«Lo cierto es que no hay mal menor cuando se trata de elegir entre dos totalitarismos - es como elegir entre el sida y el cáncer terminal»
La llamada de la tribu, Mario Vargas Llosa
quinta-feira, 31 de maio de 2018
terça-feira, 29 de maio de 2018
Nova sazonalidade
As alterações climáticas vão tornar cada vez mais difícil a interpretação da sazonalidade em dados e a sua correcção.
segunda-feira, 28 de maio de 2018
Seguir os sonhos
O problema de qualquer coisa que seja dos nossos sonhos - emprego, casa, férias, casamento - é que tanto pode ser dos bons como dos pesadelos.
domingo, 27 de maio de 2018
domingo, 20 de maio de 2018
Em vão
A mão desloca-se sem pensar até ao interruptor, repete o gesto mecânico que tantas e tantas repetiu e voltou a repetir. Mas desta vez
Não foi só esta
a luz não acende como costuma, como tantas vezes fez e voltou a fazer. Apenas um brilho muito ténue que não chega para iluminar e mostrar o caminho, um desapontamento. O mesmo brilho que já apareceu antes, que já desapontou, mas que a força do hábito teima em esquecer,
Em querer esquecer,
como se a mão não soubesse que a lâmpada está fundida, já fundiu há uns dias. A mesma mão que já devia ter-se esticado e desenroscado o casquilho da lâmpada fundida e procurado outra para a substituir. E, no entanto, encontrar o bocadinho de tempo necessário para essa tarefa parece ser outra tarefa em si mesmo, uma tarefa difícil e complicada que tem o poder de evitar os sucessivos desapontamentos da mão que procura o interruptor, que se esquece por um curto momento que, desta vez,
Mais uma vez
o gesto vai ser em vão.
Não foi só esta
a luz não acende como costuma, como tantas vezes fez e voltou a fazer. Apenas um brilho muito ténue que não chega para iluminar e mostrar o caminho, um desapontamento. O mesmo brilho que já apareceu antes, que já desapontou, mas que a força do hábito teima em esquecer,
Em querer esquecer,
como se a mão não soubesse que a lâmpada está fundida, já fundiu há uns dias. A mesma mão que já devia ter-se esticado e desenroscado o casquilho da lâmpada fundida e procurado outra para a substituir. E, no entanto, encontrar o bocadinho de tempo necessário para essa tarefa parece ser outra tarefa em si mesmo, uma tarefa difícil e complicada que tem o poder de evitar os sucessivos desapontamentos da mão que procura o interruptor, que se esquece por um curto momento que, desta vez,
Mais uma vez
o gesto vai ser em vão.
quinta-feira, 17 de maio de 2018
domingo, 13 de maio de 2018
sexta-feira, 11 de maio de 2018
quinta-feira, 10 de maio de 2018
Abelhas
Aos finais de tarde, são como um enxame à saída dos centros comerciais e do McDonald's. De moto ou bicicleta, com o recipiente verde, com alças para pôr às costas, do Ubereats
quarta-feira, 9 de maio de 2018
TRiSoNTe selvagem foge da jaula e abalroa público do Somersby Out Jazz
(Publicado originalmente aqui)
Na entrada para a palavra “Bisonte” no dicionário Priberam da língua portuguesa lê-se “género de grandes bovídeos selvagens, caracterizados pela bossa do pescoço e pelo grande colar de pele lanosa.”. Já TRiSoNTe – e escrito assim, isto é, as consoantes maiúsculas e as vogais minúsculas – não consta daquele dicionário (nem de qualquer outro, tanto quanto sei), é uma ilustre desconhecida, sem aplicação prática para lá da designação desta banda que deu um valente pontapé de saída à 12ª edição do Somersby Out Jazz, no final de tarde do primeiro domingo de Maio, nos jardins da Torre de Belém.
