(Publicado originalmente aqui)
Os noruegueses Ballrogg estiveram no Pequeno Auditório da Culturgest na noite de quinta-feira, 30 de Março. O trio vai realizar uma pequena digressão por terras lusitanas: depois deste concerto na Culturgest, passa 6ª pelo Jazz Festival de Portalegre, para depois seguir para o Porto e tocar na Casa da Música a 6 de Maio, e só depois regressará à Escandinávia.
Recuemos até aos primórdios, altura em que este trio era, na verdade, um duo, composto apenas pelos saxofones e clarinetes de Klaus Ellerhusen Holm e o contrabaixo de Roger Arntzen. Então este era um duo que se inspirava em músicos como Eric Dolphy, que apostava em estruturas não-lineares e indeterministas. Desde 2011, no entanto, a pedal steel guitar e o banjo de Ivar Grydeland juntaram-se e acabaram por contribuir, de forma indelével, com uma sonoridade algures entre o country e o western. E, desta forma, juntou-se ao grupo e tornou-se mais um exemplo – acaso fosse necessário outro – da proliferação de um sem número de formações escandinavas que têm contribuído para reinventar e, dessa forma, também propagar a música folk americana.
Entretanto, desde este ano, Grydeland passou o testemunho à guitarra de David Stackenäs, que tem um papel interessante na dinâmica deste trio. Por um lado, a guitarra acústica assume normalmente um carácter harmónico bastante vincando, num conjunto de acordes com cordas soltas e muita cor. Nesta vertente, dá-nos uma sonoridade pouco habitual, possivelmente devido a esta conjugação menos recorrente de instrumentos. Por outro lado, quando esta guitarra acústica é rendida por uma eléctrica – uma Telecaster linda –, deixa um pouco de lado a harmonia e joga mais com a intersecção de melodias com o clarinete e o saxofone ou, ainda, com o ruído de fundo da distorção e do metal do bottleneck contra o aço da corda. Por vezes, esta Telecaster ganha uma sonoridade diferente, a fazer lembrar um blues mais cru, daqueles que remetem para plantações de algodão e para o Tom Sawyer a correr ao lado de Huckleberry Finn, à medida que o barco a vapor percorre as águas do Mississipi.
De acordo com os músicos, embora exista uma moldura ou uma estrutura de cada tema, o espaço deixado livre para cada um é bastante grande. Sente-se um esbater das linhas entre aquilo que é improvisação e o que não é, uma gestão maleável que, à partida (e à chegada também) parece difícil de implementar, mas que este trio executa sem dificuldade de assinalar. Se esta forma de tocar e abordar os temas possa encaixar este trio na gaveta do free jazz, é também de salientar que a sonoridade acústica – mesmo que pontuada por elementos electrónicos aqui e ali, que se sente sobretudo nos efeitos e no loop da guitarra e do contrabaixo – os afasta de uma certa vertente mais agressiva associada àquela etiqueta.
O ónus de dizer umas palavras ao público recai sobre Ellerhusen Holm. E digo ónus porque claramente não é a função em que está mais confortável. Pergunta-nos se pode falar em inglês connosco. Explica-nos que é a primeira vez que estão no nosso país com esta formação e que estão a apresentar o mais recente álbum, Abaft the Beam, lançado pela portuguesa Clean Feed. Custa 500 euros, diz-nos para quebrar o gelo com uma piada que não tem piada. E acrescenta que “abaft” significa “behind the middle of the boat”, explicação que arranca uma risada ao resto da banda (“à popa”, segundo o que apurei).
“It’s been a pleasure playing for you”, diz-nos mais perto do fim e eu sou forçado a depreender a palavra “pleasure” porque, da mistura com o sotaque original, ia jurar que aquilo que disse se pareceu mais a “pressure”. “The pressure is all mine”, apetece-me responder-lhe.
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