terça-feira, 18 de agosto de 2009
A maçaneta escura, o metal frio e pesado.
Rodo – é daquelas de rodar, não das outras de pressionar para baixo – e a porta de madeira escura abre para dentro. A luz vem da persiana mal fechada, a janela ligeiramente aberta expõe o telhado sujo que está logo ali, quase se alcança esticando um braço. As duas camas pequenas, com pernas de metal. Azuis, muito azuis. Lembro-me dos móveis, a cómoda, o armário, castanho escuros, muito escuros. A madeira comida pelo tempo e pela utilização. Os puxadores eram umas meias-luas que, quando os largava, embatiam contra uma protecção de metal e soltavam um ruído característico. Estranho mas característico. Ouço-o ainda agora, passado todo este tempo. Distintamente. Trago-o. Comigo. Não sei porquê, de nada serve, de nada me serve. E nem sequer consigo deixá-lo para trás. Há coisas que lentamente se apagam e outras que seguem agarradas a nós como lapas nas rochas. Não descolam. Não nos largam. Não quero nada com o som do puxador a embater na protecção de metal mas ele não me larga. Uma lapa e eu a rocha. Os dias, meses, anos, sei lá há quanto tempo isto foi e aquelas camas de metal azuis e os móveis escuros de um castanho gasto com os puxadores que faziam aquele som. Metálico. Característico. As porcarias que acumulamos e das quais não nos largamos. Não nos soltamos. Queria despejar isto tudo, nada disto me interessa, não é importante, não é relevante e, no entanto, está sempre, pronto a disparar assim que qualquer coisa despolete aquele som na minha cabeça. Que está cá, continua cá, não sai de cá mesmo quando já nem sequer tenho a noção que ele ainda aqui andava. Precisei do catalisador. E, assim que ele surgiu, lá estava o som na minha cabeça, mais os armários daquele castanho. Escuro. Gastos. E as camas metálicas. Azuis.
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