Estará a sua origem associada aos três membros que formam este trio (passo o pleonasmo)? Ricardo Barriga (guitarra) e Gonçalo Prazeres (saxofone alto e barítono) são os mentores, materiais e espirituais, deste projecto que, talvez por esta criação a quatro mãos (mais seis cordas e não sei quantas (23?) chaves), pudesse encontrar em BiSoNTe – e apesar da definição supra-mencionada – uma designação mais apropriada, ao mesmo tempo que exclui, por completo, a possibilidade de uNiSoNTe. Inicialmente, a estes dois mentores juntaram-se Miguel Cordeiro (teclados) e Rui Pereira (bateria). No entanto, seria com Luís Candeias (bateria) que a composição da formação acabaria por se consolidar e permanecer durante largos anos. E, então, acrescento eu, TRiSoNTe passou definitivamente a ser uma designação por demais apropriada.
Antes de escrever mais uma palavra que seja, tenho que fazer uma séria declaração de interesses: sou amigo do Ricardo Barriga há muitos e muitos anos, desde que me lembro de existir, pelo que tudo o que escrever nesta crónica deverá ser visto à luz da minha potencial imparcialidade ou enviesamento.
Posto isto, a primeira observação, inevitável e totalmente incontornável, que aqui coloco, na forma interrogativa, é a seguinte: cadê o (contra)baixo? A ausência deste último é uma das características mais salientes do trio (mesmo quando foram quarteto) e que os aproxima de algumas das referências que serviram de inspiração para o projecto, como é o caso dos Human Feel de Chris Speed, Kurt Rosenwinkel, Andrew D’Angelo e Jim Black. A mim, uma formação deste género imediatamente, e quase inevitavelmente, remete para os Morphine cujo baixo de Mark Sandman, no fundo, não fazia as vezes de um baixo, dado o emprego bastante sui generis do mesmo, e que casava na perfeição com o som do saxofone barítono.
Após o primeiro disco, “Monter’s Lullaby”, editado em 2013, os TRiSoNTe têm na calha, para breve, o lançamento de um segundo, “Emergency Exit”, alguns temas dos quais a banda aproveitou para apresentar no concerto. Mas o que é mais relevante neste novo trabalho de estúdio é a alteração estrutural à dinâmica da banda que acabou por acarretar. E o elemento curioso dessa alteração é que surgiu de forma totalmente circunstancial: Candeias sugeriu experimentar a inclusão de baixo na gravação (manejado pelo próprio), algo que não estava contemplado inicialmente. O resultado foi do agrado de todos, o que explica a razão de termos quatro e não três elementos em palco nos jardins da Torre de Belém – António Quintino, no baixo eléctrico, é a mais recente aquisição do trio que, por isso, regressou ao formato de quarteto (o que remete para a possibilidade de considerar a evolução da designação para TeTRaSoNTe ou QuaDRiSoNTe).
Regressemos novamente aos jardins, cheios de lisboetas domingueiros, espraiados na relva, de copo na mão para combater o calor, alguns troncos nús e bikinis, e com o som de fundo do comboio da linha de Cascais. Com uma pontualidade britânica, às 17h, são atingidos pela melodia lenta e pesada, apoiada numa linha de baixo enrolada e quase trôpega, de “99 ways to get an orgasm”, tema com que a banda abre as (literais) hostilidades e mostra, sem rodeios, ao que vem.
Os cavalheiros deste pouco ortodoxo power trio virado quarteto não são uns meninos quaisquer – muito pelo contrário, são aquilo a que custamos chamar malta da pesada. A música desta banda está repleta da atitude e da agressividade do rock, da liberdade do free, com muito noise e dissonâncias à mistura e, claro, a improvisação do jazz. Os riffs são poderosos, com imensa convicção, seja saídos da guitarra distorcida e saturada de Barriga, seja do saxofone de Prazeres, ou dos dois instrumentos em simultâneo, tocados, como se costuma dizer, na batata.
Quando a tarefa de controlar o riff crú e poderoso é de Barriga, por vezes, é criado um contraste que faz sobressair melodias de notas longas e suaves, expostas por Prazeres. O segundo tema da tarde, “Freedy K will kill me if I stay”, um título certamente familiar para os fãs dos vários pesadelos em Elm Street, é um exemplo disso mesmo. Quando a mesma tarefa é partilhada, ganha uma cor e uma presença quase inumanas, como no terceiro tema da tarde e primeiro do novo álbum, “Cangalhada”: após uma curta introdução de guitarra que lembra a utilização de cordas soltas à la Bill Frisell, explode num riff envolvente e contagiante. Por esta altura, abalroado pelo que lhe entra nos ouvidos e faz vibrar os tímpanos, o público já acordou da letargia mole, assobia e bate palmas.
