais próximos, seja das mais ocidentais. Mas também não é uma cidade de um país muçulmano, apesar das mesquitas. Deixa-me uma impressão quase inconsequente: sem nunca ter estado num desses países, remete-me (como se fosse possível) para as cidades da ex-repúblicas soviéticas.
Ao longo do rio de aspecto muito pouco convidativo, são vários os bares e restaurantes com boa pinta e aspecto internacional. À noite, estão a rebentar pelas costuras e é difícil arranjar uma mesa sem reserva. Durante a refeição, pedintes, maioritariamente de etnia cigana, tocam-me no braço e estendem a mão até ser corridos pelos empregados. Aqui assistimos à meia final entre a Croácia e a Inglaterra e a esmagadora maioria dos clientes feitos espectadores torceu pela equipa de camisola aos quadrados.
Portugal football out
Respondemos-lhe – seguindo a mesma lógica de debitar algumas palavras sem grande consideração para com a construção frásica – que sim, que foi demasiado cedo, com uma cara de “que é que se há-de fazer?”. Seguimos caminho por estradas onde as placas estão escritas em cirílico, alfabeto latino e em albanês
É difícil colocar Skopje (recuso-me a escrever Escópia) numa dada gaveta, arrumá-la numa determinada prateleira. Não se parece com nada que conheça. Não tem as características das cidades europeias, seja as dos países de leste que lhe são mais próximos, seja das mais ocidentais. Mas também não é uma cidade de um país muçulmano, apesar das mesquitas. Deixa-me uma impressão quase inconsequente: sem nunca ter estado num desses países, remete-me (como se fosse possível) para as cidades da ex-repúblicas soviéticas.
Ao longo do rio de aspecto muito pouco convidativo, são vários os bares e restaurantes com boa pinta e aspecto internacional. À noite, estão a rebentar pelas costuras e é difícil arranjar uma mesa sem reserva. Durante a refeição, pedintes, maioritariamente de etnia cigana, tocam-me no braço e estendem a mão até ser corridos pelos empregados. Aqui assistimos à meia final entre a Croácia e a Inglaterra e a esmagadora maioria dos clientes feitos espectadores torceu pela equipa de camisola aos quadrados.
segunda-feira, 13 de agosto de 2018
Paramos o carro numa rua muito perto do hotel, cansados de uma espera de mais de uma hora para completar os trâmites na fronteira.
O quarto ainda não estava pronto, deixamos as malas com a recepcionista, de unhas roídas bem rente, e, depois de lhe dizermos onde temos o carro, indica-nos um parque de estacionamento com o qual o hotel tem um acordo. Quando saímos novamente, a rua onde o carro está parado está intransitável: uma conduta de água deve ter rebentado e um carro dos bombeiros está a bloquear o cruzamento ao fundo, enquanto tentam resolver o problema.
Resolvemos beber um café enquanto esperamos que o problema seja resolvido, depois de abordar os trabalhadores e lhes perguntar uma estimativa de tempo para a resolução. Descemos um pouco por uma rua pedonal onde, após algumas tentativas, nos sentamos.
Não passou muito tempo (meia hora, três quartos de hora) até regressarmos novamente. A rua já está novamente aberta mas, ao nos aproximarmos do carro, vemos um papelinho preso no limpa para-brisas, a sacudir com o vento e, pior ainda, a roda dianteira do lado do condutor bloqueada.
Voltamos à recepcionista do hotel que, quando vê o papel, resolve fazer a advertência, ligeiramente tardia, de que, naquela rua, não se pode estacionar e que a EMEL local é particularmente atenta. Pedimos-lhe que ligue para o número indicado para virem desbloquear o carro e ficamos à espera.
Poucos minutos depois (dez, quinze), surgem dois carros, donde saem uns tipos de coletes com a inscrição do organismo ou instituição para a qual trabalham, e pedem os 30 lev (ou 15 euros) da multa para soltarem a roda do carro. Explicamos (ou pelo menos tentamos) que a rua estava bloqueada e, por isso, deixámos o carro ali.
Totalmente escusado. Entre barreiras linguísticas e alguma má vontade, ficamos num beco sem saída. Oferecem-nos um número para o qual podemos ligar e fazer a nossa queixa em inglês. Desistimos e cedemos os 15 euros. Desbloqueiam a roda e desaparecem rapidamente, visivelmente irritados com a nossa contestação.
No hotel, o quarto já está arranjado mas esqueceram-nos de nos deixar toalhas. Ouve-se o som das empregadas de limpeza no corredor mas só se vê o carrinho por perto. Aproveitamos para nos servir das toalhas, à discrição, incluindo uma que segue caminho para a viagem, e que virá a dar muito jeito nos dias de praia (está aqui em casa).
A visita pela cidade é polvilhada com uma chuva miudinha, que acalma o calor do dia. O tempo encoberto enche as fotografias da catedral com a tristeza monótona do tom cinzento do céu. Terminamos o dia num restaurante onde cometemos o erro de pedir um gin tónico: recebemos um copo com pouco gelo e algum gin no fundo e uma lata de água tónica para misturar a gosto.
