terça-feira, 7 de janeiro de 2020

À saída do Jalé, apanho três miúdos que entram no banco traseiro do jeep de catana na mão.

Temos alguma dificuldade de comunicação, a língua franca deles não é decididamente o português (angolar?). Percebo que querem ir para lá de Porto Alegre e combinamos que me avisam quando quiserem sair. Falam, entre eles, com um sorriso rasgado na cara, por vezes acenam quando passamos por outras pessoas. Quando chega a altura, fazem-me sinal, encosto onde posso
Obrigado, amigo!

Um bom bocado depois, passada a pior parte e de regresso a asfalto regular, a 5 ou 6 quilómetro de São João dos Angolares, uma senhora de idade, de balde e catana na mão grita-me
Boleia, boleia!
Encosto, aproxima-se do vidro aberto e pergunto-lhe para onde vai
Para os Angolares
Enquanto lhe digo que é exactamente para aí que vou, tiro a mochila do banco do pendura e passo-a para trás, para que se possa sentar ao meu lado, o que a deixa um pouco perplexa
Mas... aí??
Coloca o balde delicadamente, senta-se envergonhada, encolhida ao meu lado. Meto conversa, pergunto-lhe como iria para os Angolares caso não tivesse boleia e ela diz-me que teria de esperar por uma carrinha que passa umas boas mais tarde.

Estamos nesta conversa de circunstância quando, após mais uma das inúmeras curvas, vejo um polícia que me manda encostar. Chega-se à minha janela
Desligue a viatura, por favor.
Desligo o motor.
Documentos da viatura, por favor.
Peço licença à senhora para esticar o braço até ao porta luvas, onde o tipo da empresa de aluguer me disse que estavam os documentos. Pego no pequeno livrete verde e tiro da carteira a minha carta de condução, saio do jeep e entrego ao agente, que os inspecciona.
A viatura é alugada?
Sim
E tem todos os equipamentos necessários? Macaco? Triângulo?
Sim
Posso ver?
Dirijo-me à bagageira, retiro a caixa do triângulo, abro à sua frente.
E o macaco?
Peço licença, retiro o meu saco e levanto a pequena tampa, debaixo da qual estão as chaves e o macaco para mudar o pneu, de acordo com o que me tinha sido dito.
Quando é que o senhor entrou em São Tomé?
Respondo.
Quando é que regressa?
Respondo.
Faz uma pequena pausa, volta a colocar a papelada dentro do pequeno livrete, devolve-me tudo
Ok, pode seguir.

Agradeço, despeço-me e volto a sentar-me ao volante. Espero até ter algumas curvas de distância em relação ao polícia até recomeçar a conversa com a senhora que, durante este tempo todo, esteve na mesma posição encolhida no banco do pendura. Faz uma exclamação em relação ao facto de o polícia ter mandado parar um branco
Brranco tem documento!

Deixo-a no centro da povoação, agradece-me de mãos juntas. Sigo mais um pouco até virar para a estrada que dá acesso à Roça de São João de Angolares, onde passo a noite.

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