As cordas do baixo de Quintino só se deixam tocar com palheta, para garantir o ataque mais vincado de cada nota, acrescentando uma intensidade adicional e um som mais crispy. Das baquetas de Candeias raras vezes (se é que uma sequer) sai um simples e elementar swing, daqueles tradicionais. Mas sai tudo o resto, possível e imaginário, em catadupa, da subtileza das escovas na tarola a um pedal de bombo extremamente veloz, a fazer lembrar bateristas de heavy metal.
A banda só dá algum descanso ao público em temas como “Saída de emergência” e “I always tell the truth (even when I lie)” – neste último, Quintino e Candeias trocam de posições e instrumentos –, assentes numa linha de guitarra simples e eficaz, que abre as portas a um solo de Prazeres de frases curtas e soltas, com recurso a delay e outros efeitos – aliás, a utilização de variados efeitos é também uma forte marca, sortilégios que normalmente saem mais da cartola dos guitarristas mas que, neste caso, com maior ou menor intensidade, saem praticamente da cartola de todos. “Ciclo vicioso” também propicia um momento de alguma acalmia, um tema com um cariz mais melancólico e introspectivo.
A Gonçalo Prazeres cabe a responsabilidade de dizer umas palavras e fá-lo a seguir ao tema “Escanifobético”, aproveitando a deixa para dizer que é “a música que define o nosso som” e, talvez involuntariamente, deixando um sério recado para os músicos e bandas que rejeitam etiquetas. Não chegaria ao ponto de afirmar que a regra dos TRiSoNTe é não ter regras, embora sinta que fazem e tocam uma música livre do jugo de pelo menos umas quantas. De uma forma menos espartilhada ou agrilhoada e que acima de tudo garante o que é verdadeiramente fundamental: não são só os pratos da bateria de Candeias que se fazem ouvir, mas também os pratos tilintantes de um serviço da Vista Alegre, enquanto a banda, como se costuma dizer, parte a louça toda. E, acima de tudo, se diverte a fazê-lo, como uma grande desbunda.
O set aproxima-se do fim com a melodia simples e eficaz de “Push”, outro tema novo, em que a guitarra e saxofone se vão apoiando mutuamente, numa dança que permite a um e outro ter o espaço para improvisação sem que o tema perca solidez. O final, sem antes Prazeres pegar novamente no microfone para rapidamente apresentar os elementos da banda, fica por conta de “(title)”, do anterior álbum.
Termino por dizer que são vários os Prazeres (99 formas de ter orgasmos musicais?) ao ouvir esta Barriga(da) de música que quase enCandeia(s) (humildes desculpas por não conseguir enquadrar Quintino neste trocadilho). E aproveito para também eu deixar (voluntariamente) um recado: está na altura de ver estes quatro noutros fóruns, cuja programação se centra neste tipo de música, tais como a Culturgest ou o Jazz em Agosto.
Na entrada para a palavra “Bisonte” no dicionário Priberam da língua portuguesa lê-se “género de grandes bovídeos selvagens, caracterizados pela bossa do pescoço e pelo grande colar de pele lanosa.”. Já TRiSoNTe – e escrito assim, isto é, as consoantes maiúsculas e as vogais minúsculas – não consta daquele dicionário (nem de qualquer outro, tanto quanto sei), é uma ilustre desconhecida, sem aplicação prática para lá da designação desta banda que deu um valente pontapé de saída à 12ª edição do Somersby Out Jazz, no final de tarde do primeiro domingo de Maio, nos jardins da Torre de Belém.