No dia seguinte, passamos pelo supermercado para abastecer para a viagem. O caixa faz-nos um sorriso desdentado e castanho e pergunta-nos donde somos. Assim que respondemos
Tudo bem?
com um sotaque engraçado. De imediato a conversa vai para o futebol e confessa-se fã do Sporting. À menção dos nomes de alguns búlgaros que passaram e se notabilizaram no clube, faz uma cara séria e estende a mão para um cumprimento.
Resolvemos beber um café enquanto esperamos que o problema seja resolvido, depois de abordar os trabalhadores e lhes perguntar uma estimativa de tempo para a resolução. Descemos um pouco por uma rua pedonal onde, após algumas tentativas, nos sentamos.
Não passou muito tempo (meia hora, três quartos de hora) até regressarmos novamente. A rua já está novamente aberta mas, ao nos aproximarmos do carro, vemos um papelinho preso no limpa para-brisas, a sacudir com o vento e, pior ainda, a roda dianteira do lado do condutor bloqueada.
Voltamos à recepcionista do hotel que, quando vê o papel, resolve fazer a advertência, ligeiramente tardia, de que, naquela rua, não se pode estacionar e que a EMEL local é particularmente atenta. Pedimos-lhe que ligue para o número indicado para virem desbloquear o carro e ficamos à espera.
Poucos minutos depois (dez, quinze), surgem dois carros, donde saem uns tipos de coletes com a inscrição do organismo ou instituição para a qual trabalham, e pedem os 30 lev (ou 15 euros) da multa para soltarem a roda do carro. Explicamos (ou pelo menos tentamos) que a rua estava bloqueada e, por isso, deixámos o carro ali.
Totalmente escusado. Entre barreiras linguísticas e alguma má vontade, ficamos num beco sem saída. Oferecem-nos um número para o qual podemos ligar e fazer a nossa queixa em inglês. Desistimos e cedemos os 15 euros. Desbloqueiam a roda e desaparecem rapidamente, visivelmente irritados com a nossa contestação.
No hotel, o quarto já está arranjado mas esqueceram-nos de nos deixar toalhas. Ouve-se o som das empregadas de limpeza no corredor mas só se vê o carrinho por perto. Aproveitamos para nos servir das toalhas, à discrição, incluindo uma que segue caminho para a viagem, e que virá a dar muito jeito nos dias de praia (está aqui em casa).
A visita pela cidade é polvilhada com uma chuva miudinha, que acalma o calor do dia. O tempo encoberto enche as fotografias da catedral com a tristeza monótona do tom cinzento do céu. Terminamos o dia num restaurante onde cometemos o erro de pedir um gin tónico: recebemos um copo com pouco gelo e algum gin no fundo e uma lata de água tónica para misturar a gosto.
No dia seguinte, passamos pelo supermercado para abastecer para a viagem. O caixa faz-nos um sorriso desdentado e castanho e pergunta-nos donde somos. Assim que respondemos
Tudo bem?
com um sotaque engraçado. De imediato a conversa vai para o futebol e confessa-se fã do Sporting. À menção dos nomes de alguns búlgaros que passaram e se notabilizaram no clube, faz uma cara séria e estende a mão para um cumprimento.
domingo, 12 de agosto de 2018
Mentalizámo-nos que precisávamos de uma forma alternativa de ir ao Kosovo, à medida que a caixa do meu email se foi enchendo de respostas negativas das companhias de aluguer de carros.
Um aspecto crucial que, na nossa ignorância, não considerámos convenientemente logo no início: as empresas de aluguer sérvias não são propriamente atreitas a permitir que os seus carros atravessam a fronteira para o Kosovo e a Albânia. Muitas consultas depois, conseguimos uma que permitia a entrada na Albânia, sem a qual iriamos ter sérios problemas logísticos. A busca revelou-se infrutífera em relação ao Kosovo – em retrospectiva, um resultado lógico e óbvio.
Mas, pelo menos, conseguíamos tornear a impossibilidade de conduzir no Kosovo: a ideia era deixar o carro em Nis (lê-se “Nich”, tem um acento circunflexo invertido sobre o “n”), no sul do país e perto daquela região, apanhar um autocarro para Pristina e fazer as demais deslocações de transportes. Simples. Segundo as informações que vimos online, teríamos um autocarro às 8h, pelo que, no tal dia, tínhamos a estação de autocarros à nossa frente, um bocado antes da hora de partida. Na mochila, tínhamos as sandes que simpaticamente nos prepararam no hotel para comermos pelo caminho, porque o pequeno-almoço só começava às 7h30.
Dirigimo-nos à primeira coisa que nos pareceu ser uma bilheteira e aí, indicaram-nos outra. Na segunda bilheteira, a mulher demorou um pouco à procura no computador. Depois disse-nos que tínhamos um autocarro às 18h. As subsequentes tentativas de lhe tentar, assim como à colega do lado que falava melhor inglês, mostrar o que estava no site embateram sempre no mesmo problema: a informação que tinha era que havia um autocarro às 7h (onde é que esse já ia) e outro às 18h. Parecia o “computer says no” do Little Britain.
