As formas banais de manipulação de concursos públicos passam pela estipulação de um conjunto de características técnicas de tal forma que, curioso, só há uma entidade disponível com condições para levar a cabo a obra. Por outro lado, também são comuns os chamados “concursos de beleza” que, ao estabelecerem regras pouco claras e suficientemente subjectivas, permitem justificar qualquer decisão e, portanto, uma escolha o mais interesseira possível. E isto é para os casos em que efectivamente existe esse concurso, porque às vezes o descaramento é tanto que até essa etapa é convenientemente afastada.
Há ainda outra forma curiosa de ganhar concursos públicos neste país e que resulta de expectativas distorcidas por parte dos empreiteiros. A distorção reflecte a possibilidade de, depois de ganho o concurso, ser atribuída mais construção do que aquela inicialmente prevista. O resultado: orçamentar um valor relativamente baixo, mais baixo do que aquele que seria orçamentado caso não existisse a tal expectativa.
É claro que isto é um risco para o empreiteiro. Está a contar com o ovo no dito cujo da galinha. Se as tais obras adicionais não lhe vierem a ser propostas, então poderá encontrar-se em maus lençóis porque licitou um preço inferior àquele que licitaria caso não contasse com elas. No entanto, tendo em conta que se trata de uma prática relativamente difundida, isto deverá sinalizar que os empreiteiros, fruto da experiência que têm no seu ramo de actividade, atribuem uma elevada probabilidade ao ovo aparecer mesmo no traseiro da galinha.
Ora, uma vez que se criou uma dinâmica neste país em que sistematicamente as obras saem mais caras do que aquilo que se previu, mais uma obra adicional, menos uma obra adicional, tudo isto passa relativamente despercebido e incólume. E é tipicamente com estes acrescentos que não só efectivamente se ganha dinheiro com a obra, como ainda, eventualmente, uma vivenda no Algarve ou um Mercedes novo. Agora, uma coisa é certa: para que este jogo tenha lugar, é preciso que, por vezes, aqueles bens não só revertam para o património do empreiteiro, mas também para o(s) de algun(s) decisor(es).
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Nao querendo contradizer a teria com que terminas a tua exposição, acrescento que por vezes é da própria análise do projecto que o empreiteiro conclui que haverá necessariamente ajustes à obra, por o projecto estar incorrecto ou incompleto. (Ou seja, nem sempre se necessita o tal "leap of faith") E como os ajustes são feitos depois do concurso, e o preço destes já não está sujeito ao mesmo...
ResponderEliminarConcordando com o Nuno, e mantendo ainda a posição que deveria existir uma revisão de projecto obrigatória, tenho vos ainda a dizer que o Decreto-Lei n.º 18/2008 de 29 de Janeiro que aprovou o novo Código de Contratos Públicos (CCP), vem de certo modo tentar alterar todas essas questões, obrigando o empreiteiro que concorre a um obra apresentar erros e omissões que detecte no projecto em questão, ficando o órgão competente pelo concurso em causa obrigado a responder aos mesmos erros e omissões. Desta forma quando se chega à fase de obra existe um preço base que tem que ser cumprido e ao qual o empreiteiro não pode fugir (salvo se apresentou erros e omissões que não foram aceites e que efectivamente aparecem em fase de obra – esta é a única excepção).
ResponderEliminarAgora, isto não quer dizer que as coisas tenham deixado de funcionar da mesma maneira. Nada que novos concursos a que chamamos ajustes directos não resolvam e que em alguns casos podem atingir valores de 1 000 000€.