Estará a sua origem associada aos três membros que formam este trio (passo o pleonasmo)? Ricardo Barriga (guitarra) e Gonçalo Prazeres (saxofone alto e barítono) são os mentores, materiais e espirituais, deste projecto que, talvez por esta criação a quatro mãos (mais seis cordas e não sei quantas (23?) chaves), pudesse encontrar em BiSoNTe – e apesar da definição supra-mencionada – uma designação mais apropriada, ao mesmo tempo que exclui, por completo, a possibilidade de uNiSoNTe. Inicialmente, a estes dois mentores juntaram-se Miguel Cordeiro (teclados) e Rui Pereira (bateria). No entanto, seria com Luís Candeias (bateria) que a composição da formação acabaria por se consolidar e permanecer durante largos anos. E, então, acrescento eu, TRiSoNTe passou definitivamente a ser uma designação por demais apropriada.
Antes de escrever mais uma palavra que seja, tenho que fazer uma séria declaração de interesses: sou amigo do Ricardo Barriga há muitos e muitos anos, desde que me lembro de existir, pelo que tudo o que escrever nesta crónica deverá ser visto à luz da minha potencial imparcialidade ou enviesamento.
Posto isto, a primeira observação, inevitável e totalmente incontornável, que aqui coloco, na forma interrogativa, é a seguinte: cadê o (contra)baixo? A ausência deste último é uma das características mais salientes do trio (mesmo quando foram quarteto) e que os aproxima de algumas das referências que serviram de inspiração para o projecto, como é o caso dos Human Feel de Chris Speed, Kurt Rosenwinkel, Andrew D’Angelo e Jim Black. A mim, uma formação deste género imediatamente, e quase inevitavelmente, remete para os Morphine cujo baixo de Mark Sandman, no fundo, não fazia as vezes de um baixo, dado o emprego bastante sui generis do mesmo, e que casava na perfeição com o som do saxofone barítono.
Após o primeiro disco, “Monter’s Lullaby”, editado em 2013, os TRiSoNTe têm na calha, para breve, o lançamento de um segundo, “Emergency Exit”, alguns temas dos quais a banda aproveitou para apresentar no concerto. Mas o que é mais relevante neste novo trabalho de estúdio é a alteração estrutural à dinâmica da banda que acabou por acarretar. E o elemento curioso dessa alteração é que surgiu de forma totalmente circunstancial: Candeias sugeriu experimentar a inclusão de baixo na gravação (manejado pelo próprio), algo que não estava contemplado inicialmente. O resultado foi do agrado de todos, o que explica a razão de termos quatro e não três elementos em palco nos jardins da Torre de Belém – António Quintino, no baixo eléctrico, é a mais recente aquisição do trio que, por isso, regressou ao formato de quarteto (o que remete para a possibilidade de considerar a evolução da designação para TeTRaSoNTe ou QuaDRiSoNTe).
Regressemos novamente aos jardins, cheios de lisboetas domingueiros, espraiados na relva, de copo na mão para combater o calor, alguns troncos nús e bikinis, e com o som de fundo do comboio da linha de Cascais. Com uma pontualidade britânica, às 17h, são atingidos pela melodia lenta e pesada, apoiada numa linha de baixo enrolada e quase trôpega, de “99 ways to get an orgasm”, tema com que a banda abre as (literais) hostilidades e mostra, sem rodeios, ao que vem.
Os cavalheiros deste pouco ortodoxo power trio virado quarteto não são uns meninos quaisquer – muito pelo contrário, são aquilo a que custamos chamar malta da pesada. A música desta banda está repleta da atitude e da agressividade do rock, da liberdade do free, com muito noise e dissonâncias à mistura e, claro, a improvisação do jazz. Os riffs são poderosos, com imensa convicção, seja saídos da guitarra distorcida e saturada de Barriga, seja do saxofone de Prazeres, ou dos dois instrumentos em simultâneo, tocados, como se costuma dizer, na batata.
Quando a tarefa de controlar o riff crú e poderoso é de Barriga, por vezes, é criado um contraste que faz sobressair melodias de notas longas e suaves, expostas por Prazeres. O segundo tema da tarde, “Freedy K will kill me if I stay”, um título certamente familiar para os fãs dos vários pesadelos em Elm Street, é um exemplo disso mesmo. Quando a mesma tarefa é partilhada, ganha uma cor e uma presença quase inumanas, como no terceiro tema da tarde e primeiro do novo álbum, “Cangalhada”: após uma curta introdução de guitarra que lembra a utilização de cordas soltas à la Bill Frisell, explode num riff envolvente e contagiante. Por esta altura, abalroado pelo que lhe entra nos ouvidos e faz vibrar os tímpanos, o público já acordou da letargia mole, assobia e bate palmas.