Desistimos, apesar de a desfeita ainda ter levado uns minutos a ser verdadeiramente assimilada e interiorizada. Não valia a pena esperar 10 horas pelo autocarro da tarde – não havia nada de interessante para passar o tempo – e podíamos vir a deparar-nos com dificuldades análogas no regresso.
E foi assim, que, frustrados, rapidamente congeminámos o plano alternativo de ir até Sófia. Afinal não era assim tão longe. Mas antes, uma paragem estratégica num café com wifi permitiu-nos explorar a possibilidade de tentar visitar o Kosovo a partir da Macedónia (assim como escolher um hotel na capital búlgara). Porque, assim como com as questões do carro alugado, certamente a dificuldade de transporte será maior do lado da Sérvia. Confirmou-se: há bastante informação sobre autocarros para o Kosovo a partir de Skopje e com muito mais possibilidades de horário.
Com este plano na manga, voltámos ao nosso carro e fizemos os cerca de 250 quilómetros até à capital búlgara.
Mas, pelo menos, conseguíamos tornear a impossibilidade de conduzir no Kosovo: a ideia era deixar o carro em Nis (lê-se “Nich”, tem um acento circunflexo invertido sobre o “n”), no sul do país e perto daquela região, apanhar um autocarro para Pristina e fazer as demais deslocações de transportes. Simples. Segundo as informações que vimos online, teríamos um autocarro às 8h, pelo que, no tal dia, tínhamos a estação de autocarros à nossa frente, um bocado antes da hora de partida. Na mochila, tínhamos as sandes que simpaticamente nos prepararam no hotel para comermos pelo caminho, porque o pequeno-almoço só começava às 7h30.
Dirigimo-nos à primeira coisa que nos pareceu ser uma bilheteira e aí, indicaram-nos outra. Na segunda bilheteira, a mulher demorou um pouco à procura no computador. Depois disse-nos que tínhamos um autocarro às 18h. As subsequentes tentativas de lhe tentar, assim como à colega do lado que falava melhor inglês, mostrar o que estava no site embateram sempre no mesmo problema: a informação que tinha era que havia um autocarro às 7h (onde é que esse já ia) e outro às 18h. Parecia o “computer says no” do Little Britain.
Desistimos, apesar de a desfeita ainda ter levado uns minutos a ser verdadeiramente assimilada e interiorizada. Não valia a pena esperar 10 horas pelo autocarro da tarde – não havia nada de interessante para passar o tempo – e podíamos vir a deparar-nos com dificuldades análogas no regresso.
E foi assim, que, frustrados, rapidamente congeminámos o plano alternativo de ir até Sófia. Afinal não era assim tão longe. Mas antes, uma paragem estratégica num café com wifi permitiu-nos explorar a possibilidade de tentar visitar o Kosovo a partir da Macedónia (assim como escolher um hotel na capital búlgara). Porque, assim como com as questões do carro alugado, certamente a dificuldade de transporte será maior do lado da Sérvia. Confirmou-se: há bastante informação sobre autocarros para o Kosovo a partir de Skopje e com muito mais possibilidades de horário.
Com este plano na manga, voltámos ao nosso carro e fizemos os cerca de 250 quilómetros até à capital búlgara.
sábado, 11 de agosto de 2018
A fortaleza era o único ponto de interesse que tinha no planeamento.
Do pouco que me informei online, pensei que seria capaz de nos entreter: tínhamos feito uns 200 e picos quilómetros desde Belgrado – um trajecto muito simples face à bitola média de toda a viagem (já lá vamos) – e ocupávamos agora o remanescente da tarde. Depois de entrar na muralha – que, ainda assim, mereceu o benefício da dúvida – deparámo-nos, no interior, com o que poderia ser um qualquer parque. Rapidamente se esgotou e ficámos sem mais para explorar.
Depois de ter visto sinais de proibição de armas de fogo na porta de alguns restaurantes, acabámos por nos sentar na esplanada de um com aspecto de ter pouca experiência com turistas. Após alguma luta para decifrar o que constava do menu, pedimos, ao empregado de trato seco, uma sopa, para abrir as hostilidades, e depois as típicas carnes grelhadas. Estas (supostamente) viriam acompanhadas de batatas fritas e eu pedi para adicionar uma, como estava escrito no cardápio, “albanian salad.”
A sopa chegou e veio acompanhada de um prato de pão polvilhado com umas especiarias que se vieram a revelar particularmente picantes. É certo que referiu que se tratava de algo albanês, assumimos que seria algo que se servissem tradicionalmente com a sopa. Quando chegou a vez da carne grelhada, não vimos nem batatas fritas nem a dita salada e optámos por não levantar a questão, até porque, seguramente, já não viria a tempo.
Mas, claro, redobrámos a atenção quando veio o papel manuscrito com a conta que, ainda assim, incluía a tal salada albanesa (detectada pelo preço, não pelo rabisco). Quando chamámos a atenção para a questão, recebemos a explicação, altamente duvidosa, de que aquele prato de pão picante que me fez beber a cerveja fresca era, efectivamente, a “albanian salad”.
