Esqueceste-te da caneta. Em cima da mesa, ladeada de cadeiras toscas. Uma caneta velha, uma daquelas BIC
BIC laranja BIC cristal
Tosca como as cadeiras da mesa de madeira. Nem sequer tem tampa. Uma daquelas BIC que usávamos na escola para mandar bolas de papel uns aos outros. Tiraste-a de dentro da mala juntamente com uma molhada de papéis, tudo embrulhado. Quase me senti mal quando me senti mais organizado do que tu
Esqueceste-te dela aqui.
É estranho ter em casa uma coisa que te pertence. Quase não te conheço, sinto quase que a BIC esquecida
BIC laranja BIC cristal
é um pequeno intruso, um cavalo de Tróia que deixaste aqui para invadir esta casa, fortaleza. Para me invadir. Agora não sei o que fazer: devolvo-te a caneta da próxima vez que te vir? Se fosse uma Mont Blanc não hesitaria nem que fosse pela etiqueta do preço. Mas devolver uma BIC parece uma coisa reles. Ainda por cima nem sequer tem tampa. Tiraste-a de dentro da mala com a mesma destreza com que te livraste dos sapatos quando entraste depois de me teres perguntado. Para mim é indiferente, faz como se estivesses em tua casa.
Prefiro estar descalça
Em cima da mesa de madeira clara, as cadeiras toscas, uma de cada lado, sentaste-te de frente para mim, um copo de água na mão direita – pediste-me água – a caneta que usaste para tomar nota de alterações, para tomar nota da lista para a próxima vez
Vamos encontrar-nos outra vez, não é?
Claro que sim. Vamos encontrar-nos outra vez e eu talvez te leve a caneta sem tampa que deixaste em cima do tampo da mesa de madeira clara com duas cadeiras toscas, uma BIC como eu já não via há imenso tempo.
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