As cordas do baixo de Quintino só se deixam tocar com palheta, para garantir o ataque mais vincado de cada nota, acrescentando uma intensidade adicional e um som mais crispy. Das baquetas de Candeias raras vezes (se é que uma sequer) sai um simples e elementar swing, daqueles tradicionais. Mas sai tudo o resto, possível e imaginário, em catadupa, da subtileza das escovas na tarola a um pedal de bombo extremamente veloz, a fazer lembrar bateristas de heavy metal.
A banda só dá algum descanso ao público em temas como “Saída de emergência” e “I always tell the truth (even when I lie)” – neste último, Quintino e Candeias trocam de posições e instrumentos –, assentes numa linha de guitarra simples e eficaz, que abre as portas a um solo de Prazeres de frases curtas e soltas, com recurso a delay e outros efeitos – aliás, a utilização de variados efeitos é também uma forte marca, sortilégios que normalmente saem mais da cartola dos guitarristas mas que, neste caso, com maior ou menor intensidade, saem praticamente da cartola de todos. “Ciclo vicioso” também propicia um momento de alguma acalmia, um tema com um cariz mais melancólico e introspectivo.
A Gonçalo Prazeres cabe a responsabilidade de dizer umas palavras e fá-lo a seguir ao tema “Escanifobético”, aproveitando a deixa para dizer que é “a música que define o nosso som” e, talvez involuntariamente, deixando um sério recado para os músicos e bandas que rejeitam etiquetas. Não chegaria ao ponto de afirmar que a regra dos TRiSoNTe é não ter regras, embora sinta que fazem e tocam uma música livre do jugo de pelo menos umas quantas. De uma forma menos espartilhada ou agrilhoada e que acima de tudo garante o que é verdadeiramente fundamental: não são só os pratos da bateria de Candeias que se fazem ouvir, mas também os pratos tilintantes de um serviço da Vista Alegre, enquanto a banda, como se costuma dizer, parte a louça toda. E, acima de tudo, se diverte a fazê-lo, como uma grande desbunda.
O set aproxima-se do fim com a melodia simples e eficaz de “Push”, outro tema novo, em que a guitarra e saxofone se vão apoiando mutuamente, numa dança que permite a um e outro ter o espaço para improvisação sem que o tema perca solidez. O final, sem antes Prazeres pegar novamente no microfone para rapidamente apresentar os elementos da banda, fica por conta de “(title)”, do anterior álbum.
Termino por dizer que são vários os Prazeres (99 formas de ter orgasmos musicais?) ao ouvir esta Barriga(da) de música que quase enCandeia(s) (humildes desculpas por não conseguir enquadrar Quintino neste trocadilho). E aproveito para também eu deixar (voluntariamente) um recado: está na altura de ver estes quatro noutros fóruns, cuja programação se centra neste tipo de música, tais como a Culturgest ou o Jazz em Agosto.
terça-feira, 8 de maio de 2018
segunda-feira, 7 de maio de 2018
Dois terços da Bandwagon de Jason Moran são um bom exemplo de como o todo não é igual à soma das partes
(Publicado originalmente aqui)
À entrada do Grande Auditório do CCB, em mais do que um sítio, lê-se o seguinte anúncio, numa folha A4 deitada, como que apoiada numa estante de música: “Por motivos alheios ao CCB, que se prendem com atrasos das companhias aéreas, o concerto desta noite será realizado em dueto: Jason Moran, piano e Nasheet Waits, bateria. Agradecemos a sua compreensão.”. A Bandwagon de Jason Moran não teve outro remédio senão actuar sem o contrabaixo/baixo eléctrico de Tarus Mateen, desfalcada à semelhança da plateia, também ela a meio gás.