Depois de ter visto sinais de proibição de armas de fogo na porta de alguns restaurantes, acabámos por nos sentar na esplanada de um com aspecto de ter pouca experiência com turistas. Após alguma luta para decifrar o que constava do menu, pedimos, ao empregado de trato seco, uma sopa, para abrir as hostilidades, e depois as típicas carnes grelhadas. Estas (supostamente) viriam acompanhadas de batatas fritas e eu pedi para adicionar uma, como estava escrito no cardápio, “albanian salad.”
A sopa chegou e veio acompanhada de um prato de pão polvilhado com umas especiarias que se vieram a revelar particularmente picantes. É certo que referiu que se tratava de algo albanês, assumimos que seria algo que se servissem tradicionalmente com a sopa. Quando chegou a vez da carne grelhada, não vimos nem batatas fritas nem a dita salada e optámos por não levantar a questão, até porque, seguramente, já não viria a tempo.
Mas, claro, redobrámos a atenção quando veio o papel manuscrito com a conta que, ainda assim, incluía a tal salada albanesa (detectada pelo preço, não pelo rabisco). Quando chamámos a atenção para a questão, recebemos a explicação, altamente duvidosa, de que aquele prato de pão picante que me fez beber a cerveja fresca era, efectivamente, a “albanian salad”.
sexta-feira, 10 de agosto de 2018
Passamos na recepção do hotel para fazer o check out mas a única funcionária que se encontra diz que não sabe usar a máquina do cartão de crédito.
Diz-nos que a colega foi só à Polícia (?), que lhe telefonou e que ela disse que estaria de volta dentro de dez minutos. Sentamo-nos na sala onde nos serviram o pequeno-almoço à espera. Quando esses dez minutos passam, diz-nos que deve estar a chegar noutros tantos minutos. Nessa altura, saímos e dizemos que passamos depois. Pergunta-nos quando regressaremos e a resposta dificilmente poderia ser outra
Ten minutes
A caminho da fortaleza da cidade, passamos por uma pequena feira onde comerciantes vendem bugigangas para os turistas, miúdos jogam à bola e velhotes defrontam-se em tabuleiros de xadrez, ladeados por alguns mirones, em pé. Entramos na muralha e, lá em cima, temos a vista privilegiada para a importante mas pouco espectacular confluência entre os rios Danúbio e Sava.
De regresso da fortaleza, passamos novamente na recepção do hotel, calculando que, finalmente, os dez minutos sérvios tenham passado. A recepcionista está sentada atrás do balcão. Tem o cabelo apanhado, uma camisa com os ombros descobertos, um sorriso plástico, uma dose industrial de maquilhagem. E unhas de gel coloridas que matariam de susto as cordas de uma guitarra.
Descemos a rua que leva da Praça da República até ao Templo de São Sava, a segunda maior igreja ortodoxa do mundo. Impressionante por fora – tiramos várias fotografias – está, no entanto, repleta de andaimes por dentro. Com alguma desolação, apenas conseguimos ver um pouco dos mosaicos da cúpula.
No regresso, passamos pela praça onde fizeram uma fonte luminosa. Mais à frente, o muro da Assembleia Nacional está coberto por uma faixa gigantesca. Para além do que está escrito em sérvio, há uma inscrição enorme em espanhol, onde se lê “España:” – as letras com as cores da bandeira espanhola – “Kosovo” – com uma imagem do território – seguido de uma seta que liga a “EU” e, de seguida, em preto, com letras ainda mais garrafais, “no pasarán”. Fruto dos movimentos secessionistas com que se depara, os nossos vizinhos ibéricos fazem parte do conjunto de países que não reconhece a independência do Kosovo e, por arrastro a sua adesão à UE. Nada contra aquele território em concreto, a reacção espanhola à ameaça de independência da Escócia aquando do referendo do Brexit é prova que o problema está na abertura do precedente e não em que desencadeia o processo.
Um cappuccino depois, num café da Praça da República, e tiramos o carro da garagem para seguir viagem.
Ten minutes
A caminho da fortaleza da cidade, passamos por uma pequena feira onde comerciantes vendem bugigangas para os turistas, miúdos jogam à bola e velhotes defrontam-se em tabuleiros de xadrez, ladeados por alguns mirones, em pé. Entramos na muralha e, lá em cima, temos a vista privilegiada para a importante mas pouco espectacular confluência entre os rios Danúbio e Sava.
De regresso da fortaleza, passamos novamente na recepção do hotel, calculando que, finalmente, os dez minutos sérvios tenham passado. A recepcionista está sentada atrás do balcão. Tem o cabelo apanhado, uma camisa com os ombros descobertos, um sorriso plástico, uma dose industrial de maquilhagem. E unhas de gel coloridas que matariam de susto as cordas de uma guitarra.
Descemos a rua que leva da Praça da República até ao Templo de São Sava, a segunda maior igreja ortodoxa do mundo. Impressionante por fora – tiramos várias fotografias – está, no entanto, repleta de andaimes por dentro. Com alguma desolação, apenas conseguimos ver um pouco dos mosaicos da cúpula.
