Pelo menos para nós, meros e comuns não-autóctones. O calor semi-tropical – muitos japoneses andam constantemente com uma pequena toalha para limparem o suor da cara e do pescoço – convida à presença constante de uma garrafa de água, de preferência cheia. Mas a compra da dita garrafa vem sempre acompanhada da antecipação de um desconforto num futuro bastante próximo. Praticamente não existem caixotes de lixo nas ruas japonesas. Uma ausência que contrasta fortemente com a presença abundante de vending machines, em cada rua, cada esquina. E que, no entanto, não tem reflexo no aspecto das ruas, sempre limpas e asseadas: os japoneses são educados desde pequenos a levar o lixo para casa. Para nós, o resultado é um acumular de garrafas e outros detritos no saco da máquina fotográfica, prontamente despejados em seven-elevens e lojas do género que, misericordiosamente, têm recipientes para o efeito perto das máquinas de café.
Ao jantar demos aso, invariavelmente, ao pecado da gula. Num dos poucos dias em que me calhou a escolha do estabelecimento, parei num conjunto de fotos do Trip Advisor que me agradaram. Só depois me apercebi que se tratava do número 1 de sushi da cidade. Fomos rapidamente com receio de que a cozinha pudesse encerrar. À chegada, enquanto esperámos até sermos conduzidos aos nossos lugares ao balcão, escolhemos da ementa o que queríamos. Ao elencar a (extensa?) lista ao empregado/sushiman, recebemos um aviso de que poderia ser demasiado. Dissemos-lhe que não se preocupasse. E tínhamos razão, não sobrou nada.
De frente para o balcão onde as peças são preparadas, com uma estrutura de madeira a fazer lembrar as velhas carteiras das salas de aula, as peças são colocadas e deslizam suavemente até à extremidade curva, onde ficam retidas, como as canetas dos alunos. Numa parede, ao fundo, um olhar mais atento detecta uma barata. Mexe-se de vez em quando. Optamos por não dizer nada mas o casal ao nosso lado também repara e avisa o empregado/sushiman, que inicia uma operação de captura do bicho que o leva a correr desalmadamente por uma divisão adentro que fica fora do nosso alcance. Passando um momento, regressa com uma cara compungida e, atrapalhado, desfaz-se em desculpas. O tipo do casal, que por esta altura já tinha terminado a refeição, diz
Don’t worry, the food was really tasty
e rimo-nos. E tinha razão, a comida estava excelente. Comemos lindamente, um sushi maravilhoso, incluindo porções da deliciosa parte gorda do atum. No final, de estômago bem cheio e consolado, com o restaurante já praticamente vazio à excepção de uma mesa com italianos que trocaram algumas palavras de português brasileiro connosco, pedimos a conta que sabíamos seria elevada, dado o que tínhamos escolhido. E, com a mesma cara ainda um pouco desconfortável com a situação, o sushiman deu à volta ao bar e veio falar connosco, baixinho, e dizer-nos que nos cobraria apenas metade da refeição, sem incluir sequer as cervejas. Dizemos que não aceitamos, insistimos que queremos pagar, que a refeição estava óptima mas a vontade dele sobrepõe-se.
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