Há uma certa argumentação, por vezes expendida pelos entendidos do futebol, que defende a dificuldade que algumas equipas têm em defrontar adversários em inferioridade numérica, resultante de expulsões. Trata-se de uma lógica – que, confesso, sempre me pareceu oriunda de um batatal – que assenta essencialmente em considerações de natureza psicológica dos jogadores em maioria: de um ponto de vista estritamente objectivo e racional, bem como técnico-táctico, ou mesmo aritmético-matemático, ou qualquer outro plano, não me parece que nenhuma equipa queira iniciar uma partida com menos jogadores (ou forçar cartões vermelhos) para, desta forma, adquirir uma determinada e vastamente hipotética vantagem. Se não me equivoco nas regras, o número mínimo de jogadores é 7, aproximadamente 64%, arredondado por excesso, do total de 11. A Bandwagon roçou este limiar, com apenas cerca de 67% (também arredondado por excesso) dos membros; outro membro a menos e quebraria as regras.
Na primeira vez que se dirige ao público, com o microfone depositado sobre o lado direito da estrutura do piano, Jason Moran faz a (necessariamente curta) apresentação da banda – algo que me atrevo a parafrasear como, simplesmente, “Nasheet Waits on drums!”. É uma apresentação que assenta bem a Moran, que não parece ser homem de muitas palavras em palco, mas sim de muitas notas. (O mesmo homem que usa uma pouco usual disposição do piano: toca praticamente de costas para o público, com o piano aí pelas cinco horas e meia do ponteiro do relógio.) O que não invalida que não diga coisas relevantes e com o devido impacto, tal costuma ser o apanágio dos pouco prolixos, quando falam dizem mesmo coisas. Por exemplo, o segundo objectivo desta primeira intervenção foi o de dedicar o concerto a Cecil Taylor, o pianista e poeta norte-americano, recentemente falecido, no início de Abril.
Esta é uma característica central de Moran: um assinalável respeito (mais até, uma reverência) pela tradição e pelos nomes que, antes de si, perscrutaram os caminhos do jazz, da música (círculo mais abrangente) e, mesmo até, da arte (círculo ainda mais abrangente). Uma marca que se nota não só na música mas também nas próprias iniciativas em que participa que, por vezes, englobam parcerias com outras disciplinas, como o cinema e as artes plásticas. Já para não falar nos documentários e homenagens a figuras como Thelonious Monk, talvez uma das que mais respeito lhe merecem.
Aqui estamos apenas (apenas??) cingidos ao contexto da música, através de cinco longos temas, encore incluído, que constituem o set de pouco mais de hora e meia. Longos não é um adjectivo escolhido apenas pela duração. Porque, para além da tal duração (lá está, longa), todos eles englobam, encerram em si um sem número de elementos, de ambientes, de caminhos. Uma espécie de viagem, uma epopeia por uma série de caminhos musicais diferentes.
O primeiro tema curiosamente começa sem começar, com o bastante audível esfregar de mãos de Waits antes de qualquer nota se fazer ouvir. O início é um único acorde soturno e sombrio, repetido tantas e tantas vezes com o acompanhamento das escovas na bateria, que nos transmite uma atmosfera quase lúgubre, um anticlímax pouco ortodoxo para o início de um espectáculo. Depois, progressivamente, através de um solo repleto de repetições insistentes, melódicas e rítmicas, a peça ganha um estado de espírito agitado, frenético, quase desconexo, a remeter para uma estética de free jazz. Pelo meio, devo dizer que ainda ouvi, aqui e ali, elementos de blues a querer espreitar.
Já o segundo tema começa por nos trazer algum swing (será jazz?), mas também um pouco de ragtime, que talvez sirva de ponte para o momento em que Moran, qual Cristo na cruz, estica ambos os braços para atingir, simultaneamente, os registos mais graves e agudos do piano. Permanece em ambas as regiões extremas do instrumento, uma espécie de eixo que une os pólos norte e sul, até se decidir por uma sequência de glissandos (ou será “glissandi”?), com ambas as mãos a percorrerem as teclas mais à esquerda do teclado. Termina este exercício e dá espaço total ao baterista, que arranca um solo conducente ao trecho final do tema.