No regresso, passamos pela praça onde fizeram uma fonte luminosa. Mais à frente, o muro da Assembleia Nacional está coberto por uma faixa gigantesca. Para além do que está escrito em sérvio, há uma inscrição enorme em espanhol, onde se lê “España:” – as letras com as cores da bandeira espanhola – “Kosovo” – com uma imagem do território – seguido de uma seta que liga a “EU” e, de seguida, em preto, com letras ainda mais garrafais, “no pasarán”. Fruto dos movimentos secessionistas com que se depara, os nossos vizinhos ibéricos fazem parte do conjunto de países que não reconhece a independência do Kosovo e, por arrastro a sua adesão à UE. Nada contra aquele território em concreto, a reacção espanhola à ameaça de independência da Escócia aquando do referendo do Brexit é prova que o problema está na abertura do precedente e não em que desencadeia o processo.
Um cappuccino depois, num café da Praça da República, e tiramos o carro da garagem para seguir viagem.
quinta-feira, 9 de agosto de 2018
Contestamos os 170 euros que nos quer cobrar pelo condutor adicional.
Explica-nos como calculou o valor, tantos euros por tantos dias de aluguer dá tanto para o total do aluguer. Tentamos argumentar que tínhamos visto online o valor e que o mais certo é até já o termos incluído no aluguer (mentira, não estava incluído, explico em português). Ela volta a tocar as teclas do computador com as unhas de gel compridas, que soltam um ploc ploc plástico. Diz-nos que não tem nenhuma indicação nesse sentido no sistema (claro que não tem). Tentamos procurar a reserva no telefone (para mostrar algo que não existe), usando o sinal fraco grátis mas disponibilizado pelo aeroporto Nicola Tesla e, no meio das tentativas para introduzir o número de reserva que não abre nada em nenhum dos telefones,
Could you check again?
E regressa o ploc ploc enquanto continuamos (sem convicção interior mas alguma exterior) a tentar procurar a reserva (que não tem o condutor adicional) no telefone (ligado a uma rede da treta), uma vez mais
Sorry
Não tem nada no sistema (é óbvio que não tem). Gera-se um pequeno impasse, que vai crescendo porque não estamos dispostos a pagar tanto, o valor é demasiado elevado. Pelo meio, no decurso da conversa e sem que me consiga relembrar a que propósito, referimos o campeonato do mundo de futebol e afirmamos, de forma interrogativa, que calculamos que não vão torcer pela Croácia. E o colega, que está sentado ao lado, à espera que resolvamos a disputa sem nenhum interesse em participar nela – limita-se a falar com ela em sérvio quando ela o interpela –, de imediato e de forma bastante enfática, confirma a suspeita. Rimo-nos.
O tempo que leva até chegar ao passo seguinte também é algo que me escapa, mas a certa altura, os 170 como que se esfumam e passam a 70 porque, afinal, explica-nos a funcionária de unhas wolverinescas, apesar de o cálculo estar correcto, há um limite máximo ao valor a cobrar para o efeito
Sorry, my mistake
Diz-nos, com um sorriso forçado. Aproveitamos para rir mais um bocado e referir que esse já parece um valor mais plausível, embora ainda tentemos, uma vez mais, a possibilidade (impossível) de que já tenhamos incluído o condutor extra na reserva. Dado o beco sem saída, socorremo-nos da marcha-atrás e optamos pela saída airosa de que vamos procurar melhor na nossa documentação e resolvemos a questão quando devolvermos o carro.
Tiro o cartão de crédito da carteira para que possa bloquear a quantia de depósito e só aqui refere qual o pecúlio
Eighteen hundred
E eu
Eighteen hundred??
E ela
Yes
E eu
Are we taking a Mercedes??
Está escrito nas condições do aluguer. Em qual das 5 páginas é que aparecem esses 1800 euros? Até já o colega silencioso abre a boca e ri perante a minha surpresa. E é ele que, finalmente, nos leva até ao Opel Astra vermelho, categoria superior à que tínhamos escolhido na reserva, que nos acompanhará – mais do que isso, carregará –, ao longo de duas semanas, por um pouco mais de 2500kms e uma mão cheia de países.
Could you check again?
E regressa o ploc ploc enquanto continuamos (sem convicção interior mas alguma exterior) a tentar procurar a reserva (que não tem o condutor adicional) no telefone (ligado a uma rede da treta), uma vez mais
Sorry
Não tem nada no sistema (é óbvio que não tem). Gera-se um pequeno impasse, que vai crescendo porque não estamos dispostos a pagar tanto, o valor é demasiado elevado. Pelo meio, no decurso da conversa e sem que me consiga relembrar a que propósito, referimos o campeonato do mundo de futebol e afirmamos, de forma interrogativa, que calculamos que não vão torcer pela Croácia. E o colega, que está sentado ao lado, à espera que resolvamos a disputa sem nenhum interesse em participar nela – limita-se a falar com ela em sérvio quando ela o interpela –, de imediato e de forma bastante enfática, confirma a suspeita. Rimo-nos.
