(Publicado originalmente aqui)
Entre os dois blocos de música do set que se ouviu no Grande Auditório da Culturgest – e não sem antes fazer um gesto convidativo a Peter Evans, rapidamente declinado –, o maestro Pedro Guedes pegou no microfone para dizer umas palavras. Para além das músicas que havíamos ouvido, da apresentação dos músicos em palco, falou um pouco da colaboração com o trompetista Peter Evans. Registei no meu bloco uma expressão que utilizou: disse que o processo de colaboração da Orquestra de Jazz de Matosinhos (OJM) com o trompetista americano tem sido um “teste à elasticidade”
Eu, que sempre tive pouca elasticidade e que sempre compensei esse falha com uma imaginação fértil, rapidamente poderia visualizar os 16 músicos que compõem esta orquestra de equipamento de ginástica a esticarem-se em várias direcções. Mas, claro, contive-me e foquei-me antes no sentido não literal da expressão que, de facto, foi apropriada.
O primeiro bloco de música é uma suite que engloba três temas de Evans – Passing through, Mantra e Passage – e o standard I want to talk about you (recomendo a versão da Ella Fitzgerald com o Joe Pass). Os temas de Evans são aquilo que já conhecemos do músico, presença assídua em território nacional: um jazz contemporâneo, experimental, que mistura estruturas e sonoridades de outros registos, e com espaços de improvisação livre.
De tudo um pouco acontece em palco. Da exploração de diferentes técnicas e sons dos instrumentos de sopro, à liberdade quase desconcertante da secção rítmica, até ao sintetizador que também acompanhou o pianista e que, em certos momentos, me evocou filmes de ficção científica.
Pelo meio, temos também momentos em que quase parece um desperdício ter uma orquestra à mão de semear e não a empregar. Logo na fase inicial, há um momento em que Evans fica completamente sozinho, um solo sem qualquer acompanhamento. Uma intervenção notável do nova-iorquino, que parece retirar todo o tipo de sons e mais alguns do trompete. Olho para os naipes de sopros da OJM e reparo que eles próprios estão a apreciar a performance de Evans, como se fossem espectadores com um lugar privilegiado.
Noutras alturas, é a própria orquestra que tem um contributo surpreendente. Por exemplo, aquando de um solo de bateria, o acompanhamento não é nada mais do que um conjunto de padrões rítmicos soprados pelos diferentes naipes, uma espécie de contraponto de ritmo apenas. Só mesmo na recta final do tema final se ouve um bocadito do swing que costuma estar associado a este tipo de formações. E soube bem, devo confessar.
Caso esta colaboração tenha sido encarada como um desafio auto-imposto pela formação nortenha, então é caso para dizer que a prova foi superada com sucesso. Outra coisa não seria de esperar, devo acrescentar. Ou não fosse esta uma big band (vig vand?) do norte, carago!
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