Da segunda vez que se dirige ao público, entre o segundo e o terceiro temas (se a memória não me atraiçoa, na mesma altura em que ambos retiram os respectivos casacos), diz-nos (informa-nos) que ouvimos não só música do homenageado da noite, Cecil Taylor, mas também de outros como Jaky Byard, compositor e executante de múltiplos instrumentos. E, de seguida, limita-se a agradecer: há cerca de 16, 17 (ainda não chega a 20, confirma com Waits) anos que se deslocam a Portugal e, de cada vez que o fazem, encontram sempre um público interessado e receptivo à sua música. “Thank you for listening”.
Ouvimos (uma tarefa na qual, ao que parece, somos exímios) ainda a outros momentos de destaque – por exemplo, quando Moran fica sozinho em palco no início do terceiro tema – mas é o final do quarto tema, antes da saída de palco para a reentrada do encore, um quase despique entre os dois músicos de grande tensão e intensidade, que gera a reacção mais notória do público.
Para além de música, gosto de palavras e, para além de palavras, ou associado a elas, também gosto de jogos de palavras. Neste caso, o nome deste trio, que, ficámos a saber, também funciona em duo, também funcionou: a Bandwagon de Jason Moran fez, como diriam os seus conterrâneos, o público “jump on the bandwagon”. Com “b” maiúsculo ou minúsculo, tanto faz.
À entrada do Grande Auditório do CCB, em mais do que um sítio, lê-se o seguinte anúncio, numa folha A4 deitada, como que apoiada numa estante de música: “Por motivos alheios ao CCB, que se prendem com atrasos das companhias aéreas, o concerto desta noite será realizado em dueto: Jason Moran, piano e Nasheet Waits, bateria. Agradecemos a sua compreensão.”. A Bandwagon de Jason Moran não teve outro remédio senão actuar sem o contrabaixo/baixo eléctrico de Tarus Mateen, desfalcada à semelhança da plateia, também ela a meio gás.
Há uma certa argumentação, por vezes expendida pelos entendidos do futebol, que defende a dificuldade que algumas equipas têm em defrontar adversários em inferioridade numérica, resultante de expulsões. Trata-se de uma lógica – que, confesso, sempre me pareceu oriunda de um batatal – que assenta essencialmente em considerações de natureza psicológica dos jogadores em maioria: de um ponto de vista estritamente objectivo e racional, bem como técnico-táctico, ou mesmo aritmético-matemático, ou qualquer outro plano, não me parece que nenhuma equipa queira iniciar uma partida com menos jogadores (ou forçar cartões vermelhos) para, desta forma, adquirir uma determinada e vastamente hipotética vantagem. Se não me equivoco nas regras, o número mínimo de jogadores é 7, aproximadamente 64%, arredondado por excesso, do total de 11. A Bandwagon roçou este limiar, com apenas cerca de 67% (também arredondado por excesso) dos membros; outro membro a menos e quebraria as regras.
Na primeira vez que se dirige ao público, com o microfone depositado sobre o lado direito da estrutura do piano, Jason Moran faz a (necessariamente curta) apresentação da banda – algo que me atrevo a parafrasear como, simplesmente, “Nasheet Waits on drums!”. É uma apresentação que assenta bem a Moran, que não parece ser homem de muitas palavras em palco, mas sim de muitas notas. (O mesmo homem que usa uma pouco usual disposição do piano: toca praticamente de costas para o público, com o piano aí pelas cinco horas e meia do ponteiro do relógio.) O que não invalida que não diga coisas relevantes e com o devido impacto, tal costuma ser o apanágio dos pouco prolixos, quando falam dizem mesmo coisas. Por exemplo, o segundo objectivo desta primeira intervenção foi o de dedicar o concerto a Cecil Taylor, o pianista e poeta norte-americano, recentemente falecido, no início de Abril.
Esta é uma característica central de Moran: um assinalável respeito (mais até, uma reverência) pela tradição e pelos nomes que, antes de si, perscrutaram os caminhos do jazz, da música (círculo mais abrangente) e, mesmo até, da arte (círculo ainda mais abrangente). Uma marca que se nota não só na música mas também nas próprias iniciativas em que participa que, por vezes, englobam parcerias com outras disciplinas, como o cinema e as artes plásticas. Já para não falar nos documentários e homenagens a figuras como Thelonious Monk, talvez uma das que mais respeito lhe merecem.