O tempo que leva até chegar ao passo seguinte também é algo que me escapa, mas a certa altura, os 170 como que se esfumam e passam a 70 porque, afinal, explica-nos a funcionária de unhas wolverinescas, apesar de o cálculo estar correcto, há um limite máximo ao valor a cobrar para o efeito
Sorry, my mistake
Diz-nos, com um sorriso forçado. Aproveitamos para rir mais um bocado e referir que esse já parece um valor mais plausível, embora ainda tentemos, uma vez mais, a possibilidade (impossível) de que já tenhamos incluído o condutor extra na reserva. Dado o beco sem saída, socorremo-nos da marcha-atrás e optamos pela saída airosa de que vamos procurar melhor na nossa documentação e resolvemos a questão quando devolvermos o carro.
Tiro o cartão de crédito da carteira para que possa bloquear a quantia de depósito e só aqui refere qual o pecúlio
Eighteen hundred
E eu
Eighteen hundred??
E ela
Yes
E eu
Are we taking a Mercedes??
Está escrito nas condições do aluguer. Em qual das 5 páginas é que aparecem esses 1800 euros? Até já o colega silencioso abre a boca e ri perante a minha surpresa. E é ele que, finalmente, nos leva até ao Opel Astra vermelho, categoria superior à que tínhamos escolhido na reserva, que nos acompanhará – mais do que isso, carregará –, ao longo de duas semanas, por um pouco mais de 2500kms e uma mão cheia de países.
quarta-feira, 8 de agosto de 2018
A carga de água faz-me mudar de ideias.
O único autocarro disponível deixa-me a cerca de um quilómetro do hotel, uma perspectiva que deixa de me parecer razoável mediante as condições. Opto pelo táxi oficial de preço tabelado, apesar das inúmeras solicitações que recebo no pequeno trajecto após a passagem da alfândega – onde sou interrogado e a minha mochila perscrutada – e o balcão.
Indico o destino numa banca à saída do aeroporto. A mulher mal-encarada escreve num papel o montante tabelado que devo entregar ao taxista. Lá fora, alguns turistas como eu tentam perceber onde começa (e acaba) a fila para os táxis. Quando chega aquele que parece o meu, tendo em conta a ordem do universo, o tipo faz-me sinal negativo e dirige-se antes à família de locais que estava antes de mim e ficam ali, parados, à conversa. Finalmente chega o táxi que me há de levar.
De imediato me diz que não me pode deixar exactamente à porta, porque é numa rua pedonal, mas deixa-me no início da mesma e dá-me a indicação para onde me devo dirigir, não muito longe. Alguns pingos de chuva depois e estou à porta, que dá para um lance de escadas que, por sua vez, termina na porta que dá acesso à recepção.
Lá dentro, está um grupo a fazer check in. O tipo alto e grande que está na recepção pede-me para esperar. Ainda não tinha acabado de receber o primeiro grupo quando chegou outro ainda maior, casais com vários filhos que rapidamente ficam irrequietos de esperar naquele sítio apertado.
Quando chega a minha vez, pede-me desculpa pela confusão. Depois dá-me a excelente notícia de que me colocou num apartamento noutro edifício, para que estejamos mais à-vontade, longe da confusão destes grupos e das crianças, e pelo preço do quarto que marcámos. Pergunta-me – enquanto limpa o suor da testa – se posso passar depois pela recepção, se pode para já levar-me só ao apartamento e depois regressar para receber o outro grupo e tratar da papelada depois disso.
Digo-lhe que sim e atravessamos rapidamente a rua, onde aproveita para me perguntar o que passa com o Sporting. Dou-lhe uma resposta abreviada (até porque não sei muito) e fico surpreendido pelo bem informado que ele está, não só sobre as questões extra-desportivas, mas também sobre o campeonato português em geral.
O apartamento é realmente enorme, muito espaçoso. Recebo algumas instruções rápidas – a porta tem uma pequena manha e nada de desligar o interruptor que liga a caldeira senão lá se vai a água quente – e ele sai apressado. Três quartos de hora depois, após uma luta inglória com a ligação do wifi, regresso à recepção. Agora já não está ninguém e ele está mais calmo. Devolve-me o passaporte, dá-me um mapa de Belgrado onde rabisca a localização de alguns dos ex-libris, assim como zonas com os melhores restaurantes, daqueles onde se come a carne sem muitos temperos, como fazem noutros locais.
I like the meat clean
acrescenta e eu sinto-me forçado a concordar. Não contém a curiosidade e pergunta-me quais são os planos de viagem e explico-lhe abreviadamente. Agradeço-lhe, terminamos a conversa e saio para a rua.
Indico o destino numa banca à saída do aeroporto. A mulher mal-encarada escreve num papel o montante tabelado que devo entregar ao taxista. Lá fora, alguns turistas como eu tentam perceber onde começa (e acaba) a fila para os táxis. Quando chega aquele que parece o meu, tendo em conta a ordem do universo, o tipo faz-me sinal negativo e dirige-se antes à família de locais que estava antes de mim e ficam ali, parados, à conversa. Finalmente chega o táxi que me há de levar.
De imediato me diz que não me pode deixar exactamente à porta, porque é numa rua pedonal, mas deixa-me no início da mesma e dá-me a indicação para onde me devo dirigir, não muito longe. Alguns pingos de chuva depois e estou à porta, que dá para um lance de escadas que, por sua vez, termina na porta que dá acesso à recepção.
Lá dentro, está um grupo a fazer check in. O tipo alto e grande que está na recepção pede-me para esperar. Ainda não tinha acabado de receber o primeiro grupo quando chegou outro ainda maior, casais com vários filhos que rapidamente ficam irrequietos de esperar naquele sítio apertado.
Quando chega a minha vez, pede-me desculpa pela confusão. Depois dá-me a excelente notícia de que me colocou num apartamento noutro edifício, para que estejamos mais à-vontade, longe da confusão destes grupos e das crianças, e pelo preço do quarto que marcámos. Pergunta-me – enquanto limpa o suor da testa – se posso passar depois pela recepção, se pode para já levar-me só ao apartamento e depois regressar para receber o outro grupo e tratar da papelada depois disso.
Digo-lhe que sim e atravessamos rapidamente a rua, onde aproveita para me perguntar o que passa com o Sporting. Dou-lhe uma resposta abreviada (até porque não sei muito) e fico surpreendido pelo bem informado que ele está, não só sobre as questões extra-desportivas, mas também sobre o campeonato português em geral.
O apartamento é realmente enorme, muito espaçoso. Recebo algumas instruções rápidas – a porta tem uma pequena manha e nada de desligar o interruptor que liga a caldeira senão lá se vai a água quente – e ele sai apressado. Três quartos de hora depois, após uma luta inglória com a ligação do wifi, regresso à recepção. Agora já não está ninguém e ele está mais calmo. Devolve-me o passaporte, dá-me um mapa de Belgrado onde rabisca a localização de alguns dos ex-libris, assim como zonas com os melhores restaurantes, daqueles onde se come a carne sem muitos temperos, como fazem noutros locais.
I like the meat clean
acrescenta e eu sinto-me forçado a concordar. Não contém a curiosidade e pergunta-me quais são os planos de viagem e explico-lhe abreviadamente. Agradeço-lhe, terminamos a conversa e saio para a rua.
segunda-feira, 6 de agosto de 2018
domingo, 5 de agosto de 2018
sábado, 4 de agosto de 2018
sexta-feira, 3 de agosto de 2018
A música de John Zorn é uma marioneta nas mãos do Highsmith Trio
(Publicado originalmente aqui)
A temperatura começou a subir na quarta-feira. O termómetro deu um primeiro pulo, ainda assim, relativamente comportável. Na quinta-feira, o salto mais pronunciado, em direcção ao céu, dando a entender que, apenas ele, parece ser o limite. Após uma máxima em torno dos 40 graus em Lisboa, estão uns ligeiramente mais suportáveis 32 graus às 21h30, hora a que arranca, no auditório ao ar livre mais um concerto do Jazz em Agosto da Fundação Calouste Gulbenkian.
Trata-se da 35ª edição deste festival, uma edição dedicada à música do saxofonista (enfim, multi-instrumentista?) americano John Zorn, na primeira vez que um único músico é alvo de uma homenagem do género. Os espectadores sentam-se nos bancos de cimento, tornados cómodos por almofadas compridas coloridas. Ao contrário de edições anteriores, não nos é oferecido o panfleto com informação do concerto e dos músicos da noite, uma simpatia que hoje teria a vantagem adicional de poder servir de abanico.
Highsmith Trio é o nome do projecto que surgiu inicialmente no formato de duo, com o cruzamento entre a música do pianista Craig Taborn e da, chamemos-lhe assim, laptopista (pelo menos é assim que Jim Black a apresentará daqui a pouco) Ikue Mori. Jim Black juntou-se posteriormente a estes dois para completar o actual trio.
Mais do que apresentar os membros da banda – Craig Taborn on piano, Ikue Mori on laptop (eu não disse?) – Jim Black diz umas palavras sobre a música de John Zorn que vão tocar. Menciona duas características: “intimacy and immediacy”. E dá um exempo da sua aplicação: John Zorn considera que a música é feita para aquele conjunto de pessoas naquele dado momento. E, por isso, não gosta nem autoriza gravações das suas performances: têm significado apenas no espectáculo, esgotam-se no concerto, não fazem sentido noutro local, noutra altura.
Mais do que tocar temas de John Zorn, estes três pretendem pôr em prática esta filosofia durante cerca de uma hora: tocar música que nasce e morre à frente dos olhos e dos ouvidos dos que se deslocaram à Gulbenkian na noite de 2 de Agosto.