Aqui estamos apenas (apenas??) cingidos ao contexto da música, através de cinco longos temas, encore incluído, que constituem o set de pouco mais de hora e meia. Longos não é um adjectivo escolhido apenas pela duração. Porque, para além da tal duração (lá está, longa), todos eles englobam, encerram em si um sem número de elementos, de ambientes, de caminhos. Uma espécie de viagem, uma epopeia por uma série de caminhos musicais diferentes.
O primeiro tema curiosamente começa sem começar, com o bastante audível esfregar de mãos de Waits antes de qualquer nota se fazer ouvir. O início é um único acorde soturno e sombrio, repetido tantas e tantas vezes com o acompanhamento das escovas na bateria, que nos transmite uma atmosfera quase lúgubre, um anticlímax pouco ortodoxo para o início de um espectáculo. Depois, progressivamente, através de um solo repleto de repetições insistentes, melódicas e rítmicas, a peça ganha um estado de espírito agitado, frenético, quase desconexo, a remeter para uma estética de free jazz. Pelo meio, devo dizer que ainda ouvi, aqui e ali, elementos de blues a querer espreitar.
Já o segundo tema começa por nos trazer algum swing (será jazz?), mas também um pouco de ragtime, que talvez sirva de ponte para o momento em que Moran, qual Cristo na cruz, estica ambos os braços para atingir, simultaneamente, os registos mais graves e agudos do piano. Permanece em ambas as regiões extremas do instrumento, uma espécie de eixo que une os pólos norte e sul, até se decidir por uma sequência de glissandos (ou será “glissandi”?), com ambas as mãos a percorrerem as teclas mais à esquerda do teclado. Termina este exercício e dá espaço total ao baterista, que arranca um solo conducente ao trecho final do tema.
Da segunda vez que se dirige ao público, entre o segundo e o terceiro temas (se a memória não me atraiçoa, na mesma altura em que ambos retiram os respectivos casacos), diz-nos (informa-nos) que ouvimos não só música do homenageado da noite, Cecil Taylor, mas também de outros como Jaky Byard, compositor e executante de múltiplos instrumentos. E, de seguida, limita-se a agradecer: há cerca de 16, 17 (ainda não chega a 20, confirma com Waits) anos que se deslocam a Portugal e, de cada vez que o fazem, encontram sempre um público interessado e receptivo à sua música. “Thank you for listening”.
Ouvimos (uma tarefa na qual, ao que parece, somos exímios) ainda a outros momentos de destaque – por exemplo, quando Moran fica sozinho em palco no início do terceiro tema – mas é o final do quarto tema, antes da saída de palco para a reentrada do encore, um quase despique entre os dois músicos de grande tensão e intensidade, que gera a reacção mais notória do público.
Para além de música, gosto de palavras e, para além de palavras, ou associado a elas, também gosto de jogos de palavras. Neste caso, o nome deste trio, que, ficámos a saber, também funciona em duo, também funcionou: a Bandwagon de Jason Moran fez, como diriam os seus conterrâneos, o público “jump on the bandwagon”. Com “b” maiúsculo ou minúsculo, tanto faz.
domingo, 6 de maio de 2018
sábado, 5 de maio de 2018
Proxy war
«She was struck by how seldom in her childhood her parents, that other other married people in her life, that other incompatible pair, had shouted at each other. They'd held their peace and let a proxy war unfold inside their daughter's head.»
The Corrections, Jonathan Franzen
The Corrections, Jonathan Franzen
quinta-feira, 3 de maio de 2018
Not being a striver
«For Gary, a key element of not being a striver, a perspirer, was to dress as if he didn't have to work at all: as if he were a gentleman who just happened to enjoy coming to the office and helping other people. As if noblesse oblige.»
The Corrections, Jonathan Franzen
The Corrections, Jonathan Franzen
Subscrever:
Mensagens (Atom)