Ikue Mori senta-se a uma mesa com o MacBook à sua frente, qual criança na carteira de uma sala de aula, muito direita, com os pés juntinhos. A sua cara vai permanecer sem expressão durante todo o concerto. Os gestos curtos e quase indistintos ao teclado do computador contrastam fortemente com as mãos de Craig Taborn, que atravessam vezes sem conta as oitentas e muitas teclas do piano, por vezes rapidamente, outras lentamente. Cruzam-se e sobrepõem-se, ultrapassam o tampo do piano e tocam directamente nas cordas.
A música é eficaz e certeira, embora repleta de liberdade – estamos a ouvir algo que mais ninguém vai ouvir. Gatos correm lá atrás no verde do jardim da Gulbenkian enquanto a sonoridade passa de dissonante a melodiosa; mosquitos dançam por cima dos executantes, bailando à luz dos holofotes, enquanto o ritmo suave se acelera e se transforma, se galvaniza. Talvez seja como sushi: simples mas elaborada, crua mas delicada. Tradicional mas pouco ortodoxa. Irreverente sem deixar de ser consensual.
John Zorn é como aqueles governos fantoches dos países satélite: a sua música parece ser controlada à distância pelos governos das grandes potências. Neste caso, pelas seis mãos das três cabeças deste trio, accionam os comandos que produzem os sons e os ritmos. “Arigato gozaimazu”, agradece Jim Black ao microfone quando o trio regressa ao palco para um encore único.
A temperatura começou a subir na quarta-feira. O termómetro deu um primeiro pulo, ainda assim, relativamente comportável. Na quinta-feira, o salto mais pronunciado, em direcção ao céu, dando a entender que, apenas ele, parece ser o limite. Após uma máxima em torno dos 40 graus em Lisboa, estão uns ligeiramente mais suportáveis 32 graus às 21h30, hora a que arranca, no auditório ao ar livre mais um concerto do Jazz em Agosto da Fundação Calouste Gulbenkian.
Trata-se da 35ª edição deste festival, uma edição dedicada à música do saxofonista (enfim, multi-instrumentista?) americano John Zorn, na primeira vez que um único músico é alvo de uma homenagem do género. Os espectadores sentam-se nos bancos de cimento, tornados cómodos por almofadas compridas coloridas. Ao contrário de edições anteriores, não nos é oferecido o panfleto com informação do concerto e dos músicos da noite, uma simpatia que hoje teria a vantagem adicional de poder servir de abanico.
Highsmith Trio é o nome do projecto que surgiu inicialmente no formato de duo, com o cruzamento entre a música do pianista Craig Taborn e da, chamemos-lhe assim, laptopista (pelo menos é assim que Jim Black a apresentará daqui a pouco) Ikue Mori. Jim Black juntou-se posteriormente a estes dois para completar o actual trio.
Mais do que apresentar os membros da banda – Craig Taborn on piano, Ikue Mori on laptop (eu não disse?) – Jim Black diz umas palavras sobre a música de John Zorn que vão tocar. Menciona duas características: “intimacy and immediacy”. E dá um exempo da sua aplicação: John Zorn considera que a música é feita para aquele conjunto de pessoas naquele dado momento. E, por isso, não gosta nem autoriza gravações das suas performances: têm significado apenas no espectáculo, esgotam-se no concerto, não fazem sentido noutro local, noutra altura.
Mais do que tocar temas de John Zorn, estes três pretendem pôr em prática esta filosofia durante cerca de uma hora: tocar música que nasce e morre à frente dos olhos e dos ouvidos dos que se deslocaram à Gulbenkian na noite de 2 de Agosto.
Ikue Mori senta-se a uma mesa com o MacBook à sua frente, qual criança na carteira de uma sala de aula, muito direita, com os pés juntinhos. A sua cara vai permanecer sem expressão durante todo o concerto. Os gestos curtos e quase indistintos ao teclado do computador contrastam fortemente com as mãos de Craig Taborn, que atravessam vezes sem conta as oitentas e muitas teclas do piano, por vezes rapidamente, outras lentamente. Cruzam-se e sobrepõem-se, ultrapassam o tampo do piano e tocam directamente nas cordas.
A música é eficaz e certeira, embora repleta de liberdade – estamos a ouvir algo que mais ninguém vai ouvir. Gatos correm lá atrás no verde do jardim da Gulbenkian enquanto a sonoridade passa de dissonante a melodiosa; mosquitos dançam por cima dos executantes, bailando à luz dos holofotes, enquanto o ritmo suave se acelera e se transforma, se galvaniza. Talvez seja como sushi: simples mas elaborada, crua mas delicada. Tradicional mas pouco ortodoxa. Irreverente sem deixar de ser consensual.
John Zorn é como aqueles governos fantoches dos países satélite: a sua música parece ser controlada à distância pelos governos das grandes potências. Neste caso, pelas seis mãos das três cabeças deste trio, accionam os comandos que produzem os sons e os ritmos. “Arigato gozaimazu”, agradece Jim Black ao microfone quando o trio regressa ao palco para um encore único.
quinta-feira, 2 de agosto de 2018
quarta-feira, 1 de agosto de 2018
"Há sopa de caldo verde"
Escrito em letras garrafais, numa folha A4, colada com fita cola no vidro de um café/restaurante.
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